INGLÊS MADE IN BRAZIL

           Pegos de surpresa, já que nem a esposa do Le Pen acreditava que o representante do que há de pior existe na política mundial  pudesse chegar ao segundo turno da eleição francesa, os  apresentadores dos telejornais brasileiros estão vivendo um dilema: afinal, qual a pronúncia correta do sobrenome do  candidato direitista francês Jean-Marie Le Pen? É Le Pén, Le Pã ou Le Pan?         O Artur Xexéo, o primeiro a denunciar publicamente sobre essa besta preocupação, publicou em sua coluna de "O Globo"  do dia 01/05/2002,  trecho de uma carta recebida do leitor Luiz Felipe, cujo teor  me parece conter "carradas de razão": Disse o leitor do Xexéo: Ao ler em sua coluna dúvida sobre a pronúncia correta do nome do candidato francês Le Pen, lembrei-me de uma coisa curiosa: O Brasil me parece ser um dos poucos países que se preocupam em pronunciar corretamente os nomes em outras línguas. Fiquei chocado quando soube que, lá na Espanha, Mariah Carey chamava-se Maria Carei… é, assim mesmo… e peça para um americano falar Fernando Henrique Cardoso e observe se os fonemas que ele usa mão são exclusivos do inglês, como se chamássemos Cole Poter de Cóle Potér ou algo do gênero. Achei muito cruel que precisemos pronunciar corretamente nomes em outras línguas, já que, para tal, necessitaríamos ter um tipo de conhecimento, no mínimo, fonético de todas elas!"         Ao comentário, Xexéo fez um adendo: "O comentário do Luiz Felipe encerra a discussão. Adoro ver os portugueses chamando o príncipe Charles de príncipe Carlos. É "lepen" e não se fala mais nisso.         Dois outros exemplos  demonstram o quanto podem ser inúteis e descabidas essas discussões: a primeira foi quando Sean Connery, surgiu no papel do agente James Bond, o 007. Foi uma briga de foice! Primeiro pronunciava-se "Cim Connery". Depois, "Ceã". Nova troca para "Xon".  Finalmente o nome do homem foi fixado em "Chã Connery.  Entretanto,  por ocasião de uma entrevista do Sean Connery em pessoa ao David Latterman no canal GNT, li nas legendas o próprio ator dizendo que só os escoceses de nascença conseguem a inflexão correta do seu pré-nome. Não resisti! Soltei uma sonora gargalhada!         A outra passagem foi quando o MBD resolveu lançar como  candidato à presidência república o General Euler Bentes Monteiro,  bem no auge da revolução de 64. O ato de "rebeldia" servia  apenas para marcar posição, já que, naqueles anos, muitos  meses antes do  término de cada mandato do general de plantão na presidência, um outro militar era avisado de que estava escalado para ocupar a posição. Mesmo assim, a atitude da oposição ganhou notoriedade com a tentativa da imprensa em legitimar uma eleição que era decidida por um colégio eleitoral transbordante de deputados e senadores  governistas, todos filiados a antiga ARENA, cujo arremedo é hoje o PFL.  Aí o que se ouviu sobre a correta pronúncia do nome do homem foi uma festa.  Começaram a chamar o general de "Auler", passaram  para "Oiler" e, só depois da "eleição" é que chegou-se a conclusão que o nome do candidato era Euler mesmo.         Possuo uma amiga (Myrian Sepúlveda), que estudou inglês, foi telefonista da Embratel, morou cinco anos nos EUA,  dois na Inglaterra e vive viajando,  que um dia me disse que havia voltado a estudar inglês com um professor particular aqui no Brasil. Ante ao meu espanto, brincou séria: " É que não consigo entender o inglês que se fala no Brasil! Para você ter uma idéia. possuo uma aluna na UERJ, com ótima noção  da língua americana, que chama o Kevin Costner de "Quivim Costner!.  Faço votos que  a mãe do ator nunca a ouça chamando-o assim! No mínimo, ela(a mãe) vai virar uma fera!"           Também já li em várias colunas especializadas em tv dos grandes jornais, reiteradas críticas ao Silvio Santos por evitar  no Show do Milhão a correta pronúncia da língua inglesa. Reclamam que ele fala sempre em "brasileiro". É claro que, como homem de múltiplos e milionários negócios no país e no exterior,  Silvio conhece inglês. É absolutamente imprescindível, tanto para se comunicar, como para ter a certeza do teor das conversas. Só que – sempre politicamente correto com os seus clientes –  o apresentador não mistura estações e  sabe que o seu telespectador – aquele que é comprador da Telesena – só conhece o John Wayne como João Vaine. Silvio Santos, não mede esforços para falar de igual para igual com o seu público.         Outro leitor do Xexéo, Marcos Souza, mesmo concordando ser impossível o domínio fonético de todas as línguas, acha que devemos tentar pronunciar corretamente os nomes de políticos e países. No entanto, em contrapartida, informou  que o  Embaixador Roberto Campos falava um inglês mais do que perfeito, mas com o sotaque mais brasileiro possível. Dizia que isto lhe dava a sensação de não estar submetido culturalmente a idioma alienígena.         Essa vida é mesmo engraçada, não? Roberto Campos precisou morrer, para que, finalmente, caísse em domínio público uma de suas raras atitudes de cunho nacionalista. 

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