Edição 67 - 15/07/2005

Antes do Déficit Zero, é preciso lançar o Corrupção Zero

A ser adotada pelo governo, a proposta de Déficit Zero desviará (mais) recursos do social para banqueiros e empresários. Por tabela, praticamente congelará – por no mínimo 5 anos – os salários do funcionalismo público. 

O Plano é defendido por Delfim Netto (PP-SP), que, segundo a imprensa especializada, recebeu do governo a incumbência de conquistar apoio para a proposta entre empresários e parlamentares. Apoiado pelo Ministro Palocci, o Déficit Zero faz parte de uma “agenda positiva” do governo para tentar reverter este momento de crise.

O que o Plano propõe: 

déficit nominal zero (pagamento integral do serviço da dívida) e uma esperada gradual redução dos juros, a posteriori, através de mecanismos de mercado.

Como isso se daria:

via corte de despesas do setor público (choque de gestão) e aumento da DRU (Desvinculação de Receitas da União), de 20 para 40% (veja boxes no verso). 

– Uma simulação do projeto (pela ótica do governo): 

a FIESP, que o defende, avalia que um corte anual de 2%, no mínimo, das despesas públicas entre 2006 e 2011 (mais a manutenção dos gastos até 2015) permitiria, de um lado, redução dos juros, e de outro o aumento expressivo do crescimento do País.

– As conseqüências do projeto (pela ótica de opositores a essa lógica
econômica):

1. Redução dos juros x corte de despesas públicas:

a) a primeira estimula o crescimento, mas sua esperada implementação não é garantida, porque depende da reação do mercado e de outras questões incontroláveis;

b) o segundo opera em sentido contrário: esfria a economia, pois tende a diminuir os investimentos públicos.

2. Os gastos com juros equivaleriam praticamente a ¼ das despesas públicas totais: o governo usará, com investimentos e consumo, 25%menos recursos, que se destinarão ao acúmulo de riquezas (compra de títulos públicos, p.ex.) pelos setores mais ricos da sociedade;

3.  O aumento da DRU prejudicaria ainda mais investimentos em saúde e educação.

O que o Déficit Zero tem a ver com o funcionalismo público:

1.  A economia do consumo, por parte do governo, inclui diminuição – ou congelamento – de gastos.  Isso significa que vêm por aí arrocho e intransigência ainda maiores quanto às políticas fiscal e salarial.

2.  Não dá para esperar mais ONZE anos pelo paraíso econômico, em que todos seremos felizes.  O Brasil está farto desse remédio amargo, que parece querer matar a todos da cura.

3. Os recentes e renovados escândalos – ainda que não todos provados e com culpados descobertos – mostram que graves são o desvio, a corrupção e a sonegação de milhões.  Assim como a quantidade – 20000 – de cargos em comissão no governo, concedidos não por critérios técnicos, mas por filiação partidária. 

Déficit Zero não é uma fórmula mágica, que vá funcionar matematicamente.  Ela depende fundamentalmente, como já vimos, e em muito, da reação positiva do mercado, além de outras variantes. 

O sacrifício será grande para toda a sociedade:  isso se pode garantir.  O benefício?  Esse poderá vir, ou não, em mais ou menos tempo.

Combater sem tréguas os sonegadores e corruptos deveria ser prioridade num governo que deve tanto às áreas sociais.  Uma boa pergunta é como fazer isso com funcionários poucos e mal pagos, enxugados por essa proposta.

Se houvesse um Plano Corrupção Zero, o dinheiro jorraria de tantas fontes quantos são os ralos impunes que hoje esvaziam os cofres públicos.  Isso não levaria cinco anos para ser feito … e não continuaria a fazer dos gastos do governo o inimigo público número 1 da sociedade brasileira. 

O que é a DRU?
Mecanismo que permite atualmente ao governo federal despender livremente 20% de suas receitas.

O que é choque de gestão:
A reestruturação, e conseqüente enxugamento, da “… obsoleta e acomodada máquina adminis­­trativa…” (*) do Estado, no sentido de dar-lhe eficiência.

(*) Delfim Netto, em artigo na pág. 37 da revista CartaCapital de 13.7.05.

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