Economia agora será decisiva

    Discussões e propostas claras sobre temas complexos, como juros, inflação, crescimento, impostos e Previdência, podem fazer a diferença na disputa pelos votos no segundo turno

    Os especialistas não têm dúvidas: a economia será um dos principais temas a serem abordados por Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB) na disputa de segundo turno. Inflação alta, baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), contas públicas em frangalhos, emprego e renda entrarão com tudo na agenda dos candidatos, depois de serem tratados de forma superficial na primeira etapa de votação. “São temas relevantes. Os dois concorrentes terão que convencer o eleitorado sobre quem apresenta as melhores condições para retomar o crescimento e ampliar o processo de redistribuição de renda”, diz Carlos Melo, cientista político e professor do Insper.

     

    Para ele, ao levar a decisão para o segundo turno, os eleitores mostraram que não estão contentes com a atual situação do Brasil. “Não à toa, estamos vendo a eleição mais disputada desde aquela de1989, entre Collor de Mello e Lula. Pelos números que vimos, tudo pode acontecer”, ressalta. No entender dele, os brasileiros cobrarão propostas concretas para melhorar o país e não se contentarão só com ataques ao adversário. “A economia não está bem e as perspectivas não são as melhores.”

     

    Desde que Dilma tomou posse, em 2011, a inflação se mantém próxima do teto da meta, de 6,5%. Isso reduziu o poder de compra das famílias, o que derrubou o PIB, a ponto de o país entrar em recessão neste ano. Na melhor das hipóteses, o Brasil crescerá apenas 0,5% em 2014. Com isso, os analistas já falam em aumento do desemprego em 2015, derrubando o último trunfo da petista na economia. “A missão do próximo presidente será difícil”, reconhece Melo.

     

    Incerteza

    A lista de desafios é enorme. Os preços da gasolina estão represados como forma de o governo segurar a inflação. No setor elétrico, a promessa da presidente Dilma de redução na conta de luz se mostrou um fiasco. As passagens de ônibus ficarão mais caras logo no início do próximo ano. Na avaliação dos especialistas, tudo isso desperta o interesse do eleitorado, ainda que a economia não seja um dos temas mais palatáveis.

     

    Mesmo assuntos áridos, tratados de modo equivocada no primeiro turno, como a independência do Banco CENTRAL, estarão presentes no debate. O tema foi levantado por Marina Silva, que acabou fora da disputa, mas provocou polêmica diante das propagandas de Dilma associando a autonomia do BC à fome. Isso abalou a credibilidade da autoridade monetária, que tem como missão principal preservar o poder de compra da moeda.

     

    Professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), o economista Ernesto Lozardo chama a atenção para a necessidade de o próximo presidente retomar a confiança do empresariado, para que o país volte a crescer de forma consistente. A taxa de investimento do país está hoje em 16,5% % do PIB, bem longe dos 25% prometidos por Dilma no início do mandato. “O debate deverá ser em torno de ações concretas. Quem apresentar, sem viés ideológico, um projeto de longo prazo para o país voltar a crescer, sem que a estabilidade do emprego e da renda seja ameaçada, pode vencer”, avalia.

     

    Pouco tempo

    Os especialistas temem que temas polêmicos, como o fim do fator previdenciário, ganhem conotações populistas na campanha, pondo em risco a saúde da Previdência Social, cujo rombo não para de crescer – deve fechar este ano em R$ 50 bilhões. Eles chamam ainda a atenção para o temor dos candidatos de abordarem a necessidade de reformas que deem mais competitividade ao país e aumentem a produtividade da economia.

     

    Ex-diretor do BC, Carlos Thadeu de Freitas Gomes considera fundamental que Dilma e Aécio tratem do futuro da inflação e dos juros. “Há pouco tempo para discutir temas mais complexos. O eleitor entende o que mexe no bolso dele. Ela sabe que, se a inflação e os juros estão altos, o poder de compra fica limitado.” A seu ver, Dilma tem dois fatores de simples compreensão a seu favor: o emprego e a renda. “Aécio terá que mostrar, de forma clara, os riscos que o país está correndo, já que será difícil debater uma proposta de ajuste fiscal ou de reforma tributária. A oposição deverá centrar foco na inflação e nos juros”, acredita.

     

    Agenda cheia

    Temas áridos, mas fundamentais para o país, dominarão o debate nas próximas três semanas

     

    Inflação

    O custo de vida fez estrago no orçamento das famílias nos últimos quatro anos. A média anual do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou sempre próxima do teto da meta, de 6,5%.

     

    Crescimento

    A média anual de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) nos últimos quatro anos foi de 1,5%, o pior resultado em mais de duas décadas. Será um enorme desafio tirar o país do atoleiro em que se encontra.

     

    Confiança

    Desde o estouro da crise mundial, em 2008, a confiança de empresários e consumidores não estava tão baixa. Há uma insegurança enorme em relação aos rumos da política econômica.

     

    Energia

    O governo interveio no setor elétrico e desestruturou o caixa das empresas. Em 2012, prometeu redução média de 20% nas contas de luz, mas, hoje, as tarifas já estão mais caras. A fatura, que custou R$ 61 bilhões, está sendo dividida entre o Tesouro Nacional e os consumidores.

     

    Contas públicas

    O Tesouro Nacional se especializou em maquiar as contas do governo. O superavit primário caiu de forma espantosa, apesar da montanha de receitas extraordinárias. O país corre o risco de perder o grau de investimento, chancela de porto seguro para o capital.

     

    Investimentos

    Os empresários não confiam na atual política econômica. Temem que, com o baixo crescimento da economia, fiquem com os estoques encalhados. As incertezas em relação ao setor elétrico também travam a construção e a ampliação de fábricas.

     

    Lei trabalhista

    O tema entrou levemente no debate de primeiro turno, mas houve mais confusão do que esclarecimentos. Os direitos de trabalhadores devem ser preservados, mas é importante dar flexibilidade para contratar a

    mão de obra.

     

    Previdência

    O fim do fator previdenciário entrou na agenda dos presidenciáveis. Caso ele caia, será preciso buscar uma fonte de receita para reforçar o caixa da Previdência Social, que já está cambaleando, com rombo anual próximo de R$ 50 bilhões.

     

    Independência do Banco CENTRAL

    A presidente Dilma é contra fixar mandatos para os diretores do BC, cuja principal missão é manter a inflação nas metas. Aécio Neves é a favor de autonomia à autoridade monetária, mas tampouco fala em mandatos.

     

    Fonte: Correio Braziliense

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