PODEM ME VAIAR MAIS UMA VEZ

    Os que me acompanham desde quando voltei a escrever publicamente em janeiro/2001 através da internet certamente se lembram da crônica PODEM ME VAIAR. Ela foi uma das duas primeiras que escrevi e divulguei. Bom para mim que a repercussão foi ótima.  Nela, com meu modesto, mas apurado senso de humor, fiz uma varredura em diversas situações do relacionamento humano na realidade que estávamos vivendo. Também me auto analiso e me confesso a certa altura com essas palavras: “Sou antigo, mas menos que a corrupção e a hipocrisia reinantes desde que o Sr. Cabral fincou seus lusitanos pés nas lindas praias onde hoje se chama Porto Seguro (e hoje haja praia para tantos pés no verão por lá). Mas, o fato é que sou velho, conservado, mas não iludido.” E assim vou tirando um sarro sobre tudo e sobre mim mesmo, só para provar a alguns que hoje ainda não entendem que não me vejo na obrigação de escrever para agradar a quem quer que seja. A autenticidade passa longe da bajulação. Firmo minha opinião sem medo de ser feliz, mas não me considero intransigente. Naquele texto eu já me preocupava em analisar e comparar a educação, tanto no lar como fora dele, dos meus tempos de criança e dos de então, ano 2001. Mais adiante eu dizia: “Sabem que eu, mesmo fazendo uma ou outra travessura de criança, jamais respondi mal, ou ofendi, ou levantei a mão para meus pais ou avós? Nunca falei palavrão na presença de garotas, é verdade. Às meninas eu dava atenção e carinho na esperança de a eventualidade me oferecer algum novo namorico.” — Ora vejam só a diferença, não? Vamos saltar para os dias de hoje? Estava eu preocupado com filhos que não respeitavam seus pais, porém que se limitavam a responder mal, a dizer palavrões, ou outras coisas deste gênero. Mesmo tendo sido escrito há oito anos apenas o texto já não se aplica com fidelidade à realidade atual, seja em sociedade ou em certos ambientes familiares. Nunca eu poderia supor que a deterioração dos relacionamentos em família “evoluíssem” tanto a ponto de alcançar esses níveis de degradação numa atenuação gradual que acabasse explodindo em pais que matam filhos, filhos que matam pais ou que programam a morte deles com parceiros como namorados, tudo com requintes tal de crueldade que hoje me fazem descrer da nossa raça humana. O que mais me assusta é que as tais “exceções”, como costumam defender aqueles que preferem não ver e não avaliar o grau correto da intensidade deles numa sociedade enferma, a cada mês se repetem num círculo já não só vicioso como corrompido que ameaçam o futuro da família. Os mais crentes dirão que é falta de Deus. Prefiro afirmar ser falta de educação, em casa especialmente, criando-se jovens que também ameaçam professores, quando não os matam. Mais adiante no texto anterior eu escrevi: “No tempo do qual eu vim a grande maioria das famílias tinha a educação como prioridade, não só para as crianças, não. Faziam questão de que nós, os filhos e netos, tratássemos nossos pais, avós, tios, e mesmo vizinhos e visitas por “senhor”, “senhora”. Nos obrigavam a dizer sempre “por favor” e a tomar a bênção dos mais velhos.” —  Pois vejam como hoje em dia este comportamento caiu em “ridículo” para a maioria dos jovens. Ou não? Hoje quando vejo ou ouço alguém me agradecer educamente por algo que fiz para o ajudar geralmente se trata de pessoa com idade mais avançada, e mesmo assim há os que, da minha geração, andam a se contaminar e a ter comportamentos nada elogiáveis, especialmente naquelas filas destinadas a gestantes e idosos. Certo dia, no supermercado em Ipanema, quase perguntei a um senhor se queria fazer na fila um campeonato de idade com a exibição de identidades. Já contei este episódio. O parágrafo que lerão, ou irão reler, abaixo, carrega uma boa dose de ironia e gozação, pontos fortes daquela crônica:  “Aquela foi a única surra que tomei. Meus pais eram visceralmente contra a violência e meu avô também, naquela noite, porém, contam que eu passei dos limites. Meu avô até chorou depois, arrependido. Pensam que eu fugi de casa, fiz cara feia para meu avô, revidei com palavras malcriadas de desforra ou ímpetos de represália? Qual nada, este covarde ainda prometeu não fazer de novo. Nem ao menos repetir um ano na Escola, ficar para segunda época (isto feria e muito o orgulho de meus pais), quanta incompetência!” Mas hoje em dia tem sempre algum(a) psicólogo(a) de plantão a condenar métodos que, para eles, “não mais se justificam”. É verdade, talvez eles estejam certo, e por isso fujo deles, sabiam? Talvez por falta de algumas reprimendas, de ouvir alguns sonoros “não”, alguns tapinhas no traseiro, enfim, pela ausência quase total da autoridade materna e paterna, é que andam a criar verdadeiros monstros, ou como considerar filhos que torturam e/ou matam os próprios pais e vice versa?  Vamos lá, podem me vaiar, sim, eu aceito, mas advirto que se cuidem, atenção ao que seus lindos rebentos andam a fazer na rua, suas companhias, seus hábitos, seus vícios, lugares que freqüentam, etc. Cuidado.  Permitam-me agora encerrar com os mesmos parágrafos que terminei a crônica divulgada em janeiro / 2001, abordando praticamente o mesmo tema e temperada com um certo humor aliado à ironia, associação muito necessária: “É isso aí gente, apesar de tudo que digo aqui continuo escravo dos velhos hábitos que meus pais e meus professores plantaram em minha educação, moldando este meu caráter e esta personalidade que, por alguns critérios atuais, revelam minha incurável parvoeira.”  “Realmente não tenho mais jeito, custei muito a acordar e agora tenho que carregar este fardo de tratar por senhor ou senhora pessoas que, mesmo não sendo idosas, minha psique está condicionada a lhes dispensar tanto respeito.”  “E é “por favor” aqui,  “com licença” acolá, “sua bênção” mais adiante, que me percebo um total fracassado dos  tempos  modernos. Não tive forças para reagir,  não sirvo de exemplo,  assumo-me como um pústula da educação vigente, um espantalho para os modos atuais, um triste e perigoso cancro em certos relacionamentos familiares que nos rodeiam.”  “Claro que não evidenciam uma regra geral, mas são tantas as exceções a esta, que quase definem um padrão a modelar novas regras. E eu não aprendi nada de novo com elas. Por isso eu mereço. Vamos lá, podem me vaiar.” 

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