
Edição 76- 17/6/2025
PEC 65 e o Clima Organizacional: uma rachadura anunciada
O Banco Central do Brasil, apesar dos inúmeros desafios que enfrenta, vinha construindo um ambiente de coesão interna com seus servidores, unidos, buscando o reconhecimento da relevância da instituição e o enfrentamento das persistentes assimetrias remuneratórias. Esse cenário de união, no entanto, foi profundamente abalado pela apresentação da Proposta de Emenda à Constituição nº 65, que propõe transformar o Banco Central em uma entidade de direito privado.
A proposta, além de mal formulada, gerou confusão e profunda divisão entre os servidores da Casa. Logo na primeira reunião oficial sobre o tema, realizada em fevereiro de 2024 no auditório do Banco em Brasília, ficou evidente o impacto desagregador da PEC 65. A direção apresentou seus argumentos, mas a reação de grande parte dos presentes — tanto ativos quanto aposentados — foi de forte rejeição. A proposta, carregada de riscos e lacunas, soou para muitos como uma falsa solução para os problemas que estavam sendo enfrentados.
A partir dali os encontros passaram a ser segmentados: ativos em um espaço, aposentados impedidos de participar. Uma escolha deliberada que indicava mais do que um erro estratégico — revelava uma tentativa de dividir a categoria, enfraquecendo a oposição à PEC 65. Supunha-se que os ativos seriam mais receptivos. A realidade mostrou o contrário.
Com o debate amadurecido pelo SINAL, foi realizada Votação Eletrônica aberta à categoria. O resultado foi claro: 51% dos servidores ativos e 74,5% do total (considerando ativos e aposentados) se posicionaram contra a PEC 65. A rejeição não era apenas à forma, mas ao conteúdo da proposta. A instituição estava rachada — e não se tratava de uma fissura, mas de uma fratura profunda, com potencial destrutivo para o clima organizacional e, por consequência, para a saúde institucional do Banco Central.
O que foi feito diante disso? A resposta, infelizmente, parece ser: nada. Nenhuma medida efetiva para conter os ânimos ou restaurar a coesão foi tomada. Pelo contrário, alimentou-se a discórdia. O ambiente virtual, que poderia ser espaço para debate respeitoso, passou a abrigar ataques misóginos, etaristas e ofensivos. Nas redes internas, como o “Cafezinho”, a toxicidade atingiu níveis incompatíveis com uma instituição de Estado.
Em vez de pacificar, algumas ações sugeriram uma estratégia deliberada de deslegitimação do SINAL — entidade que representa legalmente a categoria — e da própria Votação Eletrônica. Tais ações, que podem ser interpretadas como práticas antissindicais, abriram caminho para novos ataques, culminando em um episódio inaceitável: a publicação de uma charge em que o presidente do Banco Central aparece desferindo um soco na cabeça de uma figura que representa o SINAL — e, por consequência, todos os servidores representados por ele.
Que mensagem transmite essa imagem? Será esse o retrato que queremos de uma liderança institucional — a de quem destrói, em vez de construir? Quais os limites desse tipo de conduta? E, mais importante: até quando vamos assistir à escalada de agressões sem qualquer reação institucional?
É urgente que medidas sejam tomadas para restaurar a civilidade e o respeito mútuo no debate interno. O Banco Central deve voltar a ser exemplo de diálogo, não de confronto. O momento exige liderança verdadeira — aquela que escuta, acolhe e constrói soluções com base no respeito e na pluralidade.
Não buscamos embates judiciais, mas, se necessário, recorreremos a eles para garantir que direitos fundamentais e limites institucionais sejam respeitados. Ainda acreditamos no diálogo transparente e responsável como caminho. E esperamos que aqueles que têm poder para agir o façam antes que o prejuízo se torne irreparável — para o clima organizacional, para a imagem institucional e para o futuro da própria autoridade monetária brasileira.