CONVERSANDO COM UM AMIGO

    Desculpa, mas precisava te dizer isto. Nestes longos 75 anos fiz muitas e muitas amizades, desde a minha infância. Entre elas tu estás, ou estavas incluído, caro amigo. Sempre estiveste, sabes disto.  Nossa amizade acompanhou o tempo com que a vida nos tem presenteado permanecermos longe fisicamente, porém sem jamais nos afastarmos neste sentimento que eu prezo por demais. Amigos já ganhei, amigos já perdi, amigos voltaram, outros simplesmente resolveram me ignorar de repente.  Motivos, que eu saiba nunca dei a eles, não para estes a quem ainda respeito e considero, embora não falem mais comigo, nem por este espaço virtual quando os reencontrei aqui. Alguns preferiram fazer de conta que passei a ser, digamos, um inconveniente “spam” na vida deles. Podem até falar sobre mim com outros amigos, mas a mim nada dizem. O silêncio foi o novo caminho preferido por eles. Eu sei que a vida não é feita só de flores, só de alegrias, afinal costumo ser bom aluno e tenho aprendido muito nesta longa estrada principalmente com meus erros, mais do que com exemplos de outros. O que não aceito é o desprezo gratuito, não explicado, não justificado, simplesmente imposto. Jamais aceitarei isto.  Surpreendi-me durante o período eleitoral passado e o anterior pela forma como algumas pessoas enviavam mensagens impregnadas de agressividade, denúncias sem provas, palavras de baixo calão, entre outras baboseiras lamentáveis. Aquilo não era fazer oposição a quem quer que fosse. O tiroteio vinha de ambos os lados.  Não havia apenas a intenção de torcer por este ou aquele candidato, mas a visível e deplorável decisão de ofender, agredir, e em certos casos até matar, se pudessem. Aquilo me deixou completamente atordoado e por mais que eu insistisse para que este ou aquele parasse de me enviar coisas daquele jaez de nada adiantava.  Houve até quem usasse o seu preconceito, a sua irracionalidade, para extravasar ódio, muito ódio, defendendo métodos da ditadura militar, de triste memória, como forma de se fazer justiça naqueles dias. Alguém que sempre se apresentou, junto com o nome, como Poeta, (como se este rótulo lhe valesse tal qual sobrenome) ficava a incentivar atitudes de uma violência inconcebível ainda mais vindo de quem deveria ser mais culto, educado e sensível. Este, como outros poucos, eu fui obrigado a retirar do meu catálogo e os avisei. Não deu mais para suportar. Alguns simplesmente não mais me escreveram. Meu Deus, como eles se diziam amigos se no momento da discordância democrática logo partiram para a ignorância rude, inculta com traços de fascista?  Quase todos aos quais me refiro acima e que mostraram o lado oculto de sua personalidade durante os períodos eleitorais, foram pessoas que se chegaram a mim lendo meus escritos, e se dizendo “amigos”. Pelo visto não se perdeu grande coisa na faxina que fui obrigado a fazer usando para isso a vassoura do bom senso.  De qualquer forma me doía fazer aquilo já que eu valorizo sempre cada amigo mais recente ou antigo. Como disse certo poeta: “Amizade não se compra, se reconhece”. Pois é. Alguém costumava me criticar em família pela facilidade com que sempre considerei quem de mim se aproxima com boas intenções como um novo amigo. E quem disse sabia o que falava. Entretanto eu sempre respondia que prefiro não prejulgar quem quer que seja. Jamais coloco alguém que me estende sua mão e/ou empenha sua palavra comigo em tom de amizade em qualquer rol de desconfiança sem nada de ruim me ter feito, isso não. Dou um crédito de confiança, sempre, porque entendo que todos devem merecê-lo. Assim me ensinou meu saudoso pai português.  Mas, voltando a ti, meu amigo, que eu me lembre apenas repassei outro dia para todos do meu catálogo certo texto que eu divulgara no ano de 2002 no qual opinei, usando do direito inalienável que todos devem ter no que chamam de “liberdade de expressão”, sobre certo acontecimento internacional envolvendo terrorismo ocorrido há alguns anos, mas não apenas isso. Eu questionava muita coisa que ficou sem resposta até hoje. E não fui apenas eu que fiz este tipo de análise. Eu deixei claro no encaminhamento que julgo haver muito mais a esclarecer daquele episódio. Ocorre que, ao comentares meu texto, tu discordaste de mim, também um direito teu que eu respeito. Porém não foi apenas uma discordância, não, fizeste-me uma crítica severa em caráter pessoal.  Fizeste-me acusações que não têm cabimento. Elogiaste por demais o povo americano e não admites que se diga mal nem mesmo de seus políticos, ou da política externa que eles praticam há décadas. Aí ficou realmente difícil eu tentar alguma concordância contigo. Com certeza o mundo não tem esta mesma opinião que defendes, ou pelo menos boa parte dos povos deste planeta. Mesmo assim eu não esperava que de repente para ti a tua opinião fosse muito mais importante do que a velha amizade de infância e juventude que um mês antes, em outro comentário, assim expressaste a mim: “O tempo passa e tudo segue indo e não há volta. Simões, eu já te falei que a tua casa é uma referência forte de minha juventude, jogando Volley lá com vocês…” Desculpa se abro este assunto aqui, mas o faço com a mesma tranqüilidade com que antes já pedi perdão, também publicamente, a uma grande amiga com quem eu fora injusto em certa atitude. Igualmente com a mesma convicção que usei ao me penitenciar ante minha primeira namorada, que conheces, um amor de juventude que não valorizei na época. Por quê? Porque eu sou assim, meu amigo.  Tu preferiste o silêncio, que a mim agride, eu prefiro a palavra que se revela leal, sincera, autêntica, não se esconde, pela qual sei pedir desculpa se ficou algum tipo de ressentimento. Dei um tempo necessário para voltares aos contatos, mas nada, calaste mesmo. Porém eu estou aqui, sempre de braços abertos, pois não costumo guardar rancor, muito menos de alguém como tu, um amigo de toda uma vida.

    Matéria anteriorMEU “VÔO DE PAPEL” EM SEGUNDA EDIÇÃO
    Matéria seguinteCARLOS TRIGUEIRO, SUCESSO AOS PEDAÇOS