O SENTIDO DA VIDA

    Ah, seeu possuísse odom, seeu tivesse opoder, seme fosse concedida avirtudeprópria dospuros, dosimaculados, ainculpabilidade dosinocentes, odireito deacordarpara osonho narenúncialegítima dopesadelo, autopianãodelirante dosonhopossível e alcançávelpelabuscaincessante daesperançaquenão desanima. Ah, seeu soubessesermuitomaisenergia doqueforça,muitomaisespírito doquematéria,semsersantonemdemônio. Ah, seeu pudesseirbuscarnosconfins da cosmogonia aorigem, aessência, ocomeço doprincípio dotudo e donada, arazão doser e donãoser, aresposta aoimponderável daexistência. Como disse Olavo Bilac: "Há numavidahumanacemmilvidas, / Cabem numcoraçãocemmilpecados."Eu usaria quantasvidaspreciso fosse, deixando àmorte odever de contabilizá-las noseurastro dedor, depesar, deruína,mas ressurgindosemprecom aforça daféque movecoraçõesque se pertencem. Devidaemvida seriaumser buscante de umacausamaiorque opróprioinfinito.  Carregaria comigo meus pecados, pois fugir deles me tornaria mentiroso e vil, e a santidade jamais caberia neste corpo que, de imortal, só carrega sua alma. Alma, princípio de vida, vida que gera o amor, amor que me estimula, me impulsiona, me acende o caminho, as trilhas todas, separa  as pedras e me faz seguir.  Ah, se otempo abrissesuasportas eme permitissemergulhar na infinitude doimensurávelespaço, arrastadoatéumpassado dereencontro devidas.Mesmoque nestabuscaeu tivessequeprocuraremcurvas labirínticas,ouabismosprofundos, nolimiar decéus einfernos,eunão desistiria. Venceriaplanos edimensões, investiriacontracentauros edragões, sobrepujariabruxas emagias quantas, saltariamuralhas efogueiras, mergulharia naságuasmais profundas rasgandooceanos, levandominhaprocura atodos oscaminhos edireçõesqueme conduzissematémesmoparaalém daeternidade. Esta seriapequenaparaesconder demim oobjeto domeuintento.Eunão desistiria. Pormaiorque fosse aminhaangústia,não parariaenquantonão encontrasse as raízes dobem e domal,onde obonito e ofeio se anulam noigualitarismo deleis cósmicasonde otudo se origina e onada sobrevive noeclipse danãoexistênciaque se faztãofortequanto oser,peladicotomia deconceitoscontráriosque afirmamtambém o não-ser, onãoexistir,que anossaignorânciajamais alcançará.   Tentariadesbaratar asteias dodestino, dofado,outraduzircausas eefeitos. Buscaria nassombras dopassado algumalógica,algumsentido,para amorteoupara avidaquecaminha nopresente tropeçandoemincertezas, carregandopesadelosque projetamumfuturo, tantasvezes, inalcançável. Carregaria aminhafé,masnão titubeariaem pô-la àprova sepreciso fosseparaalcançar averdademaior, aquelaqueenfimme oferecesserespostaspara tantas dasminhasdúvidasquevezououtrame mergulham nocepticismo,quaseme afogando noantilógico decontradições enlouquecedoras.  Não buscochegar aosupremoideal dafelicidade,embora creiaque, seele existe, deveriaestar aoalcance de todas asalmas, detodos osseres,semprivilégiosque diferenciaminteligências esentimentos,que exigemdiscernimentos, osquais, aprópriaverdadeque os criou,também os tornou limitados. A perfeição foi proibida ou se tornou seletiva? Seaqueleidealnão existe, averdade,porconseqüência,também podeserdesmentida,porinexistente.Assim prefirocrer, doque considerá-lainjusta. Equandome aproximei dessa conclusão, em tentativas frustradas de entender o sentido da vida, e mesmo da morte,maisme assustei denão chegar anada,maisme apavorei dever esvair-se omeusonho, deperceber enfraquecer-se aminhaesperança, perder-se aminhabusca.   Etudoqueme ensinaram? Etantoque pesquisei,que investiguei? Etudoemque acreditei, reafirmei e preguei? Somostodosinocentesportermos sido enganados? Seremostodospurosjáque amácula e avirtude estarãoausentes dequalquerconceitoético, naconcepção deque averdade seja umamentira? Noquenos transformaremosentão? Não, não é possível, talvezeu tenha errado ocaminho, é, deveserisso. Devo ter enveredado por tortuosas, enganadoras e indecifráveis veredas, mergulhado em enigmáticos e ambíguos mistérios que estejam no limiar do eterno e infinito conhecimento superior.  Devo mesmo ter errado o caminho.     A verdadeirasendatalvez se encontremuitoparaalém dasminhaslimitaçõesfísicas e espirituais, não obstante a minha fé, o meu aprendizado, e os tantos ensaios e incursões no mundo incorpóreo, sobrenatural. É, fracassei, devoconfessar. Paro, é hora de reflexão e não de investigação ou de busca. Detenho-me então num lindo texto que recebi há pouco tempo dos bons amigos de São Vicente, em S. Paulo, o Ivan Matvichuc e sua esposa Fátima, sobre a vida. Releio-o. Chamam-me a atenção duas citações plantadas no referido texto: “A nossa vida é uma promessa a cumprir, um fruto a amadurecer, uma obra a executar” , atribuído a A. Bouçois Mace;  “Das ruínas do corpo e da alma pode vicejar uma semente portadora de um futuro esperançoso para a Terra e para a humanidade”, de Frei Leonardo Boff. Recolho-me à minha insignificância, fecho-me no silêncio pequeno que se curva ante uma realidade indecifrável, guardo as minhas dores e desconfianças porque não mais quero aceitar as fórmulas feitas, as verdades absolutas, os dogmas autoritários. Por outro lado, sou obrigado a prostrar-me diante de mim mesmo abatido pela insídia de uma busca para a qual não estou preparado.  Algum dia, provavelmente, alcançarei o que procuro. Espero, porém, que não seja  tarde demais, que a solidão não seja minha única e fiel companheira, que viver não seja um ato a cumprir, mas sem a presença do amor que por longos anos me deu sentido à vida.  

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