União eleva dividendos, tira R$ 3,5 bi do fundo soberano, mas não garante meta

    Por Leandra Peres e Edna Simão | De Brasília

    O governo sacou R$ 3,5 bilhões do fundo soberano, reduziu em R$ 7 bilhões a estimativa de despesas obrigatórias e obrigará as estatais federais a transferirem mais R$ 1,5 bilhão em dividendos este ano para evitar cortes de gastos às vésperas da eleição. Tudo isso para compensar uma frustração superior a R$ 14 bilhões nas receitas de impostos por causa do fraco crescimento da economia e de uma menor arrecadação com o Refis. Mas nem assim conseguirá assegurar o cumprimento da meta de superávit primário de 1,9% do PIB para 2014.

    O relatório de avaliação de receitas e despesas publicado ontem pelo Ministério do Planejamento diz que o governo fez uma “revisão no cronograma de pagamentos” do socorro prometido às distribuidoras de energia elétrica e também no pagamento de subsídios e subvenções de programas oficiais e do Proagro.

    Apesar de o texto enviado ao Congresso falar num novo cronograma, o Tesouro Nacional informou ao Valor que não está transferindo despesas para o novo presidente. “A reestimativa de despesa da CDE decorre da confirmação de ingresso de recursos de mais de R$ 1 bilhão referentes à Celg e o restante decorrente de reestimativa de despesa para esse ano. No item subsídios, subvenções e Proagro, também houve reestimativa de despesas. Não há adiamento de gastos”, assegurou por meio da assessoria.

    Segundo a revisão, o governo deixará de gastar R$ 4 bilhões com a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), por onde passa o subsídio que o Tesouro dá para evitar aumentos nas tarifas de energia, e também R$ 3 bilhões com os subsídios. O governo havia anunciado o reforço à CDE em março. Ontem, restabeleceu o gasto em R$ 9 bilhões, originalmente previstos no Orçamento de 2014.

    Além de revisar o pagamento da CDE e de subsídios e subvenções, o governo também reduziu a despesa com pessoal em R$ 2,2 bilhões e com precatórios em R$ 113 milhões. Elas são despesas obrigatórias, ou seja, o valor dos desembolsos é estabelecido em lei e a União não pode deixar de quitar a dívida. Isso significa que um corte feito nas estimativas de despesas obrigatórias é pouco efetivo.

    As receitas da União também foram infladas pelo saque de recursos do fundo soberano. Os R$ 3,5 bilhões são considerados receita primária do Tesouro, porque o fundo tem seus recursos apartados da contabilidade federal. Capitalizado em 2010, o fundo soberano é uma espécie de poupança que a União fez para, à época, conter a valorização da moeda brasileira. O primeiro saque ocorreu em 2012, quando o governo recorreu à contabilidade criativa para fechar as contas do ano. Com essa nova retirada, o governo zerou o saldo do fundo.

    As manobras feitas no relatório de avaliação de receitas e despesas têm um único objetivo: compensar a frustração na arrecadação de 2014. O crescimento da economia, que foi revisto de 1,8% para 0,9% nas projeções do governo, fez com que a receita de tributos e contribuições caísse R$ 14,7 bilhões no ano em relação ao que o governo havia projetado. A chamada receita administrada foi revista de R$ 780,3 bilhões para R$ 765,6 bilhões. Houve também uma queda na previsão de receitas extraordinárias, entre elas o Refis, que permite o pagamento de dívidas com descontos de multas e juros.

    Parte da perda é compensada com uma menor transferência de recursos para Estados e municípios. O Ministério do Planejamento calculou esse ganho em R$ 2 bilhões. O governo também acredita que conseguirá arrecadar R$ 2,1 bilhões extras com as chamadas receitas não administradas. Nesse caso, as estatais federais pagarão a maior parte da conta, já que o ajusta nessa receita é na rubrica de dividendos, que subirá R$ 1,5 bilhão. Com isso, o governo aumentará a arrecadação com dividendos de R$ 23,9 bilhões para R$ 25,4 bilhões.

    Mesmo depois dos ganhos esperados na receita, o governo ainda teria um rombo de R$ 10,5 bilhões para cobrir e precisaria cortar despesas ou reduzir a meta de superávit primário de 2014 para conseguir equilibrar o Orçamento.

    A opção foi usar o dinheiro do fundo soberano e cortar despesas obrigatórias. Não houve ajuste na meta fiscal deste ano. O Ministério da Fazenda continua oficialmente comprometido com a meta de 1,9% do PIB, o equivalente a R$ 99 bilhões, para todo o setor público. As projeções feitas pelo mercado financeiro são de uma economia de, no máximo, 1% do PIB.

    O relatório divulgado ontem manteve a projeção do governo para a inflação do ano – 6,2%, medida pelo IPCA – e o cálculo do PIB deste ano, mesmo ajustado para 0,9%, ainda está acima do que espera o mercado, que projeta 0,3%.

    A próxima reavaliação de receitas será divulgada no fim de novembro, após as eleições. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, já sinalizou que o esforço fiscal de 2014 terá que ser reduzido.

     

    Fonte: Valor Econômico

    Matéria anteriorDilma destacará índices sociais e Marco Civil na ONU
    Matéria seguinteServidores do IBGE criticam “caça às bruxas”