Atuação do BC esquenta a campanha

    Com Dilma e Marina discutindo a autonomia do Banco Central, o sindicato nacional dos funcionários do órgão defende a liberdade total de trabalho da instituição, enquanto Alexandre Tombini nega interferência do governo

    Alvo de tiroteio intenso entre as duas principais concorrentes ao Palácio do Planalto, Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PSB), o debate em torno da autonomia do Banco CENTRAL ganhou dois capítulos. O Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco CENTRAL (Sinal) divulgou uma nota defendendo as autonomias operacional, financeira e administrativa da instituição, contrariando o discurso da presidente Dilma Rousseff. Internamente, o atual presidente do BC, ALEXANDRE TOMBINI, tem dito a interlocutores e amigos que, sem autonomia, ninguém da atual diretoria permaneceria um dia sequer no cargo.

     

    Marina assumiu a bandeira da autonomia total do Banco CENTRAL. A ideia já havia sido levantada por Eduardo Campos durante a fase da pré-campanha. A socialista, no dia em que foi efetivada como candidata a presidente, lembrou que essa era uma discussão interna – sobre a qual ela tinha alguma resistência -, mas que, como o ex-governador de Pernambuco resolveu antecipar a proposta para acalmar os mercados, ela não teve como recuar da ideia.

     

    Diante dessa posição da adversária, Dilma Rousseff intensificou os ataques, sobretudo nas recentes propagandas eleitorais, afirmando que Marina quer entregar a condução da política monetária para os bancos e, que isso, significaria menos recursos para os programas sociais do governo. De quebra, aproveitou-se da proximidade de Marina com Neca Setúbal, uma das responsáveis pelo programa de governo do PSB, herdeira do grupo Itaú e grande colaboradora do instituto fundado pela candidata, para dizer que a socialista “é sustentada por banqueiros”. Defendeu apenas a autonomia operacional da instituição.

     

    O presidente regional do Sinal no Distrito Federal, Max Meira, acrescenta que, quando a presidente Dilma fala que um BC independente significaria entregar a política monetária aos banqueiros e tiraria a capacidade de controle sobre possíveis atos ilícitos na instituição, ela está desrespeitando um quadro técnico competente e que foi elogiado pela condução do seu trabalho durante a crise de 2008. “O Banco CENTRALprecisa ter autonomia para definir a política de juros do Copom. Pelo modelo atual, quando os juros sobem, é culpa dos bancos. Quando eles caem, é pressão dos políticos”, afirmou.

     

    Decisões políticas

    A posição defendida pelo sindicato e por TOMBINI esquenta ainda mais o debate. Os sindicalistas são favoráveis a mandato fixo para o presidente do BC. O titular do cargo continuaria sendo indicado pelo presidente da República e ficaria no posto no mesmo período que o titular do Planalto. Em alguns países, como os Estados Unidos, os mandatos não são coincidentes. Com isso, um presidente da República pode conviver, em um período de seu mandato, com um comandante do Federal Reserve (Banco CENTRAL Americano) indicado por seu antecessor.

     

    No cargo desde 2011, TOMBINI nega as acusações, vindas sobretudo da oposição, de que a atual diretoria do BC esteja amarrada pelas decisões políticas. Conforme relatos de interlocutores, TOMBINI diz que, justamente por ter autonomia operacional, a atual diretoria do BC fechou 15 instituições financeiras para sanear o sistema, inclusive o Banco Rural, envolvido no mensalão. O BC, também sob o comando dele, fez dois ciclos de aumento de juros e não vai cortar a taxa Selic agora, mesmo com a economia estando de joelhos.

     

    No entender de TOMBINI, se o BC não tivesse autonomia operacional, certamente alguém do governo ligaria para a direção do Banco cobrando mudanças na política monetária ou em decisões referentes ao sistema financeiro. “Não podemos esquecer que o BC tem feito um forte trabalho de supervisão nos bancos públicos. Várias das operações (entre o Tesouro Nacional, a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil) que estão sendo questionadas só se tornaram públicas graças à supervisão do BC. Isso só reforça a nossa autonomia”, assinala ele a interlocutores.

     

    O professor de finanças do  Ibmec Nelson de Souza discorda de TOMBINI. Para ele, a atual mandatária do país controla as ações do BancoCENTRAL, uma instituição que deveria ficar imune às pressões políticas. “O Banco CENTRAL tem de zelar pelo crescimento da economia, manutenção do nível de emprego e da atividade econômica e controle da inflação. E não ficar subordinado aos interesses do titular do Planalto”, afirmou ele, lembrando que, paradoxalmente, o petista Luiz Inácio Lula da Silva foi quem chegou mais perto do conceito de autonomia operacional do BC, ao dar liberdade de ação ao então presidente do BC, Henrique Meirelles. Ele ocupou o cargo por oito anos.

     

    Nelson de Souza disse ainda que o debate político atual mostrando que a autonomia do BC é uma bandeira liberal que a esquerda se posiciona contra é falacioso. “Margareth Tatcher, vilã dos esquerdistas, nunca deu autonomia para o BC inglês. Esta só veio no governo do trabalhista Tony Blair”, lembra o professor do

    Ibmec. “O Banco CENTRAL chileno tornou-se independente durante o governo do ditador Augusto Pinochet. Mas os socialistas Eduardo Frei e Ricardo Lago deram mais liberdade para a instituição”, acrescentou o especialista em finanças.

     

    Entenda

    Saiba quais são os principais pontos da proposta de independência do Banco CENTRAL e da autonomia operacional do BC

     

    Independência do BC

    – O presidente do Banco CENTRAL tem mandato fixo, normalmente não coincidente com o do presidente da República

    – Ele é indicado pelo chefe do Poder Executivo e sabatinado pelo Senado

    – Periodicamente, precisa prestar contas de suas ações e decisões ao Congresso

    – O presidente só pode ser afastado se cometer um grave desvio ético ou se descumprir formalmente as obrigações do Banco CENTRALprevistas na Constituição: manter a atividade econômica, a inflação sobre controle, garantir a estabilidade da moeda e o nível de emprego

     

    Autonomia operacional do BC

    – O presidente do BC não tem mandato fixo

    – Ele é indicado pelo chefe do Poder Executivo e sabatinado pelo Senado

    – Não presta contas ao Congresso, pois é subordinado ao presidente da República

    – Tem liberdade operacional para tomar as medidas necessárias à condução da política monetária. Mas pode ser demitido a qualquer momento, a critério do presidente da República

     

    Cenários do Ibope

    A pesquisa Ibope divulgada ontem pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) confirma o empate técnico entre Marina Silva (PSB) e Dilma Rousseff (PT) no segundo turno das eleições presidenciais. A ex-senadora aparece com 43% das intenções de votos, contra 42% da candidata à reeleição. Em outras simulações de segundo turno, Marina venceria Aécio (51% a 27%) e, com uma vantagem menor, Dilma também bateria o tucano (48% a 33%). No primeiro turno, Dilma (39%) conseguiu ampliar a vantagem sobre Marina (31%), que era de 4%, na pesquisa anterior do Ibope, enquanto Aécio Neves (PSDB) manteve os 15% alcançados. Somados, os outros oito postulantes ao Palácio do Planalto alcançaram 2%. O total de votos brancos e nulos ficou em 8%, enquanto 5% dos eleitores permanecem indecisos. A margem de erro da pesquisa é de 2%, e o nível de confiança de 95%.

     

    Fonte: Correio Braziliense

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