A estratégia do governo para enfrentar a votação do impeachment na Câmara dos Deputados vai priorizar a disputa no plenário. A avaliação feita no Planalto é que o perfil da comissão especial de deputados não é favorável ao governo e os articuladores políticos já consideram possível uma derrota na comissão. Na economia, a volta do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para a Casa Civil, sob a batuta do ministro Luiz Inácio Lula da Silva, é um sinal político de que o governo vai agir para reanimar os investidores, dar maior visibilidade ao programa e fornecer argumentos para os parlamentares defenderem a presidente Dilma Rousseff.
A decisão tomada na sexta-feira pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, suspendendo a posse de Lula, coloca em risco essa estratégia. Gilmar determinou que as investigações envolvendo o petista continuem nas mãos do juiz Sergio Moro. Temendo novas ações do juiz, a Advocacia-Geral da União (AGU) recorreu mais uma vez ao STF para tentar derrubar as decisões que impedem o ex-presidente de assumir a Casa Civil. A AGU pediu ontem ao ministro do Supremo Teori Zavascki uma “excepcional concessão de medida cautelar” suspendendo todos os processos e decisões sobre o tema. Os advogados de defesa de Lula e outros seis juristas também impetraram habeas corpus pedindo que a decisão de Gilmar seja anulada e que as ações sejam mantidas com Teori Zavascki.
Numa outra avenida, as baterias oficiais vão se voltar novamente ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), questionando sua legitimidade para conduzir o processo quando ele próprio é alvo da Lava-Jato. Segundo uma autoridade, a composição da comissão especial que vai analisar o afastamento da presidente tem um pequeno número de indecisos, o que obrigaria o governo a virar quase que a totalidade dos sete deputados que ainda não divulgaram seus votos. Como essa probabilidade é baixa, o governo vai concentrar suas forças no plenário. O impeachment será analisado pelos deputados em plenário independente do resultado na comissão.
“A prioridade zero do Palácio hoje é PMDB, PMDB e PMDB”, afirmou um integrante do governo. Para reconquistar o apoio do PMDB que ainda é governista, o Planalto conta com uma oferta ainda mais generosa de cargos e verbas. Mas um interlocutor com bom trânsito no partido pondera que o efeito das benesses tende a diminuir à medida em que aumentam as chances de o PMDB herdar todo o governo.
Outra ponderação é que a decisão da presidente de nomear o deputado Mauro Lopes (PMDB-MG) mesmo depois de o vice-presidente Michel Temer haver avisado que isso criaria conflitos no partido foi um sinal de que a disposição do governo em dialogar é apenas formalidade. Para interlocutores do vice, a nomeação, levada adiante depois de ele haver sido procurado pelo ex-presidente Lula para uma reunião, mostra que “ou Lula concorda ou não conseguiu fazer a presidente mudar de opinião, o que é ruim nos dois casos”. Assessores palacianos, no entanto, avaliam que Temer já desembarcou do governo e a nomeação foi apenas a concretização.
Um sinal de alerta soou na sexta-feira quando o Congresso conseguiu quórum suficiente num dia em que a Câmara tipicamente está esvaziada. A presidente, depois de chegar de viagem, passou o resto do dia em reunião como o ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini, e do Gabinete Pessoal, Jaques Wagner.
Os ataques ao presidente da Câmara virão do governo e de parlamentares da base. A intenção é repetir a polarização com Cunha que já foi feita no ano passado, quando ele autorizou a abertura do processo de impeachment. O governo avalia que a estratégia deu certo. Já a guerra declarada ao juiz Moro é vista no Planalto como a única reação possível aos abusos que, na avaliação do governo, ele estaria cometendo. Segundo um assessor, o governo não poderia ficar quieto, mesmo correndo o risco de atacar um “herói” popular.
Lula insiste que o governo só conseguirá vencer o impeachment se sinalizar uma melhora na economia. Há consciência de que o governo não produzirá uma melhora visível nos indicadores até a votação do impeachment, que pode ocorrer antes do fim de abril. Ainda assim Lula repete que, com um rumo crível, os parlamentares terão um discurso para defender suas posições pró-governo. A volta do PAC para o comando da Casa Civil faz parte dessa estratégia. De acordo com uma autoridade, o programa continuará restrito pelo ajuste fiscal, mas será reforçado com R$ 9 bilhões até o fim do ano. (Colaborou Carolina Oms)
Fonte: Valor Econômico