Para vários sindicalistas, governo federal não se preocupa com a qualidade dos serviços oferecidos pelos órgãos públicos
A reforma administrativa que traça como meta a reestruturação dos mecanismos da estrutura do Estado, que inclui o serviço público federal, alterando a carga horária, os salários e a questão da estabilidade do servidor ganha cada vez mais força junto ao Poder Legislativo e corre risco de ser aprovado futuramente pelo Congresso Nacional.
Com a divulgação da reforma, a proposta tem sido veementemente criticada e debatida por servidores, especialistas e líderes de sindicatos, principalmente aos sindicatos que competem ao âmbito federal.
O secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), Sérgio Ronaldo da Silva, afirma que virou moda o aperfeiçoamento de discursos de cada governo a respeito da necessidade de reestruturação do serviço público.
Segundo ele, o Estado não pode ser mínimo para apresentar seus resultados para a sociedade. “Nós cumprimos nosso papel e apresentamos ao governo de transição uma proposta sobre qual modelo de Estado pensamos e defendemos. Mas o governo vai na contramão do que apresentamos”, declarou.
Para o presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (Sinal), Paulo Lino, o governo quer, de fato, economizar com a diminuição de despesas com a folha salarial dos servidores, estando muito pouco preocupado com a qualidade dos serviços prestados à população.
Segundo ele, essa proposta de Reforma Administrativa vem sendo gerada desde o Governo Temer e tem um interesse muito mais fiscal do que técnico. “Redução de salários e de jornada, fim da estabilidade, carreirão com salários iniciais abaixo de R$5 mil, gatilhos para cortes de despesas e suspensão de concursos públicos são todas medidas economicistas”, declarou o presidente do Sinal.
A partir de um ponto de vista jurídico, o advogado Gladstone Felippo não vê com bons olhos os pontos que, segundo ele, o governo quer atacar. O advogado concorda que são necessárias medidas visando a melhorar a eficiência, mas existem meios menos prejudiciais para atingi-la.
“O servidor não é o vilão do orçamento. A reforma deve buscar um equilíbrio, porquanto a grande maioria dos servidores públicos recebe menos do que R$5 mil líquidos por mês e há um déficit de mão de obra notório. Penso que essa reforma deveria abranger a qualificação do servidor, a cobrança por resultados e uma administração gerencial”.
Para alguns, a estabilidade pode ser, na verdade, um fator que cria comodismo e não ajuda na melhora do desempenho e eficiência do setor. Visão essa discordada por Sérgio Ronaldo da Silva. Segundo ele, a estabilidade surge como um requisito de proteção de servidores contra maus gestores.
O secretário-geral da Condsef acredita que a estabilidade não blinda o servidor que não cumpre seu papel com a sociedade e sim o protege de gestores mal intencionados.
Ainda nesse viés, Paulo Lino completa dizendo que a estabilidade ao servidor não é um privilégio, mas uma prerrogativa para que o servidor possa, de fato, servir ao Estado brasileiro e não ao governo daquele momento.
O fim da estabilidade em pauta é uma das principais fontes de resistência da oposição. Gladstone Felippo vê, neste aspecto, que o fim da estabilidade é um retrocesso que não vai atingir a eficiência buscada pela reforma.
“Juridicamente falando, sim, é possível acabar com a estabilidade mediante emenda à Constituição Federal. No entanto, a estabilidade no serviço público serve para proteger o servidor contra a atuação política. O servidor serve ao público, ao Estado, não ao político”, declarou.
Gladstone lembra, ainda, que a estabilidade é um direito previsto no art. 41 da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB). O advogado acredita que o servidor não deve acatar ordens manifestamente ilegais, não pode sofrer perseguições por contrariar interesses escusos. Deve ser protegido.
Embora a estabilidade esteja prevista na Constituição, a perda do cargo público também está na Carta, porém nunca foi regulamentada, mesmo após 30 anos de sua promulgação.
Neste ponto, o advogado Gladstone Felippo afirma que é preciso regulamentar, o mais breve possível, essa questão, estabelecendo-se critérios claros e transparentes de avaliação de desempenho.
“Esse é o caminho. Porém, muito cuidado para não tornar as medidas de avaliação instrumentos de atuação discricionária. Devem haver critérios claros e objetivos, atestados por comissão, para julgar a atuação do servidor”, afirmou.
Condsef critica que reduz salários dos servidores
O secretário-geral da Condsef ainda vê a proposta de querer restringir salários como um outro discurso para vender um cenário que não existe. Para ele, essa intenção é uma forma de acabar com incentivos para que pessoas qualificadas adentrem o serviço público.
“Em nossa base que representa a maioria dos servidores do Executivo brasileiro, 65% dos servidores recebem em média R$5.800, que é perto do teto do INSS. O salário da maioria absoluta não alcança sequer esse valor. Então, onde tem exagero?”, indagou.
De acordo com dados passados por Sérgio Ronaldo, hoje existe um déficit de cerca de 200 mil servidores em atividade. Até 2021, cerca de 50% da força de trabalho ativa no Executivo Federal deve se aposentar, o que, certamente, vai piorar o quadro de desmonte do atendimento público.
Por isso, os sindicatos, dentro de um panorama geral, acreditam que o caminho ideal para que o serviço público de fato prevaleça é a partir de um respeito mútuo entre governo e os servidores. Investir em capacitação, qualificação e em concursos para recompor a força de trabalho no setor público também são práticas vistas com bons olhos.
No entanto, de acordo com Paulo Lino, as entidades sindicais representantes estão, como sempre estiveram, dispostas ao diálogo, mas não sentem a mesma disposição por parte do governo.
“A política de precarização dos serviços públicos traz um prejuízo enorme ao cidadão brasileiro, principalmente aos mais desassistidos economicamente, a quem o Estado deveria suprir em suas necessidades”, disse o presidente do Sinal.
Gladstone Felippo concorda que a eficiência no serviço público é uma pauta que precisa ser discutida. Para o advogado, de fato existe no serviço público um certo “comodismo” pontual, gerado pela proteção da estabilidade, mas a esmagadora maioria dos servidores trabalha com zelo e afinco, principalmente as mais novas gerações de servidores.
“Parece-me que essa pequena casta de maus servidores acaba por macular a imagem como todo. Sem dúvida, medidas para aperfeiçoar a eficiência são sempre bem-vindas, notadamente com base em meritocracia e critérios objetivos”.
Fonte: Folha Dirigida