“Ciao”, Mário Mesquita
O SINAL considera equivocada e eivada de parcialidade a declaração do diretor de Política Econômica do Banco Central, Mário Mesquita, ao Correio Brasiliense, onde afirmou que o maior culpado pelas novas previsões altistas para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) são os gastos públicos, especialmente os de difícil reversão, como a matéria publicada no O Globo.
Estudo divulgado pelo IPEA em janeiro de 2008 mostra que a média dos gastos com salários do governo federal em relação ao PIB, no período 2000/2002, era de 5,13%.
Caiu para a média de 4,79% no triênio 2003-2005 e, segundo matéria publicada n'O Globo em 2.9.2009, passará a 5,11% em 2009 e 5,09% em 2010, permanecendo, portanto, em níveis ainda abaixo do período FHC.
Os recentes aumentos salariais, portanto, não fizeram mais do que corrigir OITO anos de arrocho salarial patrocinado pelo Governo Fernando Henrique.
E mais. Neste ano, as despesas do governo ficarão dentro das receitas (superávit primário positivo). Para 2010, com crescimento econômico, a situação estará mais favorável. Se tivesse visão do todo e de todos os aspectos, inclusive os benefícios de cada uma das medidas, haveria alguma coerência na declaração do Diretor. São notórios o viés ideológico, o vício de argumento e a miopia política do diretor do Banco Central.
Quanto ao número de servidores, o mesmo estudo mostra que o percentual de servidores públicos nas três esferas de poder do Brasil é inferior à maioria dos países pesquisados – desenvolvidos e em desenvolvimento. Consideramos que a valorização salarial do funcionalismo contribui para a prestação de serviços qualificados ao cidadão.
Lembramos que a reversão do desmonte no BC, com o nivelamento salarial com as carreiras típicas de Estado, vem contribuindo para evitar a evasão de quadros. Perguntamos ao Diretor: estivesse o BC sucateado, o país teria tido a excelente performance durante a crise? Achamos que não.
Não sabemos a que outros "gastos de difícil reversão" se refere o Diretor, mas imaginamos que seja o aumento real do salário mínimo e do Bolsa-Família. Consideramos natural o Governo Federal aumentar seus gastos e promover cortes de impostos em momentos de crise, sobretudo para proteção dos mais pobres. Essas medidas têm contribuído para tirar o país da recessão antes do resto do mundo.
Estranhamos que o Diretor, considerado pela mídia especializada como opositor ferrenho da recente sequência de quedas da taxa Selic, não tenha citado especificamente os encargos da Dívida Pública, cujo montante é bastante relevante, nesse rol de causadores da alta da inflação. Ou o pagamento dos juros da dívida não são "gastos de difícil reversão"?
Outras variáveis a passarem despercebidas pelo Diretor foram o enorme volume de dinheiro que a autoridade monetária foi obrigada a injetar no sistema financeiro, por conta da maior crise econômica e financeira desde a grande depressão de 1929, além da redução de tributos promovida pelo Governo Federal, incentivando o consumo.
Pareceu-lhe mais cômodo acusar os servidores públicos ao invés de culpar o verdadeiro causador da crise: o sistema financeiro. Natural que um Diretor – que veio de/e voltará para o mercado – poupe seus colegas. Se há excesso de liquidez no mercado e falta de regulação, que o BC tome as providências cabíveis ao invés de culpar nossos salários pelo problema.
De tempos em tempos, aparecem economistas creditando ao Estado todos os problemas do Brasil e exaltando a eficiência, a retidão e as maravilhas da iniciativa privada. Na visão desses sábios, o país deve economizar o que puder com o Estado – seja com serviços prestados ou com os salários pagos.
O negócio é desmontar a estrutura estatal até que se atinja o objetivo supremo: o Estado mínimo. O passo seguinte é se aproveitar das deficiências estatais para ganhar muito dinheiro com operações "criativas" como as que pulularam, por muito tempo, até o estouro da crise.
E quem paga por um Estado fraco e inoperante? A sociedade, claro: os lucros são privados; os prejuízos … socializados.
A mesma matéria informa que o Diretor estaria de saída do BC. Ótima notícia. Desejamos-lhe uma boa sorte. Estamos certos de que não faltarão oportunidades lucrativas de trabalho para alguém que mostra estar alinhado com o sistema financeiro no BC e que detém informações valiosas.
Acontecimentos como esse fazem saltar aos olhos a necessidade premente de se discutir a presença de Diretores do mercado na diretoria do BC e o aumento da quarentena de quatro meses para um ano.