Edição 80 - 20/08/2019

AUTONOMIA DO BANCO CENTRAL DO BRASIL, COAF

Qual o modelo de Banco Central que melhor se ajusta às necessidades do Sistema Financeiro Nacional é uma discussão que se mantém acalorada entre especialistas da área há muitas décadas, aqui e lá fora.

O Sinal elaborou o projeto “Sistema Financeiro Cidadão” a partir da XXII Assembleia Nacional Deliberativa (AND), de 2008, em Canela (RS), no intuito de oferecer uma proposta de Projeto de Lei de Regulamentação do Artigo 192 da Constituição Federal, que trata do Sistema Financeiro Nacional.

Apesar de todo o esforço do Sindicato e de políticos progressistas, interessados na aprovação de um Banco Central autônomo que se abrisse à participação da Sociedade Brasileira nas diversas instâncias de elaboração, fiscalização e controle do Sistema Financeiro, o projeto não conseguiu avançar e se tornar lei.

As enormes dificuldades enfrentadas apenas confirmaram o jogo político pesado utilizados por instituições financeiras e grupos empresariais quando o assunto é a manutenção de um Sistema Financeiro segregado da produção econômica e das necessidades do cidadão comum. O financiamento da dívida pública, a indústria dos fundos de investimentos, assim como a proteção dos seus agentes financeiros deveriam ser preservados a todo custo.

As sucessivas crises econômicas pelas quais passou o Brasil na última década reviveram a discussão a respeito de que ferramentas deveria ter um Banco Central para oferecer credibilidade à sua própria política monetária.

Ao que parece, o Sistema de Metas de Inflação foi apenas o último dos grandes modismos em uma longa série história de políticas criadas pelos Bancos Centrais. As autoridades monetárias acreditam que elas têm uma missão a cumprir – e, em uma economia de mercado genuinamente livre, isso não existiria -, e, consequentemente, não deveria ser surpresa alguma o fato de que elas vão tropeçando de erro em erro, e até mesmo reciclam erros antigos quando os novos resultam em retumbantes fracassos.

No governo Temer a ideia de um Banco Central com mandatos fixos de seus diretores, ao estilo clássico, afastados das pressões políticas, passou a ser vendida como uma solução definitiva e não mais um modismo.

Atualmente, em retração econômica aguda (acabamos de entrar em recessão técnica com dois trimestres seguidos de recuo na economia), o atual governo, que busca desesperadamente algo que faça retornar o otimismo dos investidores, comprou a ideia.

Para nós, Servidores do Banco Central do Brasil, a proposta atualmente colocada sobre a mesa, por sua forma extremamente enxuta, traz mais incógnitas do que esclarecimentos. Ela, de fato, vai pouco além da fixação dos mandatos da Diretoria, os únicos cargos considerados de Natureza Especial.

Apesar dos encontros que vêm sendo realizados pelo Sinal com pessoas responsáveis pelo projeto de lei, questões importantes como a real situação dos Servidores em um “novo” Banco Central e outros assuntos correlatos (que vêm sido debatidos no Apito Brasil) ainda não passam de conjecturas, visto que não há qualquer fiador político para tal. Até o momento o projeto apenas se destina ao público externo: o Mercado.

Diante deste quadro, a ideia de que a autonomia prevista seria um grande “guarda-chuva” para os Servidores da nossa Instituição, enquanto o restante do funcionalismo público se “derreteria” pelas medidas de um governo francamente hostil ao Serviço Público Federal, ainda está longe de se consolidar em fatos.

Um elemento que merece grande interesse é a alocação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) dentro da nossa Autarquia. O seu tratamento poderá ser um balizamento importante de como as atividades serão encaminhadas aqui dentro.

O COAF é um órgão de inteligência responsável por identificar operações de lavagem de dinheiro. Ele contribui identificando possíveis fluxos de dinheiro ilícito que podem vir da corrupção, mas não tem a finalidade de investigar este crime, e nem poderia, porque essa é uma atribuição das forças policiais.

Desde sua criação, o COAF já produziu cerca de 40 mil Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs). Somente no ano passado, foram 7.279 relatórios, que listaram cerca de 330 mil comunicações de operações suspeitas e em dinheiro em espécie, segundo balanço de 2018.

O COAF, no Brasil, é um órgão muito pequeno em relação às outras Unidades de Inteligência Financeira da Europa. Ele é pequeno, tem pouca verba e tem poucos funcionários, em relação às Unidades de Inteligência Financeira europeias.

No Brasil, o COAF tem 37 servidores. Para se ter uma ideia, a Unidade de Inteligência Financeira alemã, depois das mudanças que se concretizam em 2019, vai ter mais de 1.200 funcionários. Ela já tem 1.000. Além dos policiais, membros do Banco Central e da Receita, eles contrataram também muitos advogados, por exemplo, especialistas em direito societário, tributaristas. Para dizer assim: talvez um técnico da Receita entenda exatamente como alguém fraudou o imposto, mas o especialista vai entender ainda melhor a estrutura societária que este cara utilizou.

O nosso COAF tem muito pouca gente para fazer essa análise. E, comparado com o exterior, o Brasil é um país com pouco controle de capital. Entra muito dinheiro, sai muito dinheiro daqui. Mas a verdade é que a real dimensão e o controle destes fluxos e dos agentes que transportam valores de origem ilícita ainda são mínimos.

O COAF está sendo trazido para o BCB sob a desculpa de ser tirado da disputa política. Porém, só o tempo dirá se isto significa uma nova forma de controle ou, como muitos desconfiam, remetê-lo à caixa-preta do Banco, onde suas informações estarão fora de alcance da Sociedade.

Acreditamos que os Servidores do Banco Central do Brasil devem lutar para que a autonomia realmente represente um novo Banco Central, porém não uma volta à caixa-preta como era conhecido há anos atrás, e sim um Banco Central efetivo e atuante na Sociedade Brasileira.

Se a busca por melhores condições de trabalho e de remuneração são causas legítimas, enganam-se redondamente aqueles que acreditam que a falta de manifestação e a colaboração irrestrita com tudo que a Alta Administração estabelece seja a melhor forma de alcançar estes objetivos.

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