Antonio Perez
Antes do encontro do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central na semana passada, o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, apostava que o aperto monetário terminaria com a taxa básica em 9,50%. Após o Copom repetir o comunicado de reuniões anteriores – um sinal de nova alta dos juros -, Vale passou a trabalhar com a hipótese de que a Selic vá para 10%. Mas isso não vai afastar o IPCA do teto da meta de inflação (6,5%) em 2014. Tampouco reforçará a credibilidade do BC.
“A inflação tem fugido do centro da meta [4,5%] e o BC sinaliza certo comodismo. A impressão é que, desde que a inflação fique abaixo de 6,5%, tudo vale”, diz o economista, que não vê alta de juros em 2014. “A presidente Dilma [Rousseff] não vai liberar.”
Valor: Antes do Copom, o sr. disse que o ciclo de aperto monetário terminaria com a Selic nos atuais 9,5%. Mudou de opinião?
Sérgio Vale: Pelo comunicado do Copom, a percepção é que tem um novo aumento da Selic. É preciso esperar a ata [do Copom] para consolidar a percepção se será de 0,25 ou 0,50 [ponto percentual]. Ainda não há garantia de que a Selic vai para 10%. Ele pode manter discurso semelhante ao da ata anterior, mas sinalizar mudança de ritmo [do aperto monetário], dando ênfase ao câmbio mais tranquilo e à inflação cedendo. Apesar disso, acho que há duas razões para justificar a Selic em 10%. Primeiro porque é um nível simbólico. O BC foi atacado durante muito tempo e a questão de credibilidade está, de fato, comprometida. Na cabeça dele, por a taxa em dois dígitos seria uma sinalização mais crível de que está realmente preocupado com a inflação, o que não é fato, já que o IPCA ainda está próximo de 6%. Outra razão é o fato de o ano que vem ser eleitoral. A Dilma [Rousseff, presidente da República] não vai liberar um aumento dos juros. O BC tem que fazer isso agora.
Valor: O BC surpreendeu em maio ao acelerar o ritmo do aperto. Analistas disseram que era um passo para recuperação da credibilidade. Não foi suficiente? Subir a Selic para 10% não será suficiente?
Vale: Para o Copom recuperar a credibilidade, o mercado precisa acredita que ele quer trazer a inflação para 4,5%. O BC teria que ser ousado, por o pé no acelerador, o que significa levar a Selic para 13%. Isso não vai acontecer. O que erodiu a confiança no BC foram os resultados. A inflação tem fugido sistematicamente do centro da meta. E o BC sinaliza certo comodismo. A impressão é que desde que a inflação fique abaixo de 6,5%, tudo vale. A sensação é de que de uma hora para outra o BC pode mudar de rumo, de que tudo depende do que a presidente quer.
Valor: Houve arrefecimento recente da inflação. A tendência é de um IPCA mais comportado?
Vale: A inflação pode ser de 5,8% este ano, já que o câmbio voltou, o que ajuda bastante. Mas no ano que vem já projetamos 6,5%, com alta maior dos preços administrados, fim das desonerações e elevação do transporte. Tudo que contribuiu para conter o IPCA este ano vai deixar de existir em 2014.
Valor: Pode haver novo choque no câmbio?
Vale: Pode acontecer. A transição da política monetária americana foi paralisada por conta da questão fiscal. No começo do ano que vem, a discussão da redução do “quantitative easing” [QE, afrouxamento monetário] nos Estados Unidos volta à tona. Os estímulos vão ser reduzidos ao longo do ano que vem e a taxa de juros americana deve subir em 2015. Isso vai trazer pressão para o câmbio. E há também o “risco Dilma”, como que será em um provável segundo mandato… A tendência é o real se depreciar. Vemos o câmbio perto de R$ 2,20 até o fim do ano. Para 2014, R$ 2,30 e R$ 2,40 é muito provável. A percepção de que o dólar não retornará a níveis anteriores vai se consolidando na cabeça do empresário. Ele vai incorporar isso como custo e repassar para os preços.
Fonte: Valor Econômico