Juros futuros derretem no pós-Copom

    Por Antonio Perez, Lucinda Pinto, José de Castro, Silvia Rosa e Aline Oyamada | De São Paulo

    O mercado de juros futuros da BM&F viveu um pregão de intensa movimentação ontem, com investidores ajustando posições à perspectiva de uma redução no ritmo de alta da taxa básica Selic. As tesourarias reagiram à mudança inesperada no comunicado da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), que não sofria alterações desde maio. Investidores viram no texto um sinal de que o Copom pode reduzir o passo já na próxima reunião, em janeiro.

    Enquanto os contratos futuros de Depósito Interfinanceiro (DI) mais curtos – ligados diretamente às apostas sobre os próximos passos do Copom – recuaram com força, as taxas dos DIs longos experimentaram apenas uma queda modesta. Trata-se de um sinal de preocupação com a gestão das contas públicas, acentuado ontem pelo anúncio do superávit primário mais fraco que o esperado do governo central em outubro. Além de ter provocado um chacoalhão momentâneo nas taxas, que se afastaram das mínimas por alguns minutos, o resultado do superávit reforçou o ceticismo do mercado quanto à visão do BC de que a parte fiscal caminha para neutralidade.

    Quem mais reagiu ao Copom foi o DI para janeiro de 2015, que reflete as expectativas para a taxa básica ao longo do próximo ano. A taxa do derivativo caiu de 10,82% a 10,63%. Antes do Copom, o contrato refletia aposta majoritária em mais duas altas de 0,50 ponto percentual (em janeiro e fevereiro). Reflete, agora, chances maiores de uma alta de 0,25 ponto em janeiro e, talvez, uma elevação final de 0,25 ponto em fevereiro. “A curva a termo mudou de configuração. Deixou de precificar uma alta mais forte dos juros no primeiro trimestre e jogou os prêmios para depois das eleições de outubro”, diz Flavio Serrano, economista sênior do BES Investimentos.

    Entre os contratos mais longos, o DI para janeiro de 2017 desceu de 12,19% para 12,07%. A manutenção da taxa acima de 12% mostra que a percepção de risco em relação à trajetória da economia brasileira continua elevada.

    “Nossa leitura da decisão é a de que o BC está pavimentando o caminho para começar a diminuir o ritmo de aperto monetário. Provavelmente, vai encerrar o ciclo com uma alta final em janeiro” afirma Marcelo Salomon, economista do Barclays para a América Latina, em relatório divulgado ontem. O economista reafirma a projeção de fim do aperto monetário com uma alta de 0,25 ponto percentual em janeiro, para 10,25% ao ano.

    Para Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central, a interrupção antecipada do ciclo de aperto monetário sinaliza que o BC está sob forte pressão política. “Talvez o BC tenha de adotar uma posição frustrante, para a própria instituição, que é parar de elevar os juros deixando a tarefa inacabada, a inflação ainda alta.”

    Seria muito positivo para a imagem da política econômica brasileira, na opinião dele, ver o BC seguindo com o ciclo de aperto mesmo durante as eleições. A menos, é claro, que a inflação ceda, e as expectativas se ancorem. “A autonomia do BC vai ser testada ao limite nos próximos meses. Vai haver uma pressão política muito forte para que esse ciclo de elevação de juros pare antes do pico da campanha eleitoral”, diz.

    Além do Copom, o mercado refletiu o resultado fiscal do governo central. Logo após o anúncio dos números, o dólar chegou a alcançar a máxima do dia, de R$ 2,344, mas perdeu força frente ao real diante da expectativa de fluxo positivo e da uma melhora do superávit primário nos próximos dois meses. O dólar comercial encerrou em queda de 0,30% a R$ 2,3170.

    A alta da moeda americana perdeu força depois das declarações do secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, de que o resultado do superávit primário nos próximos dois meses deve vir significativamente maior em função de receitas adicionais do leilão de Libra e da receita com a reabertura do programa de refinanciamento de tributos federais (Refis).

    O estrategista-chefe do banco Mizuho do Brasil, Luciano Rostagno, lembra que o resultado fiscal de setembro já tinha sido ruim e se esperava pelo menos uma reversão parcial desse quadro em outubro. Para ele, a política fiscal é expansionista e não caminha para a neutralidade. Segundo Rostagno, os elementos internos e externos ainda são de maior pressão inflacionária. “Achamos que se o BC encerrar o ciclo de alta com a taxa Selic em 10,25% será insuficiente para fazer com a inflação convirja para o centro da meta, ainda que em um horizonte extenso”, afirma.

    O estrategista do banco Mizuho destaca, no entanto, que se o BC optar por reduzir o ritmo de alta da taxa básica de juros será inevitável continuar com o programa de intervenção diária no mercado de câmbio, pelo menos no começo do ano que vem.

    Para o economista da Votorantim Corretora, Roberto Padovani, o Copom encerrou ontem o ciclo de aperto monetário ao elevar a taxa Selic para 10% ao ano. “Mantemos nossa avaliação de que o ciclo foi encerrado nesta reunião, mas não descartamos a possibilidade de uma alta adicional ou uma mudança de ritmo”, diz Padovani em relatório enviado a clientes.

    Para Padovani, o comunicado indicou que o BC “deverá aguardar os efeitos defasados de política sobre a atividade econômica e, principalmente, sobre a convergência da inflação”. O economista acredita que a Selic será mantida em 10% por um longo período de tempo, mas que haverá um novo ciclo de alta em 2015.

    Fonte: Valor Econômico

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