Apesar de o Palácio do Planalto ter fixado uma meta mais realista de superavit primário para este ano, de 1,9% do PIB, a equipe econômica já precisou sair em busca de novas receitas fiscais para não frustrar as expectativas de analistas e de investidores
Quando propôs a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano, o Ministério da Fazenda estimou em 3,5% o crescimento real da arrecadação federal. Mas, até março, o desempenho acumulado não chegou a 2%, já descontada a inflação no período. Sem os recursos projetados, ficou mais difícil atingir a meta de economizar parte do arrecadado para pagar os juros da dívida, o chamado superavit primário.
Após anos sem cumprir as metas fiscais, o governo resolveu perseguir este ano um esforço menor, mas que pudesse ser cumprido sem precisar recorrer a medidas classificadas como “maquiagem contábil”. O objetivo para o setor público como um todo é economizar 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2014.
Trata-se de um meta bem mais realista do que a projetada para o ano passado, quando o governo iniciou o ano dizendo perseguir esforço fiscal de 3,1% do PIB, e que, posteriormente, acabou tendo de admitir duas novas revisões. Primeiro, para 2,3% e, depois, para 1,9%, o mesmo patamar deste ano. “Apesar de crível, a meta não será alcançada”, apostou Felipe Salto, especialista em finanças.
Ajuda das estatais
Motivos para duvidar do sucesso do governo é que não faltam. Dos R$ 99 bilhões que o setor público terá de economizar este ano, incluindo a contribuição de estados, municípios e estatais, exceto Petrobras e Eletrobras, a maior parte, R$ 80,8 bilhões, ficará sob responsabilidade do governo central (Tesouro Nacional, Banco CENTRAL e Previdência Social). Até março, porém, só entraram nos cofres públicos R$ 12,3 bilhões, o equivalente a 15,2% da meta prevista para todo o ano.
Os números seriam ainda piores se o governo não tivesse usado e abusado da ajuda das estatais, que, mesmo endividadas, tiveram de repassar dividendos ao acionista controlador, o Tesouro. Só no primeiro trimestre, o governo abocanhou R$ 5,9 bilhões em receitas como essas. Nas contas de Salto, caso mantenha esse apetite, o valor arrecadado, ao fim de 2014, será de R$ 23 bilhões, ou R$ 7 bilhões a mais do que todo o volume de dividendos recolhido em 2013.
Não fossem essas receitas, ressaltou o economista da Tendências Consultoria, o resultado fiscal neste primeiro trimestre corresponderia a 55% do superavit primário feito no mesmo período do ano passado.
Aperto no Congresso
A divulgação na última sexta-feira, pelo Banco CENTRAL (BC), da previsão de um PIB mais pessimista do que o que consta na LDO pode acarretar trabalho extra para a Comissão Mista de Orçamento. O relatório está previsto para ser entregue em 30 de maio, conforme prometeu o relator do projeto, senador Vital do Rego (PMDB-PB). Nesse mesmo dia, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgará o resultado do PIB do primeiro trimestre de 2014.
Pela LDO, a performance prevista para 2015 é de R$ 5,73 bilhões. Com a última prévia do BC, esse número caiu para R$ 5,71 bilhões. Ou seja, o principal número em que se baseia todo o Orçamento do ano que vem já está defasado antes mesmo de ser aprovado. “Desde 1988, com a aprovação da Constituição, o Orçamento funciona assim: o governo tem todo o incentivo para projetar cenário mais otimista, mas o problema é que quando se superestima premissas, a análise se deturpa”, observa Salto.
Um outro exemplo de como esse processo funciona ocorrerá amanhã, quando o governo mandará ao Congresso uma relação das emendas previstas no Orçamento deste ano e que não poderão ser executadas. Segundo a consultoria da Comissão Mista do Orçamento, o Poder Executivo analisou durante 120 dias mais de 7,7 mil propostas parlamentares individuais aprovadas, com o principal objetivo de atenuar problemas. Mas, num universo tão grande, é quase impossível não haver revisões.
Para analistas, as constantes mudanças no Orçamento figuram como uma das principais razões para o mercado financeiro quase que ignorar um dos principais documentos da política macroeconômica do país. A LDO direciona a elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA), que diz de onde vem o dinheiro público e como ele será usado pelo governo.
O economista especialista em contas públicas Raul Velloso achou a questão do prazo a menos relevante. Para ele, 2015 já vai ser um ano difícil com as “várias bombas que vêm sendo armadas desde 2013 contra as contas públicas”.
Não bastasse o encolhimento do PIB, que faz revisar todas as projeções para o ano que vem, o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2015 tem outros desafios. O cronograma já está atrasado, mas a situação ainda pode piorar devido à Copa e a outros fatores. Segundo fontes da base aliada, a presidente Dilma Rousseff vai ter que pressionar o Congresso para apressar a votação, como fez no ano passado.
Fonte: Correio Braziliense