Edição 0 - 27/08/2002

A Glosa B é para poucos – Isonomia entre membros de Poder e a Medida Provisória n° 46/2002

A aprova‡Æo recente pelo Congresso Nacional da Lei nø 10.442, de 27 de julho de 2002, trouxe novamente … baila a questÆo da remunera‡Æo dos membros de Poder, e da aplica‡Æo ison“mica dos tetos de
remunera‡Æo no servi‡o p£blico.
A referida Lei ‚ o corol rio de uma celeuma que vem desde, pelo menos, 1998, quando a Emenda
Constitucional nø 19/98 alterou as regras relativas … composi‡Æo remunerat¢ria dos membros de Poder e
ocupantes de cargos eletivos, assim como a disciplina do teto de remunera‡Æo. A partir da EC nø 19/98, o
teto de remunera‡Æo passou a ser a remunera‡Æo percebida pelos Ministros do STF, incidindo esse teto
sobre a totalidade das parcelas remunerat¢rias, mesmo aquelas percebidas em razÆo de exerc¡cio
cumulativo de cargos autorizado pela Constitui‡Æo ou decorrente da acumula‡Æo de proventos e
remunera‡äes. Al‚m disso, fixou-se a regra do “subs¡dio”, por meio da qual os ocupantes de cargos
eletivos, magistrados e membros do Minist‚rio P£blico nÆo poderia perceber quaisquer outras vantagens
senÆo o “subs¡dio” e, no caso dos membros do Poder Legislativo, a parcela extraordin ria correspondente
… convoca‡Æo extraordin ria, no valor m ximo de um subs¡dio. Esse sistema remunerat¢rio, contudo,
dependia da aprova‡Æo pelo Congresso Nacional de um projeto de lei de iniciativa conjunta do Presidente
da Rep£blica, do Presidente do STF, do Presidente da Cƒmara dos Deputados e do Presidente do Senado
Federal que, aprovado, fixaria o valor que, a partir de entÆo, passaria a ser o novo teto de remunera‡Æo,
v lido para todos os Poderes e todas as esferas.
Passados 4 anos da vigˆncia da EC 19/98, tal projeto nunca se concretizou; em 1999, o Presidente da
Rep£blica envio ao Congresso a Proposta de Emenda Constitucional nø 137, que propunha a autoriza‡Æo
para a fixa‡Æo e subtetos de remunera‡Æo na UniÆo, nos Estados, no DF e nos Munic¡pios e em cujo texto
aprovado pela ComissÆo Especial, mas at‚ hoje nÆo apreciado em Plen rio, fixava-se, transitoriamente, o
teto de R$ 11,5 mil, excepcionando-se, contudo, as vantagens de car ter indenizat¢rio ou extraordin rio.
Na ausˆncia de delibera‡Æo, e acumulando os pr¢prios membros de Poder e titulares de mandato eletivo perdas remunerat¢rias, desde 1995, que chegam a quase 100%, em vista da infla‡Æo acumulada neste per¡odo, o Presidente do STF enviou ao Congresso, no uso de prerrogativa constitucional, projeto de lei que, sinteticamente, fixa um novo valor de vencimento para os Ministros do STF, no valor de R$ 3,95 mil, sobre o qual incide a representa‡Æo mensal, totalizando R$ 12,7 mil. A esse valor, acresce-se ainda o percentual decorrente de tempo de servi‡o, podendo-se chegar a cerca de R$ 17.145. Aos Ministros do STF que exercem fun‡äes na Justi‡a Eleitoral, aplica-se ainda o valor correspondente a cada sessÆo, at‚ o m ximo de 8 sessäes mensais, … propor‡Æo de 3% por sessÆo, totalizando at‚ 24% sobre o valor de R$ 12,7 mil. Assim, um Ministro do STF ter  remunera‡Æo de at‚ R$ 15,7 mil ou, somado o adicional por tempo de servi‡o, que ‚ vantagem pessoal, at‚ R$ 20.198.
Esta Lei tramitou em prazo recorde, e para analistas atentos do processo legislativo isso significou a aquiescˆncia do Chefe do Poder Executivo com um valor que, at‚ pouco tempo atr s, era considerado
excessivamente elevado, para fins da fixa‡Æo do teto remunerat¢rio, que deveria ser, como reza a EC nø19/98, a remunera‡Æo dos Ministros do STF.
Todavia, esse epis¢dio nÆo ocorreu sem trazer algumas surpresas. Foi inusitada, sob certos aspectos, a edi‡Æo, na v‚spera da san‡Æo do Projeto, que se converteu na Lei nø 10.474, de 27 de junho de 2002, da Medida Provis¢ria nø 46, de 25 de junho de 2002, cuja cl usula revogat¢ria, contrariando expressamente a Lei Complementar nø 95/98, traz a revoga‡Æo do par grafo £nico do art. 1ø da Lei nø 8.448, de 1992.
A questÆo, assim colocada, parece herm‚tica, mas a olhos atentos significa, na pr tica, o fim da isonomia dos tetos remunerat¢rios, fixada na lei de 1992, ainda no Governo Collor, e que permitiu, mais de uma vez,que o Poder Judici rio elevasse a remunera‡Æo dos seus membros sem a aprecia‡Æo de lei pelo Congresso Nacional.
Diz o citado par grafo que os valores percebidos pelos membros do Congresso Nacional, pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal e pelos Ministros de Estado, sempre equivalentes, serÆo o teto de remunera‡Æo, em cada Poder.
Se tal dispositivo permitiu aos Ministros do STF e demais membros da magistratura, no passado, aplicar a isonomia em seu favor, sem necessidade de lei, nÆo seria inusitado que, agora, produzisse os mesmos efeitos em sentido inverso, ou seja, permitindo aos membros do Poder Legislativo elevar, sem necessidade de lei, os seus subs¡dios e representa‡äes. A revoga‡Æo, … v‚spera da promulga‡Æo da Lei que fixou o novo “paradigma”, colocou uma p  de cal sobre essa possibilidade, impedindo, inclusive, o efeito desse reajuste sobre as demais esferas de governo, por meio da aplica‡Æo da propor‡Æo constitucional entre remunera‡äes de parlamentares federais, estaduais e municipais.
 claro que, por detr s da decisÆo do Exmo. Sr. Presidente da Rep£blica, est  a preocupa‡Æo em evitar o aumento dos gastos p£blicos e evitar que os servidores que hoje sofrem redu‡Æo por conta do teto em vigor possam ser beneficiados. Mas tal preocupa‡Æo colidiu frontalmente com o que ‚, ainda, princ¡pio constitucional – o direito … igualdade – convertendo o que seria um reajuste l¡cito num arremedo de privil‚gio, dirigido apenas ao Poder Judici rio. Mais ainda, deixou aberta a possibilidade de questionamento judicial e pol¡tico de sua iniciativa, adotada autoritariamente por meio de medida provis¢ria que, contudo, ainda precisar  ser apreciada pelo Congresso no corrente ano.
Os resultados, embora nÆo possam ser previstos, podem ser estimados: cabe ao Congresso Nacional avaliar a conveniˆncia, a constitucionalidade e a legitimidade da revoga‡Æo. E, passo seguinte, decidir sobre a remunera‡Æo que deve ser paga aos seus membros pelo exerc¡cio dos mandatos.
As perdas inflacion rias acumuladas desde 1995 demonstram que o valor estabelecido – R$ 15,7 mil – nÆo ‚ absurdo, permitindo, basicamente, a recupera‡Æo do poder de compra corro¡do desde 1995. Ademais, ‚ hora de enfrentar o problema das remunera‡äes dos membros de Poder sem hipocrisia e dando ao assunto
a transparˆncia que merece. Ou esse tema continuar  a frequentar as p ginas jornal¡sticas como escƒndalo, nos pr¢ximos anos…

Advogado, mestre em administra‡Æo,
especialista em pol¡ticas p£blicas e gestÆo
governamental.
Assessor T‚cnico da Cƒmara dos Deputados

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