Por Lucas Hirata e José de Castro | De São Paulo
As preocupações de ordem fiscal voltaram a dar o tom nos mercados domésticos no pregão de ontem, marcado por um mau humor nas praças internacionais que há tempos não se via. Uma medida de risco na curva de Juros da B3 subiu pelo terceiro dia seguido, batendo novas máximas. A diferença entre as taxas dos contratos de Juros DI para janeiro de 2023 e janeiro de 2019 subiu 5 pontos-base, para 186 pontos, maior spread já registrado entre esses vencimentos. Em três dias, a inclinação já aumentou 13 pontos.
A corrida por Juros longos teve impulso com a notícia de que o governo não conseguiu fazer, na comissão na Câmara dos Deputados, a leitura do relatório da MP 777, que institui a Taxa de Longo Prazo (TLP) no lugar da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP). A impossibilidade se deveu à falta de quórum. Agora, o documento será lido no dia 15, atrasando todo o cronograma anteriormente acertado. Nas palavras do relator da MP, deputado Betinho Gomes (PSDB-PE), o cronograma agora ficou “apertado”.
A reação do mercado ao adiamento é explicada porque, para os investidores, a introdução da TLP ajudaria a reduzir o subsídio implícito em financiamentos do BNDES corrigidos pela TJLP. O subsídio é tido como um dos enfraquecedores da política monetária, o que acaba exigindo uma Selic mais alta para controle da inflação, com desdobramento negativo sobre a atividade econômica.
A aprovação da TLP é vista como mais um instrumento no caminho de correção das contas públicas, especialmente diante das dúvidas sobre a capacidade do governo de aprovar a Reforma da Previdênciaainda neste ano.
Alvaro Bandeira, economista-chefe do home broker Modalmais, lembra que o ruído em torno da TLP é apenas mais um. “Seguem circulando boatos de alteração da meta de Déficit fiscal e ainda o aumento da carga tributária, mesmo com a negativa do governo de criar mais uma alíquota de Imposto de Renda (IR) para pessoas físicas”, diz. Ele inclui na lista “muitas dúvidas” sobre o Refis e o término do prazo da Medida Provisória da reoneração da folha de pagamentos.
Se os Juros de longo prazo reagiram mais negativamente às incertezas com as contas públicas, as taxas mais correlacionadas às expectativas de curto prazo para a política monetária ficam em torno da estabilidade, em dia de IPCA apenas ligeiramente acima do esperado. O índice subiu 0,24% em julho, contra 0,18% esperado por analistas consultados pelo Valor Data. O índice de difusão, porém, recuou a 41,8%, indicando alta de preços menos disseminada.
O Bank of America (BofA) nota que foi a primeira surpresa de alta com a inflação em 11 meses. Mas considera que o cenário para os preços segue “benigno” e destaca a taxa acumulada em 12 meses, de 2,71%, a mais baixa desde fevereiro de 1999 e primeira abaixo do piso da banda de tolerância da meta desde agosto daquele ano.
No mercado de Câmbio, os movimentos ficaram mais correlacionados aos dos Juros longos. O dólar comercial subiu 0,72%, a R$ 3,1520 – maior alta desde a valorização de 1,32% do dia 20 de junho. A cotação terminou no patamar mais alto desde 27 de julho, de R$ 3,1548.
No exterior, uma cesta de divisas emergentes atingiu uma mínima em quase um mês, em queda de 0,43% sobre o fechamento anterior. Paralelamente, o iene e o franco suíço – tradicionais portos seguros em tempos de incerteza – tinham firmes ganhos. O dólar chegou a cair 1,23% ante o franco, maior queda em um mês e meio. As oscilações foram uma reação ao tom bélico adotado pelos governos americano e norte-coreano. O presidente americano, Donald Trump, chegou a falar em renovar e modernizar o arsenal nuclear dos EUA.
Fonte: Valor Econômico