A trégua vista após a reunião do Federal Reserve (Fed, Banco CENTRAL americano) na quarta durou pouco. A disparada global do dólar ontem mais uma vez afetou o real de forma mais intensa, com a moeda americana batendo em R$ 3,30.
As oscilações frequentemente mais fortes no mercado local são um sinal de que o olhar do investidor estrangeiro com relação ao Brasil segue permeado de cautela, dadas as incertezas domésticas, com aumento do risco político, dúvidas sobre o ajuste fiscal e preocupação com a situação da Petrobras.
Embora o Fed tenha indicado que será muito cauteloso na condução da normalização da política monetária, os ativos seguem sob efeito da expectativa de que eleve a taxa referencial de juros em meados deste ano, o que sustenta a alta global do dólar.
Nesse cenário, o real mais uma vez liderou as perdas ante a moeda americana. O dólar subiu 2,55%, para R$ 3,2941, maior patamar desde 1º de abril de 2003.
A desvalorização do câmbio deu suporte ao aumento dos prêmios no mercado de juros futuros, que também foram pressionados pela alta dos rendimentos dos títulos do Tesouro americano (Treasuries) e pelo megaleilão de títulos prefixados do Tesouro Nacional. Analistas reconhecem que os níveis de preço tanto do câmbio quanto dos juros e da bolsa estão mais atrativos, mas as incertezas locais limitam os investimentos no Brasil.
Para o operador de renda fixa da Quantitas Asset Management Klaus Nery, boa parte da fragilidade decorre do intenso ruído político no país, que atrapalha a aprovação das medidas de ajuste fiscal. Uma evidência disso, diz Nery, é o fato de o Tesouro Nacional continuar fazendo megaofertas de Letras Financeiras do Tesouro (LTN) de curto prazo para financiar a dívida pública. “Em mercado financeiro isso não quer dizer outra coisa a não ser piora de crédito.”
No caso específico do câmbio, Nery diz que tudo indica que a valorização do dólar prosseguirá, em boa parte também pelo entendimento de que o BC quer acabar com o programa de “ração” diária, que foi estendido até o fim do mês.
O chefe de pesquisa de câmbio do Banco Julius Baer, David Kohl, também vê espaço para o real cair mais. Em primeiro lugar, porque a moeda brasileira ainda não está profundamente desvalorizada contra o dólar, em comparação com outras divisas, sendo o euro e o iene os casos mais extremos. Segundo, o Brasil precisa de um câmbio mais fraco para reequilibrar o déficit em transações correntes e na balança comercial. E em terceiro, o país passa por uma “tempestade perfeita”: uma combinação entre economia próxima da recessão, com o BC tendo que elevar os juros para conter a inflação e o risco de rebaixamento do “rating” soberano.
“Como ainda vai demorar algum tempo para o Brasil resolver alguns de seus desequilíbrios, acho que há muito pouca inclinação para ver os ativos brasileiros como oportunidade de investimento agora”, diz Kohl, que revisará nos próximos dias para R$ 3,50 sua estimativa para o dólar.
Apesar do câmbio ter alcançado o patamar de R$ 3,30, ele ainda é o ativo brasileiro que tem mais espaço para andar em uma piora do cenário doméstico, afirma a estrategista de câmbio para América Latina do Royal bank of Scotland (RBS), Flavia Cattan-Naslausky. A estrategista vê a possibilidade do dólar atingir o patamar de R$ 3,50, dependendo da reação do mercado à divulgação do balanço da Petrobras, devendo encerrar o ano com uma taxa de câmbio média de R$ 3,30.
No mercado de juros, Flavia não vê muito espaço para aumento dos prêmios de risco, principalmente nos contratos de curto prazo. Ontem, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2016 subiu para 13,77%, ante 13,65% do ajuste anterior.
Fonte: Valor Econômico