Maior endividamento em dez anos preocupa Tesouro

    A relação entre dívida corrente líquida e receita corrente líquida, um dos principais indicadores de solvência de entes públicos, atingiu o maior nível em dez anos no caso da União e é motivo de preocupação na equipe econômica. O Relatório Contábil do Tesouro Nacional, que faz uma análise dos passivos e ativos do governo, mostra que essa relação era de 2,09 em 2007 e chegou a 4,01 em 2017.

    Para o Tesouro, o indicador merece atenção. “A sua evolução no período analisado mostra uma tendência preocupante. Até 2013, ela acompanhava um valor próximo do dobro da receita corrente líquida (RCL). Contudo, ultrapassou o patamar de três vezes a RCL em meados de 2015 e o quádruplo da RCL em 2017”, alerta o órgão em relatório.

    Ao contrário dos entes subnacionais, a União pode aumentar seu endividamento sem precisar se ater a um limite legal. Estados, por exemplo, só podem comprometer até duas vezes a receita corrente líquida. No caso de municípios, apenas 1,2 vez. A proposta dos ministérios da Fazenda e do Planejamento na criação dos limites, em 2001, era que a União tivesse um teto de 3,5, mas o Congresso resolveu não estabelecer nenhuma limitação para ela. Se o teto de 3,5 estivesse valendo, a União já teria estourado o limite em 2016.

    Mesmo sem o limite, o Tesouro vê o indicador com atenção por ele representar a capacidade de solvência da União. A justificativa para a elevação está no aumento dos gastos. “Nos últimos anos, com o crescimento significativo das despesas, especialmente obrigatórias (Previdência e pessoal), têm-se apurado déficits expressivos, que têm contribuído fortemente para o crescimento da dívida público federal”, afirma o relatório.

    O Tesouro considera como dívida consolidada líquida o montante total de obrigações financeiras da União (passivos) deduzidas as disponibilidades de caixa, as aplicações financeiras e os demais haveres financeiros.

    Outro indicador de endividamento destacado no relatório e que continua a preocupar a equipe econômica é a chamada regra de ouro das contas públicas. A norma está prevista em Constituição e visa impedir que se recorra ao aumento de endividamento público para o pagamento de despesas correntes, que são gastos com custeio e manutenção – como remunerações a servidores, benefícios previdenciários, serviços, diárias e passagens. Só é permitido ao ente público recorrer a endividamento para investimentos ou refinanciar a própria dívida (despesa de capital).

    Sob risco de descumprir o limite e cometer crime fiscal, o governo tem recorrido a devoluções de recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para assegurar o cumprimento do limite. A equipe econômica projeta uma insuficiência de R$ 184 bilhões para cumprir a regra de ouro em 2018.

    A secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, já afirmou anteriormente que o governo negocia para que o BNDES devolva R$ 130 bilhões aos cofres da União no ano que vem para, assim, aliviar a conta. Além disso, ela conta com uma sobra de recursos para o cumprimento da norma neste ano que pode ser transferida para a conta do ano que vem. Até outubro, esse saldo era de R$ 22,8 bilhões. Outro possível auxílio serão receitas arrecadadas neste ano que ainda estão sendo classificadas pela secretaria.

    De acordo com o Tesouro, em análise feita a partir de 2009, o único momento em que a diferença entre as despesas de capital e as receitas com operações de crédito cruzou a linha permitida foi em 2011, quando ultrapassou em R$ 5 bilhões o limite. “Isso, porém, não ocorreu em um exercício financeiro fechado (em 31 de dezembro), que é quando se faz a avaliação”, resume a secretaria.

    O Tesouro afirma que a tendência cada vez maior de escassez de financiamento das despesas correntes é ocasionada pelo Déficit persistente nas contas públicas a partir de 2013. “A partir de 2016, passou a ser necessário recorrer à antecipação de parte dos recursos a receber do Tesouro Nacional perante o BNDES para garantir o cumprimento da regra”, diz a secretaria.

    Fonte: VALOR ECONÔMICO

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