A Câmara dos Deputados impôs sigilo a pelo menos 149 documentos produzidos ou recebidos pela Casa, entre o começo de 2013 e o fim de abril deste ano. A informação consta de um relatório interno sobre a Lei de Acesso à Informação, divulgado recentemente. Segundo um outro estudo, de 2013, a Câmara mantinha, à época, 2 mil “caixas-arquivo” e 400 envelopes de informações classificadas, “correspondendo, aproximadamente, a um milhão de folhas” de documentação. O arquivo guardava também, na ocasião, 400 rolos de microfilmes que guardam informações de sigilos bancários, fiscais e telefônicos de CPIs.
Ontem, o Correio mostrou duas normas internas publicadas recentemente pela Câmara, que aperfeiçoam o controle da Casa sobre as informações sigilosas. Em resposta, a instituição disse que as novas regras apenas complementam um outro ato da Mesa, de 2012, e que normas similares existem em outros órgãos.
Os 149 documentos que receberam o carimbo de “reservado” da Câmara no último período foram produzidos ou recebidos entre 2012 e 2014, e dizem respeito ao funcionamento de duas CPIs: a da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes e a do Tráfico de Pessoas, encerradas em junho e em maio passado, respectivamente. No caso da CPI da Exploração Sexual, um dos documentos classificados veio da Polícia Federal – o relatório da Operação Vorax, que investigou o suposto abuso de menores por parte do ex-prefeito de Coari (AM) Adail Pinheiro, hoje preso em Manaus.
Em resposta à reportagem do Correio de ontem, a Câmara disse que o objetivo das normas recentes é aperfeiçoar procedimentos burocráticos que já existem. “(…) a Câmara recebe frequentemente (…) documentos classificados como sigilosos pelo Executivo ou Judiciário, muitos dos quais são encaminhados sem as devidas garantias de restrição de acesso”, diz um trecho. A Casa estaria apenas “cumprindo com o dever de qualquer órgão público que custodia informações e documentos sigilosos: assegurar seu acesso somente às pessoas com necessidade de conhecê-las”, diz a nota.
Segundo a Câmara, o ato da Mesa e a portaria tratam somente dos procedimentos internos para alguns papéis, “(…) como certos depoimentos prestados em comissões parlamentares de inquérito, cuja revelação pode inclusive causar risco de vida aos depoentes”. Além disso, a Casa disse que a possibilidade de retirar informações sigilosas de processos abertos atende a uma determinação da Lei de Acesso à Informação, e tem por objetivo garantir o acesso do público ao restante do documento.
Conhecido opositor do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o deputado Júlio Delgado (PSB-MG) disse que é “temerário” a Casa ampliar o controle sobre documentação nesse momento. “Quando um documento é tornado sigiloso por 25 anos, qualquer irregularidade que possa ser apurada em relação a ele já prescreveu. Não vejo como positivo”, disse ele. “Os documentos que estamos trazendo aqui hoje (para a defesa dele nas apurações da Lava-Jato), por exemplo, foram disponibilizados de forma muito transparente pela Justiça Eleitoral. Não há como o parlamento fazer de forma diferente”, comentou. “Controle tem que ter, mas com transparência, celeridade. Documento público tem que estar à disposição da sociedade, não só dos órgãos de controle. Eu sou totalmente favorável à abertura. O PSDB não compactua com qualquer tipo de dificuldade de informação”, disse o líder da Minoria, Nilson Leitão (PSDB-MT).
Quando um documento é tornado sigiloso por 25 anos, qualquer irregularidade que possa ser apurada em relação a ele já prescreveu. Não vejo como positivo”
Júlio Delgado (PSB-MG), deputado