Edição 19 - 11/03/2011

BOCA LIVRE – Ideia, crítica & debate, nº 19, de 11.3.11: De compromissos e responsabilidades

 

BOCA LIVRE

Ideia, crítica & debate                 

São Paulo, 11 de março de 2011 – nº  19

EDITORIAL

O texto aqui apresentado, de Idalvo Toscano, tece considerações sobre valores que devem orientar as instituições públicas, como é o caso do Banco Central. O artigo participou, sem obter classificação, do concurso Nossos Valores (BC – "Projeto Mais").

Economista, com mestrado em Planejamento Urbano pela FGV/SP, Idalvo é coordenador de Estudos Técnicos do Sinal-SP e ativista do movimento de Economia Solidária.

Boa leitura!

De compromissos e responsabilidades

Idalvo Toscano

As instituições republicanas são peculiares: trazem indelével identidade entre missão e responsabilidade social. Existem para servir ao cidadão e, como não há cidadania sem vida coletiva, são os interesses maiores da convivência social, do equilíbrio e harmonia com as demais instituições do Estado que devem orientar suas ações.

Já na esfera privada, ao contrário, os “compromissos institucionais” alcançam propósitos restritos e não há a obrigatoriedade de se praticar ações de “responsabilidade social”, embora a boa doutrina dos tempos atuais preconize tal atitude como marco civilizatório.

 Os propósitos dos Mercados se relacionam com os interesses privados, enquanto as “coisas do povo” – "res publica" – são tratadas pelo Estado e ambos não se confundem: extraordinárias criações da civilização Mercado e Estado servem a intentos distintos, mesmo que em algumas poucas situações não excludentes. Assim, pensar diferentemente instituições privadas e republicanas torna-se mister quando invocamos o compromisso e a responsabilidade social das mesmas.

O comprometimento dos  funcionários das empresas privadas volta-se à assunção dos valores e objetivos que os empresários estabelecem para suas atividades. Há, sem duvida, limites éticos a tais práticas. Estes, uma vez ultrapassados,  impõem a observância dos procedimentos legais estabelecidos. Permanece, todavia, uma enorme margem de manobra em que perseguir os objetivos institucionais pode ser invocado como inerente à atividade na empresa.

Toda empresa capitalista almeja alcançar a máxima lucratividade; entretanto, se para  tanto lançar mão, por exemplo, de expedientes que comprometam a saúde e/ou lesem os consumidores, o compromisso institucional deve ser rompido, de forma unilateral, sob o império da lei; da parte da empresa, torna-se  evidente a erosão de sua responsabilidade social.

No serviço público, “compromisso institucional” e “responsabilidade social” coincidem  necessariamente, exceto quando os gestores públicos imprimem sua visão particular a tais diretrizes, o que não é raro. A defesa de uma pretensa autonomia de gestão que possa produzir uma situação da espécie, reflete uma visão ultrapassada do que deva  ser a administração pública.

Assim,  ao contrário do que se verifica privadamente, as instituições públicas se subordinam ao império dos desígnios republicanos e às leis que os regulamentam. O mote amplamente difundido “manda quem pode, obedece quem tem juízo” acaba por refletir omissão e negligência com a coisa pública e, por isso mesmo, quem o acata é passível de responsabilização penal, pois pratica  um delito funcional.

Na esfera pública, não há patrão que não seja a sociedade. Somos, portanto, servidores do Estado – que não se confunde com o governo e representa, por excelência, a mais elevada instância de organização social. Destarte, somos prestadores de serviços ao público; é essa a exata noção que, em geral, falta, não somente a nós servidores, mas à gestão burocrática do Estado: a práxis cotidianamente comprometida com os interesses coletivos.

Para se fomentar uma cultura organizacional voltada a tais propósitos, urge adensar espaços democráticos nas relações de trabalho, substituindo o conceito de comando hierárquico "inter corporis" pelo de participação efetiva e decisões compartilhadas, com foco nos interesses republicanos, de todos os envolvidos, inclusive dos usuários dos serviços públicos.

Esta é uma questão cultural e, especificamente, de cultura organizacional. Sabemos que mudanças culturais não são episódios que sucedam de forma “indolor”: rupturas com padrões comportamentais vigentes, interesses cristalizados e enraizados, com o exercício do “pequeno poder” cotidiano e outros “vícios burocráticos” são fontes de enorme resistência e desconhecemos qualquer “fórmula pronta” que permita alcançarmos eficácia na administração pública sem que persiga o interesse coletivo.

Assim, assumir compromissos com atividades públicas vincula-se, inevitavelmente, à assunção de responsabilidades para com os pressupostos da "res publica".

PALAVRAS FINAIS

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