Superávit primário segue abaixo da trajetória da meta

    As estatísticas fiscais divulgadas na semana passada pelo Banco CENTRAL mostram que o governo encontra-se abaixo da trajetória para o cumprimento da meta de superávit primário do setor público consolidado deste ano, que inclui União, Estados, municípios e algumas estatais.

    O superávit primário acumulado em 12 meses até março somou R$ 86,217 bilhões, cifra que equivale a 1,75% do Produto Interno Bruto (PIB) estimado para o período. O percentual é menor que a meta de R$ 99 bilhões definida para 2014, que equivale a 1,9% do PIB projetado para o ano.

    Assim, será necessário intensificar o esforço fiscal nos próximos meses para cumprir o objetivo fixado em lei. Os desafios são grandes. Normalmente o Tesouro faz um superávit primário mais forte nos primeiros meses, acumulando uma “gordura” para queimá-la no segundo semestre, quando os gastos costumam aumentar.

    O resultado obtido pelo governo central (governo federal, Banco CENTRAL e INSS) no primeiro trimestre, de R$ 12,3 bilhões, foi o mais fraco desde quando, em fins de 1998, o governo Fernando Henrique Cardoso adotou o sistema de metas de superávit primário que, mantido e aprofundado pelos seus sucessores, reduziu as dúvidas dos investidores sobre a sustentabilidade da dívida pública no Brasil.

    Em 2013, o governo central também produziu um superávit fiscal modesto no começo do ano, mas ainda assim cumpriu a meta anual. Mas é bom lembrar que, na ocasião, valeu-se de imensas receitas extraordinárias no fim do ano, com o Refis, um programa de incentivo para o pagamento de dívidas tributárias, e o bônus de assinatura dos contratos de extração do pré-sal. Parece pouco provável que eventos dessa natureza venham a encher os cofres públicos também em 2014.

    O que parecia a boa notícia fiscal deste início do ano – o aumento do superávit primário de Estados e municípios – pode não se sustentar ao longo de 2013. O resultado obtido pelos governos regionais, que havia chegado à média de R$ 6,354 bilhões no primeiro bimestre, caiu a apenas R$ 482 milhões em março. É provável que os entes subnacionais só conseguiram um resultado mais forte nos dois primeiros meses do ano porque o Tesouro adiou para 2014 repasses constitucionais que deveriam ter sido feitos no exercício de 2013.

    A arrecadação de ICMS vem se recuperando desde o segundo semestre de 2013, mas a falta de controle mais firme dos níveis de endividamento de Estados e municipios impede que esses ganhos de receita se traduzam em aumento do superávit primário. Em março, a dívida bancária do setor público cresceu 5,7%, ou pouco mais de R$ 4 bilhões, enquanto que o crédito das instituições financeiras como um todo teve incremento de apenas 1%.

    Entre tantos dados negativos, a boa notícia das estatísticas fiscais foi a queda na despesa com juros. Os encargos líquidos da dívida pública somaram R$ 16,602 bilhões em março, abaixo dos R$ 19,359 bilhões do mesmo mês de 2013. Uma análise mais detalhada, porém, mostra que os ganhos não são perenes. O gasto com juros caiu apenas porque, no mês, o Banco CENTRAL teve uma receita extraordinária de R$ 6,2 bilhões com suas operações de “swap” cambial, graças à queda da cotação do dólar. Não se deve esperar ingressos de recursos como esses todos os meses. E a despesa com juros tende a subir em virtude da alta da taxa básica de juro e do aumento da dívida mobiliária federal.

    A própria valorização cambial teve impacto negativo na dívida líquida do setor público, que passou de 33,7% do PIB para 34,2% do PIB. O dólar mais fraco reduziu o valor das reservas internacionais, quando contabilizadas em reais. O dado alentador é que a dívida bruta do governo geral, que os investidores passaram a acompanhar mais de perto depois que o governo passou a usar operações parafiscais por meios de bancos oficiais para sustentar o gasto público, ficou praticamente estável em 57,5% do PIB no mês.

    Nada disso significa que seja impossível cumprir a meta fiscal de 2014. O governo causou boa impressão nos mercados ao divulgar o decreto orçamentário do primeiro quadrimestre, que sinalizou uma trajetória fiscal realista. As estatísticas fiscais até março, porém, mostram que essa declaração de princípios ainda não se traduziu, de forma visível, na execução do orçamento federal.

     

    Fonte: Valor Econômico

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