Dólar forte já impacta economia dos EUA

    A contínua valorização do dólar tem surpreendido parte dos economistas e empresários nos EUA, devendo ter impacto um pouco mais forte sobre a economia e os resultados das empresas do que se estimava há alguns meses. O crescimento mais fraco previsto para o primeiro trimestre, na casa de 2% em termos anualizados, se deve em alguma medida ao fortalecimento do câmbio. 

    Neste ano, a moeda americana já se apreciou quase 11% em relação a uma cesta de seis divisas de países desenvolvidos (ver gráfico abaixo). O dólar valorizado afeta os exportadores e outras companhias com uma fatia significativa das receitas vindas do exterior. 

    Nas contas de Sal Guatieri, economista-sênior da BMO Capital Markets, o setor externo vai tirar algo como 0,5 ponto percentual da expansão do PIB no primeiro trimestre. Além do efeito da valorização do câmbio, que encarece exportações e barateia importações, os EUA estão crescendo a um ritmo bem superior ao de outras economias desenvolvidas, diz ele. Em vez de ter expansão anualizada de 2,4% nos primeiros três meses do ano, o país deve alcançar 1,9% por causa desses dois fatores, estima Guatieri. 

    Mas ele destaca que esse crescimento menos exuberante também se deve a uma série de outros fatores, como o impacto do inverno, os problemas nos portos da Costa Oeste e a redução do investimento no setor de energia, devido à queda dos preços do petróleo. Para os próximos trimestres, Guatieri espera expansão mais firme da economia, na casa de 3%, puxada sobretudo pelo consumo, num cenário de melhora do mercado de trabalho. Além disso, o petróleo barato tem um efeito favorável para os EUA, uma vez que as importações do produto ainda superam as exportações. E a renda disponível dos americanos aumentará, por reduzir os gastos com gasolina. 

    “O impulso ao poder de compra do combustível mais barato deve compensar o peso do dólar forte. Um fortalecimento adicional da moeda, contudo, pode causar alguns problemas”, diz Guatieri. Para 2015, ele projeta um crescimento de 3% para os EUA, número que pode ser um pouco menor caso o dólar continue a se apreciar. 

    A valorização da moeda já afeta os exportadores. Segundo sondagem empresarial da Universidade de Duke e da CFO Magazine, cerca de dois terços das companhias com pelo menos 25% das vendas no exterior já sentem o impacto negativo do câmbio. Quase um quarto desses exportadores disseram que reduzirão planos de investimento devido ao dólar forte.

    “Nós estamos no meio de uma competição feia para ver quem vai depreciar mais as suas moedas em relação ao dólar entre a zona do euro, o Japão e o Canadá, e a China vai ser provavelmente a próxima”, disse, em nota, o professor Campbell Harvey, da Universidade de Duke, um dos fundadores da sondagem, divulgada na semana passada. “Os exportadores americanos estão sendo punidos por essas desvalorizações competitivas, e isso vai levar a lucros mais baixos e a menos emprego”.

    Muitos analistas dizem que o efeito sobre a economia americana não é dos mais significativos, uma vez que as exportações respondem por apenas 12% do PIB dos EUA. A forte valorização do dólar, contudo, também afeta companhias americanas cujas subsidiárias fora do país respondem por uma parcela importante de seu faturamento. É o caso da Procter & Gamble, que tem cerca de dois terços de receitas provenientes do exterior. No fim de janeiro, a empresa estimou uma redução de US$ 1,4 bilhão do lucro no ano fiscal que termina em junho deste ano, devido à valorização do dólar em relação a outras moedas.

    Economista-sênior global do bank of America (BofA) Merrill Lynch, Gustavo Reis diz que o dólar forte é um dos fatores que explicam o crescimento mais fraco no primeiro trimestre, embora não seja o predominante. Ele nota, contudo, que o fortalecimento do câmbio ocorre num cenário de queda dos juros de longo prazo nos EUA, o que tem um impacto favorável sobre a economia. Com essas taxas em níveis mais baixos, há um estímulo para o mercado imobiliário, por exemplo. 

    Outro ponto é que o tombo dos preços de combustíveis possibilita ao consumidor direcionar o dinheiro economizado para outros gastos. Com isso, o efeito do câmbio valorizado sobre a economia tende a ser limitado, diz Reis. O dólar forte também contribui para derrubar ainda mais a inflação, já bastante baixa por causa do recuo da gasolina.

    Um dos principais motivos que levam ao fortalecimento do dólar é expectativa de que o Federal Reserve (Fed, o Banco CENTRAL americano) eleve os juros nos próximos meses, num momento em que os bancos centrais da zona do euro e do Japão adotam políticas monetárias ultra-expansionistas. Os EUA também crescem a um ritmo bem superior que outros países desenvolvidos, o que contribui para a apreciação da moeda americana. O BofA Merrill Lynch projeta crescimento de 3,1% para os EUA neste ano, uma taxa bem mais forte que o 1,5% esperado para a zona do euro e o 1,4% para o Japão.

     

    Fonte: Valor Econômico

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