O mercado está convencido de que a direção da inflação é para baixo e, pela primeira vez em algum tempo, a autoridade monetária se mostra um tanto mais inclinada a uma política mais dura (“hawkish”, no jargão econômico) do que o próprio mercado. Esse é o resumo do clima descrito nos encontros entre economistas de instituições financeiras e consultorias com o diretor de Política Econômica do Banco CENTRAL, Luiz Awazu Pereira, ontem em São Paulo. Ficou no ar a percepção de que a autoridade monetária tende a manter o ritmo de alta da Selic, de 0,50 ponto percentual, em junho, para 13,75% ao ano.
Os relatos colhidos devem ajudar na elaboração do relatório trimestral de inflação do BC.
O diretor do BC reforçou o discurso mais firme da apresentação do boletim regional na semana passada e destacou que a autoridade monetária segue “vigilante” apesar dos dados econômicos fracos apontarem para um quadro de recessão.
Questionamentos e comentários feitos pelos economistas presentes sugerem, segundo fontes, que a preocupação geral do mercado gira hoje em torno do tamanho da recessão a ser observada na economia neste ano e o impacto disso no mercado de trabalho. Sinalizaram, assim, que, talvez, já tenha chegado o momento de esperar pelos efeitos, em um prazo mais longo, da política monetária conduzida até aqui. “A impressão que ficou é que hoje o BC é mais ´hawkish´ do que o mercado”, disse fonte presente ao evento.
Embora as projeções para o IPCA do próximo ano ainda estejam bem acima da meta de 4,5% fixada pelo BC, a percepção é que há um entendimento dominante de que a inflação deve cair de modo considerável. A peça-chave a impedi-la de alcançar o centro da meta em 2016 não seria mais a crença no compromisso do BC em cumprir os seus objetivos, mas uma avaliação de que a inércia deve ter participação importante nesse jogo.
Das três reuniões ocorridas ao longo da segunda-feira, o tema da inércia foi enfatizado no último encontro do dia, no qual os economistas disseram enxergar uma resistência para a convergência da inflação à meta justamente por conta dos efeitos da inflação alta esperada para este ano, de 8,31% segundo o boletim Focus.
De modo geral, boa parte das conversas entre Awazu e os economistas foi dedicada à avaliação sobre de que forma o Produto Interno Bruto (PIB) fraco impactará o mercado de trabalho e, assim, contribuirá para jogar a inflação para baixo. Embora essa questão esteja carregada de incertezas e não tenha havido exatamente um consenso, diz uma outra fonte, as análises apresentadas contemplam a possibilidade de a inflação ser mais baixa no ano que vem. “Foi muito discutido o quanto os modelos estão sendo capazes de projetar a tendência de queda da inflação em 2016 e eu fiquei com a sensação de que muita gente acredita que essas estimativas podem continuar em queda”, afirmou um dos participantes do evento.
Diferentemente das reuniões anteriores, o diretor do BC foi mais atuante nas discussões. Atendendo um apelo dos agentes de mercado, na reunião de fevereiro, Awazu se mostrou mais aberto ao diálogo, fazendo mais comentários do que o usual. “Antes o BC adotava uma postura mais passiva, de apenas ouvir os agentes do mercado, sem dar maiores sinalizações. O que parece, agora, é que o BC está buscando ser mais transparente, procurando interagir mais com o mercado”, disse um participante.
Já no começo da reunião, segundo um economista, o diretor do BC destacou que a mensagem expressa nos documentos recentes continua sendo a visão atual da autoridade, que está comprometida em circunscrever os efeitos dos reajustes de preços relativos a 2015 e em controlar a transmissão dos efeitos secundários, reforçando o compromisso de trazer a inflação para o centro da meta, de 4,5%, em 2016. No discurso de apresentação do boletim regional do BC, na semana passada, Awazu repetiu várias vezes que o Copom vai se manter vigilante e que a sociedade deve entender que a autoridade monetária está comprometida em impedir a transmissão desses efeitos secundários para a inflação de 2016.
No debate de ontem, houve divergência em relação a algumas variáveis econômicas como o impacto da deterioração do mercado de trabalho e o comportamento da inflação de serviços. Nesse cenário de opiniões dissonantes, o diretor do BC reforçou que, diante das incertezas, a melhor forma de agir é a adotar a forma clássica de elevar a taxa básica de juros.
Segundo os economistas que participaram dos encontros, a despeito do quadro de atividade fraca, a mensagem é que autoridade monetária se mostra preocupada em conseguir a convergência das expectativas de inflação para o centro da meta e sinaliza que o ciclo de aperto monetário não terminou.
No fim da reunião, ao comentar o cenário externo, Awazu afirmou que é melhor que o país enfrente o processo de normalização da política monetária americana com fundamentos melhores – o que inclui a inflação sob controle. Entre os economistas, a leitura é de que, de fato, o Brasil está menos vulnerável a esses movimentos internacionais.
Apesar do discurso recente mais “hawkish” do BC, a mediana das projeções de inflação para o fim de 2016 no boletim Focus permaneceu praticamente estável na última semana, recuando de 5,51% para 5,50%, após ter cedido 0,10 ponto percentual nas últimas quatro semanas. Para os economistas, a tendência é que a projeção para inflação em 2016 comece a cair nas próximas semanas, com o mercado projetando uma Selicmaior para o fim do ano.
A ênfase em que a política monetária seguirá vigilante, reforçando o objetivo de levar a inflação para o centro da meta em 2016, ajuda a manter os prêmios nos contratos de Depósito Interfinanceiro (DI) de curto prazo.
Ontem os juros futuros subiram acompanhando a alta do dólar e das taxas dos títulos do Tesouro americano. O DI para janeiro de 2016 avançou para 13,82% de 13,77% do ajuste do pregão anterior. Já o contrato para janeiro de 2021, mais sensível a movimentos de aversão a risco, avançou de 12,52% para 12,61%.
Diante do tom mais duro da autoridade monetária, alguns agentes do mercado passaram a ver a possibilidade de o BC manter a Selic em um patamar mais elevado por mais tempo, o que se reflete na alta da taxa do DI para janeiro de 2017, que avançou de 13,41% para 13,49%. “O BC está sendo ´hawkish´ para buscar a convergência das expectativas de inflação para a meta. Uma vez que ele consiga isso e diante de um cenário de atividade econômica muito fraca, ele talvez mude seu discurso”, afirma Rogério Braga, sócio e gestor da Quantitas. “Agora se as expectativas vão convergir para 4,5% é outra história”, afirma.
Fonte: Valor Econômico