Cessão de servidores custa r$ 562 milhões

    Governo reembolsa outros órgãos por requisição de funcionários; no total, 11.277 foram emprestados

    Catarina Alencastro 
    catarinas@bsb.oglobo.com.br 

    BRASÍLIA – O governo federal gastou no ano passado R$ 562,1 milhões para reembolsar outros órgãos por funcionários que pediu emprestado. As despesas foram feitas com 3.092 servidores. No total, 11.277 trabalhadores foram emprestados de um órgão para outro, mas a maioria faz parte da administração direta ou de alguma autarquia federal ou de fundações federais, que têm o Orçamento da União como fonte pagadora e, por isso, não há necessidade de um órgão ressarcir o outro. 

    Ainda assim, os altos encargos do governo federal com servidores requisitados viraram motivo de disputa entre o Ministério do Planejamento e entidades que representam os ocupantes de carreiras de Estado. 

    – Em momento de contingenciamento orçamentário, o governo despende recursos altíssimos com a contratação de funcionários requisitados, quando há carreiras altamente qualificadas no serviço público. É algo que atenta contra o princípio da moralidade pública – reclama Rudinei Marques, secretário geral do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate). 

    Só o Ministério do Planejamento gastou em 2013 R$ 34,4 milhões com o pagamento de funcionários que requisitou. Na maioria das vezes, os funcionários emprestados somam aos seus salários gratificações, os chamados DAS (Direção e Assessoramento Superior). Há casos de elevação da remuneração a um patamar acima do permitido pela Constituição, que estabelece o teto de R$ 29.462,25. 

    Dos 229 funcionários requisitados pelo Planejamento, 15 ganharam em 2013 acima do teto constitucional. Desses, sobre apenas dois funcionários incidiu o abate-teto. Essa regulação atingiu os salários de uma servidora do Tribunal de Contas da União (TCU), cortando R$ 82.639,06 de sua remuneração anual, e de um funcionário da Companhia de Processamento de Dados de Porto Alegre (Prosergs), que teve retirado de seu salário anual R$ 59.188,49. Entre os que escaparam do corte, há quem tenha recebido um salário mensal médio de R$ 48.968. 

    Quem paga o salário do servidor é o ministério que o requisita, exceto quando a fonte pagadora é a mesma, o que dispensa alteração. 

    Segundo o Planejamento, o artifício de pegar emprestado pessoal especializado dentro da própria administração pública é uma solução para “captar quadros técnicos especializados sem precisar recorrer a contratações externas”. 

    O ministério diz que não é possível avaliar se é mais caro ou mais barato recorrer a esse expediente, em vez de realizar novos concursos públicos, mas argumenta que o empréstimo de funcionários entre órgãos é uma solução muito mais ágil do que recorrer à burocracia de iniciar do zero um processo de contratação via concurso, o que levaria pelo menos um ano. Outro ponto que o órgão coloca é que um novo funcionário público representa gastos de, no mínimo, 35 anos para a administração. 

    “É vantagem para a administração trabalhar com profissionais vindos de outras áreas, ainda que da mesma esfera governamental. Trata-se de capital humano que traz oxigenação à máquina pública, pelo conhecimento e experiência que podem ser adotados e disseminados. Além disso, há situações prioritárias em que o governo precisa de quadros prontos, já com a expertise necessária ao desenvolvimento do projeto. Nesses casos, é importante a agilidade, e realizar um concurso público demandaria tempo – no mínimo, um ano para o processo de autorização, elaboração de edital, realização da seleção, nomeação, posse e treinamento do servidor. No caso de um servidor requisitado, apenas se altera o centro de custos, ou seja, não há despesa ampliada, enquanto um concursado geraria nova despesa para a administração pública por, no mínimo, 35 anos”, esclarece o Planejamento. 

    Legislação permite empréstimos 

    Segundo o ministério, no caso de empresas independentes do Orçamento Geral da União (OGU), o servidor tem os direitos do órgão ao qual está ligado preservados, não valendo para ele a lei do abate-teto, que fixa o vencimento mensal dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) como valor máximo permitido a um servidor federal receber. 

    – O governo fica tentando passar para fora a imagem de responsabilidade fiscal por temer que o grau de investimento do Brasil seja rebaixado. Mas, internamente, faz gastos enormes de forma desnecessária e em detrimento do talento profissional que os servidores de carreira têm – reclama um servidor federal que também se incomoda com a situação, mas prefere manter o anonimato. 

    A legislação brasileira permite que funcionários sejam emprestados entre órgãos da União ou de governos estaduais, municipais e do Distrito Federal. Essas pessoas seguem para os novos empregos para exercer um cargo em comissão ou funções de confiança. 

    Para o secretário-geral da Fonacate, o governo usa dessa manobra para prestigiar funcionários ligados a partidos aliados, desconsiderando critérios técnicos. 

    – Se o empréstimo de servidores fosse uma solução temporária, tudo bem, mas é uma coisa permanente. Cada governo que entra quer trazer seus apadrinhados. Os concursos púbicos têm grau de excelência, não justifica optar por gente requisitada – pontua Marques.

     

    Fonte: O Globo

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