Menor taxa de poupança desde 2000 compromete PIB futuro

    Por Tainara Machado | De São Paulo

    A taxa de poupança da economia brasileira no primeiro trimestre foi de apenas 12,7% do Produto Interno Bruto (PIB), a menor desde 2000, pelo menos, e 1 ponto porcentual abaixo da observada em igual período do ano passado (13,7%). Para economistas, a queda acentuada da poupança nos últimos anos foi uma das más notícias mostradas pelo IBGE ao divulgar as contas nacionais de janeiro a março, na sexta-feira, porque compromete a capacidade de o Brasil voltar a crescer de forma mais significativa no futuro, em um momento em que o ciclo puxado pelo consumo dá sinais mais evidentes de esgotamento.

    Com baixa disponibilidade de poupança doméstica, aumenta a dependência do financiamento externo. O problema, dizem economistas, é que o déficit em conta corrente já se encontra em patamar elevado, de 3,7% do PIB nos 12 meses encerrados em abril, maior nível desde 2002. Neste cenário, aumentar a taxa de investimento, de apenas 17,7% do produto no primeiro trimestre, uma das menores da América Latina, exigiria maior ingresso de recursos estrangeiros, caso a poupança interna não volte a subir, dizem.

    Para Margarida Gutierrez, professora de economia do Instituto Coppead e do grupo de conjuntura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), como o consumo das famílias teve queda de 0,1% no primeiro trimestre e os investimentos recuaram 2,1% no mesmo período, é principalmente o aumento do consumo pelo governo, que cresceu 0,7% no trimestre, que está levando a poupança doméstica a diminuir. Margarida ressalta que o setor público tem poupança negativa porque a receita é menor do que a despesa corrente (que não inclui investimentos, por exemplo). 

    Em sua avaliação, o baixo nível de poupança é uma restrição cada vez maior para o crescimento da economia brasileira porque o déficit em conta corrente já aumentou significativamente nos últimos anos, sem que a taxa de investimento tenha acompanhado. “Historicamente, o aumento da taxa de investimento vem acompanhado da importação de bens de capital, porque são mais baratos e tem maior conteúdo tecnológico. Só que não dá mais para elevar a taxa de investimento com financiamento externo, porque o aumento do déficit nos últimos anos financiou o consumo”, afirma.

    Além disso, diz Margarida, o governo deveria estar mais atento à mudança do contexto internacional. À medida que o Federal Reserve, o BancoCENTRAL americano, reduzir estímulos para a economia, a quantidade de recursos disponíveis para os países emergentes vai diminuir, com efeitos adversos sobre essas economias, como foi observado em janeiro e fevereiro deste ano, por exemplo. Por isso, é preciso reduzir a dependência dos recursos externos, diz a professora.

    Para Carlos Antônio Rocca, diretor do Centro de Estudos do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Cemec/IBMEC), o desempenho recente da economia brasileira mostra alguns limites para a expansão da atividade cada vez mais evidentes: há falta de mão de obra, gargalos de infraestrutura e baixa taxa de poupança. Entre o primeiro trimestre de 2011 e igual período deste ano, a poupança caiu 4,3 pontos do PIB.

    Rocca tem se dedicado a estudar a evolução recente da poupança doméstica, ao lado de outro pesquisador do Cemec, Lauro Santos Jr. Embora as contas nacionais só mostrem a composição desse indicador até 2009, o pesquisador realizou estimativas para a evolução mais recente dessa variável, com base em dados do BC e do IBGE. As evidências sugerem que o setor público tem poupança negativa desde 2000, mas ela não se alterou muito nos últimos anos e está em torno de menos 1,5% do PIB.

    Já a perda de rentabilidade das empresas brasileiras nos anos mais recentes parece dar uma sinalização mais clara das razões pelas quais a poupança caiu tanto desde 2011, diz. A partir de uma análise dos dados obtidos com a consolidação de balanços das empresas que compõem a base de dados da consultoria Economática, os pesquisadores concluíram que, neste período, houve redução dos lucros, mas a distribuição de dividendos praticamente se manteve. Como o investimento caiu, mas menos do que o lucro retido, as empresas reduziram o financiamento de investimentos com recursos próprios e passaram a depender mais de dívida.

    O Relatório Trimestral de Financiamentos dos Investimentos do Cemec de setembro de 2013 mostra que a participação do mercado de capitais no total do financiamento do investimento privado, que era de 5,1% em 2000, passou para 14,5% em 2013. Já o BNDES financiava 7,6% dos investimentos em 2000 e agora tem participação de 19,7% no total. Para financiar o Banco de fomento, o Tesouro aumentou seu endividamento bruto, que em boa parte é financiada com recursos externos, diz Rocca.

    Alexandre Chaia, professor da pós-graduação em Finanças do Insper, avalia que o aumento da oferta de recursos pelo Banco de fomento a taxas de juros subsidiadas desestimula a poupança por parte das empresas. Chaia, porém, não considera que o déficit em conta corrente seja uma restrição relevante ao crescimento do PIB. Em sua avaliação, o problema é que neste momento os empresários não têm disposição para embarcar em novos projetos.

    O investimento baixo e em queda mostra uma economia com clara dificuldade de crescimento no médio prazo, diz Alessandra Ribeiro, da Tendências Consultoria, e não há sinais de que o consumo das famílias vai voltar a ter fôlego suficiente para impulsionar o PIB nos próximos trimestres.

    Fonte: Valor Econômico

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