Impostos recordes sustentam a gastança

    Arrecadação atinge R$ 101 bilhões em outubro, recorde para o mês, e R$ 907 bilhões no ano. Mesmo assim, governo não conseguirá

    VICTOR MARTINS

     

    Implacável na cobrança de impostos, mesmo com a atividade econômica patinando, o governo federal arrecadou R$ 101 bilhões em outubro — o melhor resultado para o mês. No acumulado do ano, o desempenho também é recorde, R$ 907,4 bilhões, cerca de 25% do Produto Interno Bruto (PIB). Se essa montanha fosse distribuída a todos os brasileiros, cada um receberia o equivalente a quase sete salários mínimos (R$ 4,7 mil).

    Os números, celebrados por técnicos da Receita Federal, foram impulsionados pelas empresas, que desembolsaram R$ 5,2 bilhões a mais neste ano, mesmo com as desonerações tributárias dadas pelo governo. A arrecadação histórica não será suficiente, contudo, para garantir o cumprimento da meta integral de superavit primário (economia para pagar os juros da dívida pública), de 2,3% do PIB, devido à gastança, sem critério, do governo federal.

    “Tivemos um mês de outubro muito bom. A lucratividade das empresas está melhorando”, explicou Luiz Fernando Teixeira, secretário adjunto da Receita Federal. “A expectativa é de que esse quadro positivo permaneça em novembro e dezembro. É uma sinalização”, disse. Apesar do otimismo, o Fisco mantém a previsão de crescimento das receitas para 2013 em 2,5% acima da inflação. Esse incremento não considera possíveis saltos na arrecadação por conta do refinanciamento de dívidas de empresas e bancos. Também exclui os R$ 15 bilhões referentes ao leilão do Campo de Libra, na Bacia de Campos, fatura a ser quitada em 27 de novembro.

    Descontos
    Para especialistas, mesmo que novembro e dezembro apresentem bons resultados, o governo terá de usar descontos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e das desonerações, além de maquiagens contábeis, para entregar um superavit minimamente aceitável. “A questão não é outubro, nem é o Congresso passar uma legislação que obriga o governo a não compensar resultados negativos de estados e municípios. O problema é que o setor público, de maneira geral, gasta mais do que arrecada”, argumentou Jankiel Santos, economista-chefe do Espirito Santo Investment Bank.

    O desempenho de outubro, influenciado principalmente pelo aumento da arrecadação do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), foi 5,43% superior que o registrado em igual período do ano passado. Essa foi ainda a primeira vez que a arrecadação total do mês ultrapassou os R$ 100 bilhões. Nos cálculos de Raimundo Elói de Carvalho, coordenador de Previsão e Análise da Receita Federal, não fossem as desonerações dadas pelo governo, que somaram R$ R$ 7,2 bilhões e R$ 64,3 bilhões no ano, a arrecadação teria crescido 7,9%.

    O avanço menor da arrecadação, devido à economia mais fraca, e as desonerações têm sido apontados pelo governo como responsáveis pela maior dificuldade em se fazer o ajuste fiscal. No entender dos especialistas, porém, os principais problemas das contas públicas estão nas despesas excessivas, muitas de caráter eleitoreiro. Diante desse quadro, o mercado tem dúvidas quanto à capacidade do governo de entregar um superavit primário
    suficiente para manter a trajetória de queda da dívida pública em relação ao PIB. O grosso das previsões apontam para uma economia entre 1% e 1,5% do PIB.

    “O que de fato importa, neste momento, é se o governo será forte o suficiente para segurar as demandas por maiores gastos que estão surgindo no Congresso e se o próprio governo conseguirá conter o impulso de aumentar as despesas em um ano de eleição”, ponderou Mansueto Almeida, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Jankiel Santos disse considerar quase impossível um movimento de contração de gastos em 2014, quando a presidente Dilma Rousseff tentará a reeleição.

    » E EU COM ISSO

    O governo brasileiro se tornou uma máquina eficiente de arrecadar impostos: quase 40% de tudo o que o país produz em um ano ficam com o Estado. Mas os serviços públicos oferecidos continuam precários, sobretudo os essenciais. Apesar de ter uma carga tributária desse tamanho — próxima da observada no Canadá, na Dinamarca, na Itália e na Suíça — e de gastar muito em proporção do PIB com educação, o país amarga um dos piores sistemas de ensino do planeta. Segundo um estudo do Fórum Econômico Mundial, a bandeira verde-amarela ocupa a 88ª posição entre 122 nações. Em matemática e ciências, o país está entre os 15 piores. A maior parte dos tributos pagos pelos cidadãos é gasta, segundo especialistas, para manter a burocracia funcionando. O que vai para atender as necessidades do país, mesmo que em grande volume, são despesas de qualidade duvidosa.

     

    Fonte: Correio Braziliense

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