Governo estuda mandato fixo no BC

    Por Claudia Safatle | De Brasília

    Uma das primeiras providencias do novo governo Dilma Rousseff será decidir como tratar, legalmente, o descumprimento de todas as metas fiscais deste ano.

    A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) dá amparo para um superávit de pelo menos R$ 49,07 bilhões. Se ficar aquém desse valor – a expectativa é de que haja um déficit primário este ano, o que não ocorre desde 1997 – o governo terá que enviar novo projeto de lei ao Congresso, estabelecendo nova meta, ou estará cometendo crime de responsabilidade fiscal.

    Uma outra hipótese, menos cotada, é adiar despesas deste ano para janeiro de 2015. Para Dilma, o segundo mandato começa agora.

    Como a LDO fixa, para 2015, um superávit mínimo de 2% do PIB, terá, também, que refazer as contas e reduzir a meta para o próximo exercício para algo entre 0,5% do PIB e 1% do PIB.

    Há discussões em curso sobre como reconstruir pontes dinamitadas ao longo da campanha eleitoral e como resgatar a indústria do país da situação dramática em que se encontra.

    A principal ponte diz respeito à perda de credibilidade que a campanha de Dilma impôs ao Banco Central, ao equiparar uma eventual autonomia da autoridade monetária para cumprir a meta de inflação à subtração de comida da mesa dos pobres.

    Uma proposta já começou a ser considerada, embora ainda não contemple a concordância da presidente reeleita. A sugestão seria de ela enviar um projeto de lei ao Congresso Nacional, cujos parlamentares tomam posse em fevereiro, conferindo mandato à diretoria do BC.

    Apesar de ser a negação de tudo o que Dilma disse durante a campanha eleitoral, a proposta seria de o governo, durante o seu novo mandato, poder fazer a indicação de cinco diretores com mandatos coincidentes ao do presidente da República. Os outros quatro diretores do BC seriam escolhidos de forma alternada e não coincidente.

    Essa não é uma decisão simples e não será tomada de imediato. Terá que amadurecer muito antes de uma conclusão.

    Uma área que está terrivelmente danificada é a da indústria. Nesse aspecto, há muito o que fazer de agora em diante, dado que os mais de 20 programas de incentivo em vigor deram pouco ou nenhum resultado.

    A primeira providência mais sensata seria recolocar a política macroeconômica nos trilhos, com inflação na meta, superávit primário consistente e câmbio flutuante.

    Com ganhos de credibilidade, o governo poderia assistir a um aumento dos investimentos e a recuperação do crescimento. Isso, por si só, daria um novo conforto à produção industrial.

    Há uma discussão, também nessa área, que se divide entre manter a política de conteúdo nacional ou migrar para um modelo mais arejado, onde os incentivos às exportações não penalizem as importações mas, ao contrário, que haja a compreensão de que ambas – importações e exportações – são complementares e que é a expansão da corrente de comércio que produzirá o desenvolvimento.

    Essas são algumas das questões que estão sob avaliação no governo, mas de forma ainda muito esparsa. A rigor, não há um programa econômico sistematizado para o segundo mandato. O espaço para mudanças substantivas também não é amplo. As condições da economia, hoje, são muito frágeis. A atividade está paralisada e o desemprego já está contratado.

    A necessidade mais urgente do novo governo será reconquistar a confiança de empresários e consumidores, atualmente em nível semelhante ao que estava no auge da crise econômica de 2008/2009.

    Para isso, a presidente terá que buscar unir o país, rachado e marcado por uma campanha de péssima qualidade que pouco mostrou os graves problemas que Dilma herdará de Dilma.

    Terá que recompor, também, o PT e aos partidos da base aliada, fragmentados. Uma das ideias de petistas influentes é que ela se reúna com as lideranças do PT nos próximos dias.

    Há interlocutores próximos à presidente que sustentam que hoje, depois de sentir o calor da derrota da reeleição como uma possibilidade real, Dilma estaria mais consciente de que precisa mudar seu jeito irascível e ouvir mais. Vai ter que ouvir, inclusive, qual a verdadeira situação que o seu governo deixa nesse primeiro mandato. Dilma deixou o governo para se dedicar tempo integral à campanha,

    “Ela vai abrir a loja, nesta segunda feira, sem conferir o estoque”, comentou uma fonte qualificada que tem conversado com a presidente com muita frequência. A expressão acima era muita usada pelos comerciantes da rua 25 de Março, em São Paulo, na virada do ano, pois sabiam que nas vendas de fim de ano muito havia sido perdido ou roubado.

     

    Fonte: Valor Econômico

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