Pressão total sobre o BC

    Ministro da Fazenda diz que, diante do contingenciamento de despesas do Orçamento, a autoridade monetária deve amenizar alta dos juros

    DECO BANCILLON

    Ao anunciar ontem um corte de R$ 44 bilhões nos gastos públicos, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, jogou sobre as costas do Banco Central a pressão para que o ritmo de aumento da taxa básica de juros seja reduzido. “A política fiscal que estamos fazendo permite, sim, que o aperto monetário seja menos severo”, disse ele.

    O presidente do BC, Alexandre Tombini, já vinha indicando que, caso houvesse comprometimento do governo com uma política fiscal mais sólida, a instituição poderia suavizar a política de alta de juros. Com a definição das novas metas fiscais, os analistas do mercado financeiro reforçaram a aposta de que, na reunião marcada para a próxima semana, o Comitê de Política Monetária (Copom) vai promover mais uma elevação, de 0,25 ponto percentual, na Selic, que iria para 10,75% ao ano, e interromper o processo de alta. Há pouco tempo, o consenso ainda era de uma dose mais forte, um aumento de 0,5 ponto.

    Nas últimas semanas, o mercado vinha especulando a respeito do contigenciamento de gastos públicos que seria possível fazer em um ano de eleições. O consenso era de que o governo teria de economizar pelo menos R$ 35 bilhões para mostrar comprometimento com a austeridade fiscal. Por isso, o anúncio de que o corte chegará a R$ 44 bilhões foi uma surpresa positiva — desde que a meta seja, de fato, cumprida. A redução nos gastos, dizem analistas, ajudará a desacelerar a demanda por produtos e serviços na economia, abrindo espaço para que a política monetária não precise ser tão agressiva para tentar segurar a inflação.

    Não por acaso, o governo reduziu de 5,8% para 5,3% a previsão de alta do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no decreto de execução orçamentária que será publicado hoje. Não é o que pensam, no entanto, os economistas de grandes bancos e corretoras, que ainda apostam numa elevação de 5,93% da inflação em 2014. “O que explica esse descolamento das previsões é a falta de confiança do setor privado no esforço fiscal que vinha sendo prometido pela Fazenda”, disse um operador de uma grande instituição financeira.

    Expectativa
    Para o economista-chefe da Mauá Sekular, Alessandro del Drago, o objetivo fiscal, se alcançado, poderá dissipar o pessimismo do mercado com a expectativa de alta dos preços neste ano, que permanece elevada, mesmo após sete aumentos consecutivos dos juros básicos, todos de 0,5 ponto percentual, desde abril de 2013. “O que vai pesar para que a autoridade monetária reduza ou não o ritmo de aperto na Selic são as previsões para a inflação, que ainda continuam salgadas”, ele disse. “Por enquanto, o mercado parece ter recebido bem o anúncio fiscal. Então, em breve, isso pode se refletir numa queda das projeções do custo de vida dando carta branca ao BC para encerrar o ciclo de ajuste na taxa Selic”, emendou.

    Por esse raciocínio, as apostas sobre a elevação no IPCA em 12 meses poderiam cair já a partir de segunda-feira, na próxima pesquisa Focus a ser divulgada pelo BC. Nas últimas quatro semanas, essas avaliações só têm aumentado. A estimativa mais recente aponta para uma evolução anual de 6,05% — ainda bem distante do centro da meta do governo, de 4,5%.

    É por isso que o mercado, mesmo apostando em nova alta dos juros na semana que vem, ainda que em proporção menor do que se viu até agora, não parece acreditar que a inflação cairá em 2014. “A nossa previsão é de IPCA na casa de 6% este ano”, disse o economista-chefe do BES Investimento, Jankiel Santos.

    » Ganho de R$ 31,9 bilhões

    O Banco Central teve resultado positivo de R$ 31,9 bilhões em 2013, o maior “lucro” já registrado pela instituição nos últimos anos. Comparativamente ao resultado de 2012, de R$ 25,6 bilhões, houve incremento de 24,6% no balanço do banco. Essa sobra no caixa foi proporcionada, sobretudo, pelos ganhos que a autoridade monetária teve com a administração das reservas internacionais e com os leilões de dólares realizados junto a bancos e corretoras. Parte desse dinheiro será repassada ao Tesouro Nacional em até 10 dias. A tendência é de que os recursos sejam integrados ao colchão de liquidez, montante que funciona, para o governo, como um seguro em tempos de turbulência nos mercados financeiros. 

     

    Fonte: Correio Braziliense

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