Existem 33 projetos em tramitação no Congresso que, se aprovados, elevam a folha de pagamento dos servidores em alguns bilhões
Um deles, apontado por especialistas em finanças como o mais perigoso, é o que prega o retorno do Adicional por Tempo de Serviço (ATS). O propósito é quebrar o espírito da remuneração por subsídio – parcela única -, revivendo uma prática, extinta em 2001, de incorporação de penduricalhos – bonificações de diversos tipos – que engordavam o salário dos servidores.
Segundo cálculos preliminares de várias instituições ligadas ao funcionalismo, o ATS, sozinho, representaria um acréscimo de mais de R$ 10 bilhões nos gastos do governo. A estimativa é considerada conservadora, pois só levou em conta o gasto com servidores ativos e inativos, em 2013 (de R$ 109 bilhões) e um percentual médio de ATS de 10%, para aqueles que vão se aposentar com 30 anos ou mais de serviço.
Os projetos são apresentados alternadamente, ao longo do tempo, nas duas Casas. As do ATS (também conhecido como Indenização por Tempo de Serviço – ITS) começaram em 2007, apenas para carreiras jurídicas, como magistrados e procuradores. Esses passariam a ter direito a quinquênios, ou seja, um adicional de 5% a cada cinco anos, até somar, no máximo, 35%.
Até 2013, seis outras emendas foram sugeridas. Com elas, os penduricalhos acabaram virando alvo de todas as carreiras, nas esferas federal, estadual e municipal. Além de ministros e secretários estaduais e municipais, forma incluídos, nas emendas, o direto ao benefício também para servidores de cargo em comissão. Os defensores desses projetos alegam que a extinção do ATS criou desestímulo e estagnação em algumas carreiras, cujos trabalhadores foram atraídos pela iniciativa privada.
Interesses múltiplos
Os projetos em tramitação no Congresso têm várias matizes, e o Adicional por Tempo de Serviço (ATS) não é o único vilão. Existem propostas para que os advogados públicos recebam honorários de sucumbência (uma espécie de prêmio concedido à parte vencedora) e que as chamadas carreiras típicas de Estado recebam o teto máximo de 90,25% dos vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), já que são cargos que não têm correspondência no setor privado. Há também as que pretendem assegurar o direito ao adicional noturno aos policiais militares, bombeiros e integrantes dos órgãos de segurança pública. Além de indenização de fronteiras, fim da contribuição previdenciária de servidores inativos, aposentadoria compulsória aos 75 anos, entre outros.
José Matias-Pereira, professor de Administração Pública da Universidade de Brasília (UnB), opinou que, para as finanças públicas, é fundamental que se mantenha o atual sistema de contracheque enxuto. Esse método, disse, mostra com clareza tudo o que a União desembolsa. “Um retorno ao passado deixaria buracos negros no Orçamento”, assinalou. Outro projeto, não menos nocivo que o ATS, segundo Matias-Pereira, é o que institui os honorários de sucumbência. Embora a princípio pareça que a verba que entra como receita extra para a União possa ser distribuída sem prejuízo aos contribuintes, há que se ter cuidado.
“Há sutilezas nefastas. No passado, os fiscais de tributos tinham participações nas multas que aplicavam. Gerou uma indústria de multas sem controle. O salário deles passou a ser insignificante, diante das participações. Esse é apenas um exemplo do que um benefício aparentemente inocente pode causar. Além disso, o papel do advogado público é cumprir sua missão”, destacou o professor da UnB. Ele também critica a fixação do teto máximo dos salários das carreiras típicas de Estado em 90,25% dos vencimentos dos ministro do STF e atribui a tentativa de estabelecer esse teto à cultura brasileira de indexação. Se o projeto passar, vai haver uma pressão maior para aumento das remunerações dos ministros e, em consequência, um efeito cascata de gastos, deduziu. (VB)
Ano eleitoral facilita aprovações
O risco de esses privilégios, que bombam os salários dos servidores, serem aprovados, em ano eleitoral, por meio de manobras secretas para cabalar votos, é grande, alertou Gil Castelo Branco, da Associação Contas Abertas. O acompanhamento e a vigilância à atuação de deputados e senadores devem ser redobradas principalmente pouco antes do recesso parlamentar. “Com a Copa do Mundo próxima, praticamente em maio os trabalhos param no parlamento. E no apagar das luzes, quando todos estarão envolvidos com o futebol e em seguida com a sucessão presidencial, uma enxurrada de propostas podem passar disfarçada e sem o devido crivo da sociedade”, reforçou.
O impacto, em cálculos conservadores, nos cofres da União dessas novas despesas com pessoal, que hoje giram em torno de 4,2% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de todas as riquezas produzidas no país) – considerando que servidores federais, estaduais e municipais somam mais de 10 mil funcionários – pode ultrapassar os 14% do PIB, disse Castelo Branco. “O momento é de contenção, para sustar a escalada inflacionária, e não de expansão nos gastos ou de elevação dos juros, como vem sendo feito. Mas essa é a ótica econômica. A ótica política é outra. Os parlamentares costumam, quando sentem que seus mandatos estão em jogo, ficar mais sensíveis às pressões, receptores e tolerantes”, assinalou.
“Esses projetos só reforçam o fato de que o Brasil precisa passar por um processo de refundação da administração pública e dos valores e éticos e morais. A questão não é ser contra ou a favor de aumento salarial. O fato é que o Estado está caótico. Cada área quer beliscar um benefício, sem avaliar a necessidade de se alocar recursos em áreas prioritárias”, argumentou professor de Administração Pública da Universidade de Brasília (UnB) José Matias-Pereira. E o parlamento, segundo ele, é o reflexo desse caos, e os governantes já deixaram claro a incapacidade de fazer planejamento.
Para Matias-Pereira, o argumento de líderes sindicais de que o governo se nega a aumentar salários, mas dá incentivos e desonerações e esbanja na amortização da dívida pública não é válido, já que um erro não justifica o outro. (VB)
Estratégia
Os vários projetos em tramitação na Câmara e no Senado propõem que os quinquênios incorporados aos salários e às parcelas indenizatórias – ajuda de custo, diárias e auxílio-moradia, por exemplo – não entrem no cálculo do teto constitucional, que limita o valor das remunerações e subsídios pagos no serviço público. A Constituição determina que nenhum funcionário público pode receber mais do que o salário fixo dos ministros do Supremo Tribunal Federal, que desde 1º de janeiro passou a ser de R$ 29.462,25.
Pauta onerosa
Tramitam no Congresso 33 projetos que mexem nos salários dos servidores, sendo 23 na Câmara e 10 no Senado e a maioria com impacto nos cofres públicos. Veja os principais
Adicional por tempo de serviço (ATS)
PEC 210/2007
Permite que o teto constitucional dos agentes públicos – em todas as carreiras remuneradas na forma de subsídio – seja ultrapassado em até 35%.
PEC 31/2011
Institui ATS de 1% ao ano para todos os servidores.
PEC 68/2011
Em conjunto com a PEC 2/2011 e a PEC 5/2011, do senador Gilvam Borges (PMDB-AP), prevê ATS de 35%, sendo 5% a cada quinquênio, a todos os servidores, e exclui essas parcelas do teto constitucional.
PEC 63/2013
Com base na PEC 68, institui Indenização por Tempo de Serviço (ITS), de 5% a cada quinquênio, e assegura aos que ingressarem na magistratura e no Ministério Público a contagem de tempo de exercício anterior em carreiras jurídicas, bem como na advocacia. Em novo substitutivo, o senador Blairo Maggi (PR-MT), além de estender o benefício aos militares, inclui detentores de mandato eletivo, como ministros e secretários estaduais e municipais
PLS 139/2013
Acrescenta a ITS ao servidor de cargo em comissão, quando de sua exoneração, na proporção de 8% dos vencimentos mensais, por cada mês de serviço.
Teto remuneratório
PL 6922/2013
Dispõe sobre as parcelas de indenização que não serão computadas para efeito dos limites de remuneração.
Honorários de advogados públicos
PLS 166/2010
Institui o Novo Código de Processo Civil, com o direito a honorário de sucumbência, prêmio concedido ao advogado em caso de vitória da causa e em reconhecimento ao trabalho e à complexidade da matéria. O projeto tramita agora na Câmara.
PL 2279/2011
Obriga o pagamento de honorário de sucumbência aos advogados públicos.
Remuneração fixada na constituição
PEC 443/2009
Estabelece subsídio máximo das carreiras da Advocacia-Geral da União, das Procuradorias dos Estados e do Distrito Federal (conforme PEC 443/2009) e dos Defensores Públicos (conforme PEC 465/2010), em 90,25% do subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
PEC 147/2012
Fixa a remuneração de auditores fiscais da Receita e do Trabalho e de servidores do Banco CENTRAL em 90,25% do subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
PEC 391/2014
Fixa a remuneração de auditores da Receita, do Trabalho, fiscais federais agropecuários e as carreiras de auditoria, fiscalização e arrecadação dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios também em 90,25% dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF)
PEC 549/2006
Concede aos delegados de Polícia remuneração equivalente ao dos membros do Ministério Público.
Adicional noturno
PEC 339/2009
Assegura o direito ao adicional noturno aos policiais militares, bombeiros militares e aos integrantes dos órgãos de segurança pública.
Indenização de fronteiras
PL 4264/2012
Transformado na Lei n.º 12.855/2013, o projeto institui indenização às carreiras da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Receita eMinistério da Fazenda, em exercício nas localidades estratégicas.
Fonte: Congresso Nacional