Medo da recessão faz o BC segurar juros

    VICTOR MARTINS» DECO BANCILLON

    Comitê de Política Monetária eleva em 0,25 ponto percentual a taxa Selic, que vai a 10,75% ao ano e retorna ao patamar do início do governo. Nova alta não está descartada, mas analistas acreditam que o término do ciclo de aperto está próximo

    Diante da fraqueza persistente da economia e das perspectivas negativas para 2014, o Banco Central (BC) amenizou a estratégia de combate à inflação. Em decisão unânime, a instituição elevou a taxa básica de juros (Selic) de 10,5% ao ano para 10,75%, uma alta de 0,25 ponto percentual. Em seis das últimas sete reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom), o ritmo de aumento havia sido de 0,50 ponto. Mesmo com um reajuste menor, o BC enterrou de vez a bandeira da presidente Dilma Rousseff de encerrar o mandato com os menores juros da história. Com a correção de ontem, a Selic voltou para o patamar de janeiro de 2011, quando Dilma recebeu a faixa presidencial de seu mentor, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 

    Apesar da preocupação com o crescimento econômico, sobretudo num ano eleitoral, o curto comunicado divulgado pelo BC após o encontro deixou a porta aberta para um novo aperto de 0,25 ponto percentual. O documento, no entanto, não fez qualquer avaliação sobre economia ou inflação. “Dando prosseguimento ao processo de ajuste da taxa básica de juros, iniciado na reunião de abril de 2013, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic em 0,25 ponto percentual”, diz o texto. 

    “O BC quis reduzir o ritmo, mas deixar a ideia de continuidade. O ciclo continua”, afirmou Carlos Thadeu de Freitas Filho, economista da gestora de recursos Franklin Templeton. “Ele mantém o processo de aumento dos juros, mas em ritmo menor, por operar em um ambiente de menor incerteza doméstica”, observou. 

    O próximo passo do BC, na realidade, vai depender da inflação de fevereiro. Embora o presidente da autoridade monetária, Alexandre Tombini, já tivesse sinalizado a Dilma a disposição do Copom de reduzir o compasso de alta da Selic, o ritmo de elevação de preços ainda é preocupante. Em janeiro, apesar de o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ter recuado para 0,55%, ante 0,92% em dezembro, cerca de 70% dos itens pesquisados pelo IBGE subiram, mostrando que a carestia continua disseminada. 

    Desaceleração 
    Para analistas, a instituição também está preocupada com os efeitos defasados da política monetária. A avaliação corrente é de que apertos na Selic demoram entre seis e nove meses para se fazerem sentir na economia. Por isso, os ajustes feitos até agora ainda vão afetar a atividade nos próximos meses. “Parte do baixo desempenho do Produto Interno Bruto no fim do ano passado (o resultado será divulgado hoje pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ) e no início de 2014 já é consequência da alta dos juros posta em prática pelo BC desde abril de 2013”, disse a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif. “Então, a tendência é que, daqui em diante, a pressão da Selic sobre a economia seja ainda maior.” 

    “Declarações do presidente Alexandre Tombini e de outros diretores com relação ao efeito defasado da Selic, à acomodação da inflação em 12 meses para um nível mais favorável e à perspectiva de atividade econômica menos intensa que o esperado já apontavam para essa decisão”, observou Jankiel Santos, economista-chefe do Espirito Santo Investment Bank. “O ideal seria manter o passo de 0,50 ponto percentual, mas, se fosse para fazer o que era necessário, a taxa deveria ter subido lá atrás de maneira mais decisiva”, afirmou. Segundo o economista, essa estratégia teria derrubado mais fortemente as expectativas inflacionárias. 

    Cristiano Oliveira, economista-chefe do banco Fibra, acredita que a diminuição da dose de juros procura evitar que a economia desacelere ainda mais neste ano. “O Copom tomou a decisão diante do risco de recessão técnica (recuo da atividade por dois semestres consecutivos), quando ainda não conhecia o resultado do PIB do ano passado”, explicou. A previsão dele é que, em função da alta de juros, o terceiro trimestre será o de menor crescimento em 2014. 

    Eleições 

    Na avaliação de Oliveira, a promessa do Ministério da Fazenda, de alcançar superavit primário (economia para pagar os juros da dívida) de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB), também colaborou para que o BC suavizasse o aperto monetário. “Mas o ingrediente principal foi a fraqueza do PIB”, disse. 

    “Os números de dezembro foram ruins. A indústria caiu, o comércio de Natal foi fraco e o IBC-Br (indicador de atividade do Banco Central) mostrou um desempenho muito baixo”, observou o economista José Roberto Mendonça de Barros. “O BC não vai querer jogar o país numa recessão. E, olhando para o cenário político, em que o PT tentará emplacar a reeleição de Dilma, isso não seria nem um pouco interessante”, emendou Luciano Rostagno, estrategista-chefe para o Brasil do banco japonês Mizuho. 

    » FT pede demissão de Mantega 

    Um editorial publicado ontem pelo jornal britânico Financial Times sugere que a saída do ministro da Fazenda, Guido Mantega, poderia ajudar o Brasil a recuperar a credibilidade. O texto avaliou que, mesmo com o esforço do Palácio do Planalto de mostrar controle das contas públicas e da inflação “a maneira mais fácil seria sacudir a equipe”. Segundo o periódico, Mantega “há muito tempo perdeu a consideração por parte dos investidores”. Para o FT, um ministro bem relacionado com mercado poderia “fazer maravilhas”. A queda de Mantega já havia sido sugerida pela revista The Economist.

     

    Fonte: Correio Braziliense

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