Governo cria calendário-relâmpago para LDO

    Negociação com o Congresso usa brechas em regimento de comissão para garantir drible à meta fiscal

    Em sintonia com o Planalto, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), relator do projeto que altera a meta fiscal do governo, negociou no Congresso calendário de emergência para apreciar o tema em até 25 dias. Foi a primeira vez que o governo manobrou utilizando acordo de prazos. Com isso, a proposta deve ser votada na Comissão Mista de Orçamento na próxima quarta-feira. Pela tramitação normal, a votação seria em 14 de dezembro. A oposição criticou a manobra. Para o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho, foi uma “aberração constitucional”. -BRASÍLIA- Articulado com o Palácio do Planalto e com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o relator do projeto que altera a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014, senador Romero Jucá (PMDB-RR), negociou ontem no Congresso um calendário de emergência para apreciar em 25 dias o projeto que permite a dedução do superávit primário (economia para o pagamento dos juros) de todas as despesas com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e com desonerações. Na prática, o projeto libera o governo de cumprir a meta. Com o cronograma-relâmpago, a alteração na LDO será votada na Comissão Mista de Orçamento (CMO) já no dia 19. Pela tramitação normal, a votação só ocorreria em 14 de dezembro.

    Foi a primeira vez que um acordo de prazos foi oficializado. Como vice-presidente do Senado, Jucá assinou ofício comunicando à CMO o calendário que permitirá votar seu parecer no dia 19. Se a estratégia der certo, a proposta poderá ser votada pelo Plenário do Congresso na semana seguinte, dia 24 ou 25. Na prática, o governo pode até ter resultado negativo em 2014, mas, com a manobra, não estará descumprindo a meta de superávit, nem a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

     

    MUDANÇA SEM CELEUMA

     Jucá negociou desde a noite de quarta-feira o cronograma relâmpago, valendo-se de brechas no regimento do Senado e da CMO, depois de concluir que esse caminho seria o mais adequado para viabilizar a aprovação do projeto dentro do prazo.

    – Dos movimentos que se podia fazer, o mais tranquilo e o mais simples era mudar o calendário na CMO, porque não queremos criar celeuma, e a urgência poderia criar problemas. Por isso, combinei com o ministro (da Casa Civil) Aloysio Mercadante de retirar a urgência.

    Jucá encaminhou o ofício ao presidente da CMO, deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), que pediu o aval de Renan. Este, então, oficializou a mudança.

    – Superada essa questão técnica, a contingência será política. O projeto só poderá ir ao plenário depois que limparmos a pauta que está trancada com os vetos, e sabemos que a oposição não vai facilitar, mas não podemos brincar com fogo.

    Pela manhã, o Planalto ainda tentava outra estratégia. O vice-presidente Michel Temer encaminhou ao Congresso pedido de urgência para a tramitação do projeto. Mas, nos bastidores, o pedido foi considerado “inócuo”, já que a urgência só determina que a pauta do Congresso fique trancada em 45 dias, sendo que a mudança na LDO precisa ser aprovada até 22 de dezembro, quando o Legislativo entra em recesso.

    A oposição reagiu ao pedido e ameaçou recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF). No começo da noite, temendo que a discussão acabasse de fato no Supremo, o Planalto recuou e retirou o pedido de urgência.

    Jucá usou brechas na Resolução Número 1 da CMO, que fixa prazos mínimos e máximos para as etapas de tramitação. A saída foi utilizar os prazos mínimos. Para ter respaldo, também foi aplicado o Regimento do Senado. Técnicos da CMO disseram que foi um “canetaço” e que, tradicionalmente, são usados os prazos máximos. Calheiros e Jucá decidiram inverter o processo: fazer a mudança sem antes passar pela CMO. O presidente do Senado é o presidente do Congresso.

     

    OPOSIÇÃO PEGA DE SURPRESA

     Pelo calendário especial, serão dadas só algumas horas para apresentação de emendas ao projeto que altera a LDO. E, em menos de 24 horas, Jucá apresenta seu parecer. Todas as articulações estão acontecendo no momento em Temer está na Presidência, devido à viagem da presidente Dilma Rousseff.

    No dia 17, ocorrerá a apresentação da análise das emendas. No dia 18, Jucá apresentará seu parecer, favorável à mudança das regras para o superávit. E, no dia 19, a CMO votará o parecer de Jucá. Com isso, a proposta ficará pronta para ser votada no Plenário. O desafio do governo será, então, limpar a pauta, que está trancada por 38 vetos presidenciais.

    A oposição foi pega de surpresa pela manobra. À tarde, o PSDB anunciou que ingressaria hoje no STF contra o pedido de urgência. O líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), disse que o governo usou o “rolo compressor”.

    – Esse rito de urgência é uma aberração constitucional. Vamos fazer obstrução na CMO, nas sessões do Congresso, e exigir que sejam votados os 38 vetos separadamente e não em conjunto.

    ‘DESEMPENHO EXEMPLAR’ Mercadante e Ricardo Berzoini, ministro das Relações Institucionais, convocaram a bancada do PT para defender a mudança na meta de superávit. Argumentam que mesmo com a redução, haverá superávit e isso garantirá a manutenção de investimentos, emprego e renda.

    – O superávit possível é o que teremos no final do ano. Não vamos adiantar números, vocês peçam para a área econômica – disse Mercadante.

    Ele tentou explicar declaração dada anteontem, quando afirmou que o desempenho fiscal do Brasil tinha sido exemplar. Segundo Mercadante, é evidente que a situação fiscal do país não é exemplar, mas difícil.

    – Ao longo dessa crise de 2009 pra cá o Brasil foi o que teve o maior superávit primário do G20. Por isso falei que ao longo dessa crise nosso desempenho fiscal foi exemplar, foi o segundo melhor entre as 20 maiores economias do mundo. Evidente que a nossa situação hoje não é uma situação exemplar, é uma situação difícil. ( Colaborou Luiza Damé)

    “Sabemos que a oposição não vai facilitar, mas não podemos brincar com fogo” Romero Jucá Vice-presidente do Senado e relator do projeto de mudança da LDO

     

    Fonte: O Globo

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