Governo deve cortar R$ 60 bi do Orçamento

    Arrocho será definido nos próximos 30 dias, mas intenção de segurar as despesas foi apresentada ontem a analistas da agência Fitch pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Objetivo é garantir o cumprimento da meta fiscal

    O governo já definiu o corte que pretende fazer no Orçamento da União para 2015, aprovado na noite de terça-feira pelo Congresso Nacional. O tamanho do arrocho, segundo informação que circula pela Esplanada dos Ministérios, é de R$ 60 bilhões. O valor será anunciado nos próximos 30 dias, após a lei orçamentária ser sancionada pela presidente Dilma Rousseff. Fontes do governo afirmam que é necessário, antes, avaliar o impacto do ajuste em cada ministério.

    O contingenciamento do Orçamento foi apresentado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, aos representantes da agência de classificação de risco Fitch Ratings com o objetivo de mostrar a determinação do governo de reequilibrar as contas públicas, colocadas em frangalhos durante o primeiro mandato de Dilma. Os analistas da companhia norte-americana estiveram reunidos com Levy ontem, em meio às notícias da fortíssima queda na popularidade da presidente Dilma, que agora tem apenas 13% de aprovação, conforme pesquisa do Datafolha. Hoje, a visita deverá ser ao Banco CENTRAL

    Na avaliação da economista Monica Baumgarten de Bolle, diretora da consultoria Galanto/MBB, em Washington, um contingenciamento de R$ 60 bilhões não será suficiente para que agências como a Fitch acreditem que o Executivo conseguirá ajustar as contas. No ano passado, o setor público fechou com um rombo de R$ 32,5 bilhões, mesmo com a série de malabarismos contábeis utilizados por meses seguidos para maquiar os números. “A recuperação da credibilidade, sobretudo depois de tantos anos de bagunça (contábil) e em meio a uma crise política, é um processo lento e complicado”, disse.

    Os técnicos da Fitch conversaram com Levy por aproximadamente duas horas. Em julho de 2014, a agência norte-americana manteve a classificação dos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional em BBB, com perspectiva “estável”. A nota garante ao país o grau de investimento, que certifica aos credores que a economia brasileira tem condições de cumprir com suas obrigações. Naquela época, a agência projetava um crescimento econômico de 2% para o Brasil em 2014 e em 2015. Atualmente, as estimativas do mercado são de um crescimento nulo do Produto Interno Bruto (PIB), no ano passado, e de um tombo entre 0,5% e 1,5% neste ano, sem contar a ameaça de racionamento. Para perder o grau de investimento da Fitch, o país precisará descer dois degraus e a nota cair para BBB-. 

    Dúvidas

    Levy tem repetido que conseguirá alcançar o superavit primário (economia para o pagamento dos juros da dívida pública) de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB), ou R$ 66,3 bilhões, prometido para este ano. No entanto, há dúvidas sobre o cumprimento do objetivo. Em audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, anteontem, o senador José Serra (PSDB-SP) considerou a meta “irrealista” e previu que o governo conseguirá, no máximo, chegar a R$ 25 bilhões. Especialistas consideram que um corte de R$ 60 bilhões no Orçamento, ou mesmo de R$ 65 bilhões, como algumas estimativas feitas no início do ano, não será suficiente. “Cortar só R$ 65 bilhões não dá para cumprir a meta”, resumiu uma fonte próxima ao governo. 

    Em janeiro, apesar da queda real de 5% na arrecadação, o setor público teve saldo primário positivo de R$ 21,1 bilhões, mas esse resultado foi obtido graças a atrasos de pagamentos, à redução natural de gastos devido ao fato de o Orçamento não ter sido aprovado, e, sobretudo, à contribuição dos estados. 

    O governo vem tentando convencer os analistas das agências de que 70% do ajuste fiscal não depende do Legislativo, mas Levy tem sido obrigado a ir ao Congresso Nacional com frequência quase diária para tentar garantir apoio às medidas de austeridade. Ontem, o ministro esteve com o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Na véspera, havia visitado o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). 

    Diálogo

    Cunha e Levy combinaram manter diálogo antes que o governo envie ao parlamento qualquer medida de ajuste. Ficou acertado ainda o encaminhamento de projeto de lei para substituir a Medida Provisória 669, que elevava a contribuição para a Previdência Social de empresas que haviam sido anteriormente beneficiadas pela desoneração da folha de pagamento. A MP foi devolvida ao Planalto por Renan Calheiros, no início do mês, sob alegação de inconstitucionalidade. O ministro prometeu ao presidente da Câmara que a proposta será encaminhada “nos próximos dias”. Ele deveria ter um encontro ainda ontem com o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, para tratar do assunto.

    Levy também conversou com Cunha sobre a necessidade de aprovação das MPs 664 e 665, que endurecem as regras de acesso a benefícios trabalhistas e previdenciários, como seguro-desemprego e pensão por morte. Elas devem possibilitar ao governo uma economia de R$ 18 bilhões para ajudar na composição da meta fiscal. No entanto, parlamentares da bancada petista disseram que só apoiarão as medidas se elas sofrerem “alguns ajustes”.

    Novas iniciativas

    Em nota, o Ministério da Fazenda informou que, durante a reunião entre Joaquim Levy e representantes da Fitch Ratings, foram detalhadas medidas mais permanentes, inclusive tributárias, “para reforçar a estabilidade fiscal de médio prazo para, assim, manter a dívida pública em uma trajetória favorável”. A assessoria da pasta informou que também foram discutidas iniciativas estruturais para melhorar as exportações brasileiras, como a aceleração do acesso ao Regime Aduaneiro de Entreposto Industrial sob Controle Informatizado (Recof), destinado a indústrias, e mudanças na Linha Azul, procedimento de despacho aduaneiro expresso.

     

    Fonte: Correio Braziliense

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