Por Nicole Hong e Matt Wirz | The Wall Street Journal
Gestores de fundos americanos estão comprando títulos da dívida brasileira, ativos que no ano passado foram um dos mais atingidos pelas turbulências nos emergentes.
Os títulos soberanos do Brasil em real deram retorno de 3% este ano, o terceiro melhor desempenho, atrás dos de Indonésia e Tailândia, entre 15 países que compõem o índice do J.P. Morgan para a dívida em moeda local de emergentes. A parcela de títulos do Brasil em real nas mãos de estrangeiros saltou para 16,5% em janeiro, o nível mais alto em quatro anos, segundo o J.P. Morgan.
Os investidores dizem que estão interessados nos títulos soberanos e corporativos em real por causa de rendimentos altos e riscos relativamente baixos, quando comparados com títulos de outros países em desenvolvimento. A taxa básica no Brasil está em 10,75% ao ano, comparada com 3,5% no México e 12% na Nigéria, segundo o J.P. Morgan.
“O Brasil é o caso mais claro de precificação errada nos mercados emergentes”, diz Bryan Carter, gerente de portfólio da Acadian Asset Management. Carter diz que aumentou recentemente a fatia de títulos brasileiros na sua carteira para 13%, a maior posição otimista que já teve em relação aos ativos.
O fluxo de capital destaca como o desejo dos investidores por retornos maiores está impulsionando a demanda por títulos de maior risco, diante dos rendimentos magros oferecidos por ativos mais seguros. Os títulos de cinco anos do Tesouro brasileiro tinham rendimento de 12,69% ao ano na terça, comparado com 1,721% de títulos semelhantes do Tesouro dos EUA.
O apetite por novos títulos de investidores em busca de rendimento está permitindo que devedores em dificuldade voltem a emitir dívida. Isso contrasta com as crises anteriores nos mercados emergentes, quando os mercados de dívida fecharam suas portas para empresas e países no mundo em desenvolvimento.
O rendimento dos bônus brasileiros está alto porque a desvalorização de 15% do real em relação ao dólar e a inflação de 6% no ano passado empurraram para baixo o preço dos ativos. Os rendimentos sobem quando os preços caem e vice-versa. Mas alguns investidores dizem que os rendimentos elevados exageram a ameaça para os preços dos títulos de dívida representada pela inflação e a alta das taxas de juros.
No ano passado, o BC iniciou um programa de intervenção no mercado para estabilizar o real, que se valorizou 2,2% este ano ante o dólar e superou a maioria das outras moedas de países emergentes. O Banco elevou as taxas de juros em oito reuniões de política monetáriaconsecutivas e a expectativa é de que aumente os juros novamente na próxima, em 2 de abril.
“O temor da crise no Brasil tem diminuído”, diz Gorky Urquieta, um dos diretores de títulos de dívida de emergentes da Neuberger Berman, que gerencia US$ 242 bilhões e comprou mais títulos do Brasil este ano. “É um ambiente mais saudável.”
Alguns caçadores de barganhas também estão comprando títulos de empresas brasileiras que entraram em recuperação judicial, como a companhia de petróleo OGX e a produtora de açúcar e etanol Aralco SA Açúcar & Álcool. Os processos fizeram que investidores que detinham títulos de outras empresas brasileiras quisessem vendê-los, baixando os preços e aumentando o rendimento. Isso criou oportunidades de pechinchas entre os títulos de concorrentes como a Tonon Bionergia SA, diz Robert Abad, gestor de um fundo de emergentes que tem carteira de US$ 53 bilhões e pertence à Western Asset Management Co.
É verdade que ainda há muita incerteza. Partes do Brasil estão enfrentando a pior seca em décadas, o que poderia levar à escassez de água e a um aumento de preços que manteria a inflação alta no curto prazo. Além disso, o crescimento econômico deve permanecer lento. Outros desafios estão ligados à Copa do Mundo em junho e às eleições presidenciais em outubro, uma sequência que alguns observadores dizem poder desencorajar os necessários cortes de gastos pelo governo.
Dois fundos administrados pela Pacific Investment Management Co. venderam cerca de US$ 2,9 bilhões em títulos do governo brasileiro nos últimos três meses de 2013, segundo cálculo baseado em dados da Pimco, uma unidade da alemã Allianz SE. (A Pimco não respondeu a pedidos de comentário.)
Na segunda-feira, a Standard & Poor reduziu a classificação de crédito do Brasil para BBB-, o primeiro rebaixamento da dívida soberana do Brasil desde 2002. A S&P citou a desaceleração do crescimento e o grande déficit fiscal do Brasil, colocando o país a um ponto acima da classificação de alto risco.
Embora a redução fosse esperada, em grande parte, pelos mercados, analistas do Credit Suisse dizem que o rebaixamento poderia dificultar a captação de empresas brasileiras. A S&P, ao lado da Moody”s Investors Service e da Fitch Ratings, classificam o cenário do Brasil como estável, o que significa que outro rebaixamento não deve ocorre tão cedo.
“O Brasil é uma economia que pode cair de um penhasco amanhã? Não. E mesmo assim, está pagando rendimentos que são muito atraentes”, diz Javier Murcio, gerente de portfólio da Standish Mellon Asset Management Co., que administra cerca de US$ 160 bilhões e adicionou títulos de dívida soberana brasileira a sua carteira este ano. (Colaborou Min Zeng)
Fonte: Valor Econômico