Fed aponta riscos, mas mantém planos

    A presidente do Federal Reserve (Fed, Banco CENTRAL dos EUA), Janet Yellen, basicamente reforçou o cenário do Fomc, de recuperação gradual da economia e retirada lenta dos estímulos, em seu testemunho ontem no comitê econômico do Congresso americano. Mas destacou riscos que, embora conhecidos, reforçam o tom “dovish” (mais flexível) da autoridade monetária: a fraqueza do mercado imobiliário, uma escalada de tensões geopolíticas e a possibilidade de retorno do estresse financeiro quando o viés da política monetária for mudado.

    Sobre o setor imobiliário, alvo direto de estímulos do Fed e pivô da crise, Yellen fez uma advertência de que as leituras da atividade no setor, que vinha se recuperando desde 2011, têm sido decepcionantes até agora neste ano. “Outro risco, de origem doméstica, é que a recente perda de fôlego na atividade de habitação poderia ser mais prolongada do que o esperado, ao invés de retomar seu ritmo do início da recuperação”, disse a presidente do Fed.

    De fato, sendo esse fator muito sensível ao nível das taxas de juros, a preocupação reforça um padrão de cautela por parte do Fed – embora, olhando para 2014, isso não signifique (ao menos por ora) mudança no passo de redução das compras de ativos, que devem acabar no outono do Hemisfério Norte (entre setembro e novembro), se tudo correr bem com a economia.

    A questão geopolítica (o que remete à crise na Ucrânia) ou uma intensificação das tensões financeiras nos mercados emergentes poderiam “minar a confiança na recuperação da economia global”, disse ela. Esses desdobramentos devem ser monitorados.

    O quadro desenhado da economia em geral não foi de preocupação. Yellen reforçou pontos já levantados nos documentos do Fed (comunicados e ata) e nas entrevistas que concedeu. A visão de que a fraqueza do primeiro trimestre foi bastante afetada pelo inverno rigoroso prevaleceu. Outros indicadores, como a recuperação dos gastos e produção, estão em andamento, “colocando a economia no caminho certo para um crescimento sólido no trimestre atual”.

    Mesmo admitindo que o mercado de trabalho continua a melhorar, como visto na redução da taxa de desemprego para 6,3% em abril e na forte criação de vagas, o cenário está “longe de ser satisfatório”. Segundo Yellen, os desempregados de longa duração e o número de trabalhadores em tempo parcial ainda estão em níveis “historicamente elevados”.

    A inflação, por seu turno, tem sido baixa, a despeito da continuidade da recuperação, mesmo considerando o efeito de fatores transitórios sobre os índices. Mas o Fomc (comitê de política monetária) reconhece que o nível persistentemente abaixo de 2% “pode representar riscos para o desempenho econômico” e, portanto, sua evolução está sendo monitorada de perto.

    Em resumo, a economia se expandirá em ritmo um pouco mais rápido em 2014 do que 2013, a taxa de desemprego vai continuar a cair gradualmente e a inflação vai começar a se mover em direção à meta de 2%, lembrando o diagnóstico de que há ainda “considerável ociosidade na economia”, o que garante, segundo a presidente do Fed, um alto grau de acomodação monetária.

    política monetária, nesse ambiente, continuará a ser “data dependent”, ou seja, vai reagir aos indicadores econômicos. Não há nenhuma indicação de que os “seis meses” após o fim do programa de estímulos, citados por Yellen, sejam um “guidance” para o mercado.

    Considerando o alerta para a fraqueza do setor imobiliário, a sensação é de necessidade de uma política ainda frouxa por tempo indeterminado. Por outro lado, Yellen relacionou uma série de preocupações quanto à possibilidade de formação de bolhas ou outros riscos para a estabilidade financeira a partir das políticas atuais do Fed, dizendo que um longo período de baixas taxas de juros tem o potencial de induzir os investidores a buscar alto rendimento assumindo maior alavancagem, risco de “duration” ou risco de crédito. Mas ressaltou que hoje as maiores empresas financeiras do país têm melhores posições de liquidez e de capital.

     

    Fonte: Valor Econômico

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