Câmara restringe acesso a informações

    De olho no vazamento de documentos, a decisão dá aos dirigentes da Casa o poder de classificar papéis como “ultrassecretos”

    Depois de exonerar dois servidores de carreira da Câmara dos Deputados acusados de vazar informações “internas” da Casa, a gestão de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) publicou nas últimas semanas normas internas com o objetivo de ampliar o controle sobre o “vazamento” de informações “sigilosas”, tanto produzidas pela Câmara quanto as recebidas de outros órgãos do governo. Uma primeira portaria desse tipo foi divulgada no Boletim Administrativo da Casa no começo de fevereiro. Na última terça, o mesmo documento trouxe um Ato da Mesa Diretora com novas instruções sobre o tratamento dessas informações. A Câmara não sabe ao certo quantos documentos estão hoje carimbados como “sigilosos”. Nos próximos dias, a Casa deve publicar portaria estendendo as regras para os documentos digitais. Para especialistas, as classificações podem atrapalhar investigações como as da Operação Lava-Jato. 

    Na prática, as regras internas ampliarão o controle da direção da Câmara sobre as informações que circulam na Casa. “A informação produzida pela Câmara dos Deputados, ou recebida de quem não detenha competência para classificar, poderá ser classificada como ultrassecreta, secreta ou reservada, ou ser declarada de acesso restrito”, diz o primeiro artigo da portaria sobre as informações restritas. Pelas novas regras, ficam autorizados a classificar as informações o presidente da Câmara e os outros integrantes da Mesa Diretora. O pacote também inclui o corregedor parlamentar e os presidentes de comissões. Todos poderão estabelecer até o grau de ultrassecreto, cujo prazo de sigilo é de 25 anos, segundo a Lei de Acesso. No Executivo, as informações podem ser classificadas nesse grau pelo presidente, pelo vice e pelos ministros de Estado, entre outros. 

    Para o fundador da ONG Contas Abertas, Gil Castelo Branco, é preciso que a sociedade fique atenta a quais documentos serão considerados sigilosos, especialmente devido ao fato de que tanto o presidente da Câmara quanto o do Senado estão sendo investigados na Operação Lava-Jato. “Isso dá margem para que se possa determinar a indisponibilidade de documentos que deveriam ser publicados e eventualmente possam prejudicar as investigações”, alerta. A discriminação dos documentos secretos é exigida pela Lei de Acesso à Informação. O especialista em transparência também criticou dificuldades impostas pelo Legislativo para o acesso a determinados dados, como salários de funcionários e parte das notas fiscais de serviços pagos por parlamentares. 

    O Ato da Mesa publicado na terça permitirá até mesmo que algumas informações constantes de processos ostensivos, isto é, públicos, possam ser apartadas e mantidas em grau de sigilo. “Informação com restrição de acesso que integrar processo de caráter ostensivo deverá ser apartada dos autos mediante termo de desentranhamento”, diz um dos artigos do Ato. “Têm alguns documentos que são recebidos na Câmara. Cabe à Casa ter a cautela para proteger essa informação. Há também os produzidos pela própria Câmara”, afirma o secretário-geral da Mesa da Câmara, Sílvio Avelino.

     

    CPIs

    Ao contrário do que se poderia imaginar, a regra criada pela Câmara não se aplica necessariamente a documentos pedidos por parlamentares, como os que são requisitados pela CPI da Petrobras, por exemplo, e que muitas vezes fazem parte de processos sob sigilo de Justiça. “Nesses casos, a responsabilidade continuará sendo da secretaria da CPI e dos parlamentares que integram a CPI”, disse Avelino. Ainda segundo o secretário-geral, a edição dos atos segue uma determinação prevista pela Lei de Acesso à Informação (LAI), de 2011, que determinou que os órgãos públicos fossem obrigados a repassar informações aos cidadãos. 

    Sancionada por Dilma em novembro de 2011, a Lei de Acesso à Informação dedica um capítulo inteiro aos casos em que o acesso às informações pode ser limitado, e estabeleceu o período máximo de 25 anos para a manutenção do sigilo de um documento público. A lei estabelece oito tipos de informações que podem ser classificadas, entre elas as que põem em risco a “defesa e a soberania nacionais”; as que possam prejudicar “negociações e relações internacionais do país” e as que ponham em risco a segurança das instituições ou de altas autoridades do país e de seus familiares, entre outras hipóteses. 

    No geral, a Câmara tem mantido um bom desempenho no cumprimento da Lei de Acesso. As maiores polêmicas dizem respeito às barreiras para acesso à remuneração dos sevidores e às notas fiscais apresentadas por deputados federais. Relatório da própria Casa divulgado em meados de junho mostra que o órgão respondeu a 92,3% dos pedidos de informações feitos pelos cidadãos em até 24 horas – o prazo máximo estabelecido pela lei é de 15 dias, prorrogáveis por mais 15.

     

    Manifestação de estudantes

    Às vésperas da votação na Câmara dos Deputados da proposta que reduz de 18 para 16 anos a maioridade penal, estudantes se mobilizam para evitar a aprovação da medida. A Proposta de Emenda à Constituição nº 171 de 1993 está na pauta da sessão de amanhã do plenário da Casa. Festival organizado pela União dos Estudantes (UNE) começa às 18h desta segunda-feira em frente ao Congresso Nacional. Os manifestantes acampam no local e continuam o protesto no dia seguinte, quando um marcha sairá do Museu da República. A concentração começa às 9h e a estimativa é reunir 10 mil pessoas.

     

    Fonte: Correio Braziliense

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