ENFRAQUECIMENTO DO ÓRGÃO NO GOVERNO FEDERAL EXPÕE OPOSIÇÃO À POLÍTICA TRIBUTÁRIA QUE FAVORECE EMPRESAS
Principal crítica dos servidores que defendem autonomia do fisco é o pacote de vantagens a múltis
CLAUDIA ROLLI, JULIO WIZIACK E MARIANA CARNEIRO DE SÃO PAULO
As vantagens concedidas pelo fisco às grandes empresas acirraram as divergências internas que existem na Receita e explicitaram o enfraquecimento político do órgão no governo federal.
“A panela de pressão”, expressão usada pelos servidores, estourou com a saída na semana passada de Caio Marcos Cândido, então subsecretário de fiscalização.
Ao deixar o cargo, ele enviou e-mail a cerca de 4.000 servidores informando que havia “ingerência” externa nas decisões do fisco.
Cândido defendia a independência da fiscalização, centrou fogo nos grandes contribuintes e se opôs ao novo pacote de benefícios em favor das empresas.
Para ele, o fisco perdeu poder nas decisões de cunho político. Em abril, a Receita nem foi consultada sobre o impacto de mais setores no plano desoneração da folha de pagamento. Quando isso ocorreu, a decisão estava tomada.
EMBATE
A insatisfação do ex-subsecretário (e de fiscais) começou ao menos há seis anos, quando ele fez parte do conselho de contribuintes da Receita (Carf), esfera em que as empresas podem contestar as autuações sofridas.
Houve embate entre conselheiros que votavam pela derrubada dos autos das grandes empresas, justamente os de maior valor.
Em abril de 2011, Cândido foi tirado do cargo de presidente do conselho para acomodar Otacílio Cartaxo, antecessor de Carlos Alberto Barreto na chefia da Receita.
Para que Cartaxo (já aposentado) pudesse assumir, uma mudança foi feita no regimento do conselho.
Ao assumir a fiscalização, Cândido defendeu a criação de grupos especiais para apurar suspeitas de sonegação em grandes grupos. Um deles seria da construtora Delta, investigada pela PF.
Recentemente, ele fez parte da equipe que elaborou a instrução normativa que cobrava imposto sobre dividendos das grandes empresas.
Para o fisco, as empresas já deveriam recolher esse imposto, mas não o faziam. As empresas argumentam que a cobrança exigiria lei específica.
RECUO
Quando a norma foi publicada, as empresas foram a Guido Mantega (Fazenda) reclamar da possível cobrança retroativa do imposto.
Em seguida, Barreto recebeu o presidente da Abrasca, associação que representa as empresas de capital aberto.
Antonio Castro, presidente da Abrasca, disse que, nessa reunião, o secretário da Receita afirmou que a norma seria revista por medida provisória, recuando da cobrança retroativa do imposto devido.
O pedido foi atendido e a medida provisória está prestes a ser publicada.
Procurado pela reportagem, por telefone, por meio de amigos e por e-mail, Cândido não foi localizado. Resposta automática de seu e-mail informa que está afastado até o dia 16 de novembro.
Fonte: Folha de S.Paulo