Greve derruba vendas e pune consumidores

    Paralisação dos bancários já é a mais longa em 20 anos. Trabalhadores recusam nova proposta dos bancos, deixando comerciantes apreensivos. Faturamento cai na semana que deveria ser a melhor do mês. Lojistas suspendem pagamento a fornecedores

    BÁRBARA NASCIMENTO

    A greve dos bancários está fazendo estrago no caixa do comércio e infernizando a vida dos consumidores. Depois de 19 dias de agências fechadas — trata-se da paralisação mais longa dos últimos 20 anos —, os correntistas enfrentam dificuldades para movimentar as suas contas, sacar os salários, que começaram a ser pagos ontem, e honrar compromissos, pois muitos não receberam os boletos para pagamentos, uma vez que boa parte dos carteiros também está de braços cruzados.

    Segundo os comerciantes, justamente no período de maior faturamento, que começa no quinto dia útil do mês, as vendas despencaram. As perdas são calculadas em 30%. Não à toa, muitos lojistas estão suspendendo pagamentos a fornecedores por dificuldades no caixa. Nem as liquidações e a proximidade do Dia das Crianças são suficientes para reverter o marasmo no comércio, o que só ajuda a minar a retomada do crescimento econômico.

    Para se ter ideia do impacto da greve dos bancários no varejo, em setembro, mesmo com a paralisação ainda ganhando corpo, a demanda por crédito encolheu 9,8%, segundo dados da Serasa Experian. Muitos consumidores não conseguiram fazer empréstimos ou mesmo renegociarem dívidas que estavam vencendo. Como os grevistas se recusam a aceitar a proposta de reajuste feita pela Federação Nacional de Bancos (Fenaban), o tormento vai continuar.

    Pelos cálculos do Sindicato dos Bancários, 11.717 das 21 mil agências de todo o país estão fechadas, apesar das liminares — os chamados interditos proibitórios — impetradas por vários bancos, que tentam manter as portas abertas. “Na maioria dos lugares, estamos derrubando as liminares, que são um desrespeito ao direito de greve”, afirmou o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Carlos Cordeiro.

    Filas intermináveis
    Sem perspectivas de que a greve se dissolva a curto prazo, os comerciantes não escondem a apreensão. “O quadro está ficando complicado. O estoque está encalhado e já não temos caixa suficiente para pagar fornecedores e o aluguel”, disse André Roque, gerente de uma loja de artigos para festas. “Somente nesta semana, que deveria ser a melhor do mês, as vendas devem cair pelo menos 15%. O caixa está vazio. Sem dinheiro em mãos, as pessoas têm usado mais o cartão de crédito, que só nos paga depois de 30 dias”, afirmou.

    Na avaliação do presidente do Sindicato do Comércio Varejista do Distrito Federal (Sindivarejista), Antônio Augusto de Moraes, tanto as áreas que dependem do dinheiro quanto as que vendem por meio do cartão de crédito estão sendo prejudicadas. “A despeito da possibilidade de utilizarem o caixa eletrônico, muitas vezes, as pessoas deixam de comprar pela falta de recursos em mãos”, afirmou.

    Gerente de uma loja de produtos para enxovais, Mauro Lima não esconde a insatisfação. “Desde o início da greve, as nossas vendas já caíram 50%”, avaliou. “O normal é vendermos uma média de R$ 8 mil por dia. Isso caiu à metade”, acrescentou. A situação está mais difícil para os que vendem produtos mais baratos, de até R$ 50, que, geralmente, são pagos em dinheiro. E quanto mais distante o comércio for dos centros urbanos, maior é o impacto da paralisação dos bancários.

    Com boa parte das agências fechadas e os caixas eletrônicos sem recursos suficientes, o jeito está sendo recorrer às casas lotéricas e enfrentar filas de mais de uma hora. “Tenho que honrar vários compromissos. Não posso ficar esperando a greve acabar”, disse o técnico de exames Claudiano Braga, 23 anos. Não é incomum que os atrasos em pagamentos de contas virem uma dor de cabeça. A estudante Priscila Português, 24, que o diga. Ela teve uma desagradável surpresa quando tentou usar seu cartão de crédito. “Tentei fazer um pagamento, mas meu cartão estava bloqueado. Não recebi a fatura e acabei esquecendo de pagá-la”, afirmou.

    A Fenaban informou que os bancos respeitam o direito à greve, mas que estão fazendo o que for necessário e legalmente cabível para garantir o acesso da população e dos trabalhadores aos estabelecimentos bancários. A entidade ofereceu, na semana passada, reajuste de 7,1% aos trabalhadores, que reivindicam aumento de 11,93%.

    » ECT vai contratar
    terceirizados

    O Tribunal Superior do Trabalho (TST) autorizou a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) a fazer licitação para contratar trabalhadores temporários e empresas para o transporte de objetos pessoais pelo período que durar a greve de seus servidores. De acordo com o presidente do TST, ministro Carlos Alberto Reis de Paula, os atendimentos prestados pela ECT “são exercidos em caráter de monopólio”. Em seu voto, ele ressaltou que não poderia permitir uma paralisação no serviço postal do país. “Prejudicando, de forma direta, a população brasileira, malferindo, inclusive, o princípio constitucional da eficiência”, argumentou De Paula. A 13ª Vara do Trabalho de Brasília já havia julgado ilegal a terceirização da atividade fim da ECT, mas o presidente do TST entendeu que decisão anterior poderia ser lesiva à sociedade.

     

    Fonte: Correio Braziliense

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