Ontem foi um dia de dramáticos apelos da área econômica do governo para que a Câmara adiasse a votação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 443, que equipara o teto salarial de advogados públicos, procuradores, delegados e policiais a 90,25% da remuneração dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), em uma inédita e inadequada constitucionalização de reajuste de salários. E, também, para que o Senado aprove ainda este ano a revisão das desonerações da folha de salários das empresas, além das reformas do ICMS e do PIS/Cofins que dependem do Congresso.
“A situação econômica é séria. A situação fiscal é séria”, alertou o ministro da Fazenda, Joaquim Levy. “Ninguém quer ruptura em nenhum aspecto”, completou, após reunião com o vice-presidente, Michel Temer.
Alheios aos riscos de agravamento da crise econômica, o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), recusou a aprovação da redução das desoneração – que reduz em cerca de R$ 25 bilhões as receitas da União – para este ano; e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), manteve a votação da PEC.
Nelson Barbosa, ministro do Planejamento, reforçou a defesa do ajuste fiscal: “A PEC 443 é incompatível com a situação econômica do país. Somos contra”, disse ao Valor. Ele considerou uma distorção tratar de política de reajuste de salários para um segmento do funcionalismo na Constituição, condenou a vinculação de salários do Executivo aos do STF e ressaltou que as questões salariais da União, responsabilidade de sua pasta, estão sendo negociadas.
Cálculos do Planejamento indicam que apenas a PEC 443 produz um gasto adicional de R$ 2,45 bilhões por ano. Considerando as outras PECs em tramitação que tratam de salários do funcionalismo, o impacto sobe para R$ 9,85 bilhões por ano.
Os aumentos propostos na PEC 443 variam de 35% a 66%. “Não é adequado propor reajustes dessa magnitude no momento em que várias empresas e trabalhadores enfrentam dificuldade, especialmente no setor privado, com redução do salário real e queda na geração de empregos”, disse Barbosa, lembrando que esses reajustes privilegiam as carreiras que já recebem as maiores remunerações do Executivo.
“Somos contra a aprovação das PECs devido ao seu alto impacto fiscal e administrativo sobre o Executivo, bem como aos seus efeitos de encadeamento sobre outras carreiras e governos estaduais e municipais”, reiterou Barbosa.
Levy disse que o Brasil “precisa de reformas rápido, sem populismos fáceis” e, em defesa da presidente Dilma Rousseff, assinalou que “o governo tomou a responsabilidade e assumiu o custo de popularidade para fazer o necessário para o país voltar a crescer. A presidente assume esse risco sem temor”.
Não é o ajuste fiscal em curso este ano o responsável pela recessão, que começou em 2014, salientou o ministro da Fazenda. “O ajuste fiscal é uma consequência e é ferramenta indispensável para voltarmos a crescer”, disse. Sobre a demanda política de uma agenda pós-ajuste, que trate do crescimento, ele respondeu: “Não adianta falar em agenda pós-ajuste se o ajuste não estiver completo”.
Para ele as reformas do ICMS e do PIS/Cofins são “a mãe de todas as reformas estruturais” que ajudarão o país a reagir à mudança de cenário com o fim do “boom” das commodities. “Poucas pessoas entendem que um dos fatores que mais nos puxam para trás é a dificuldade para o pagamentos de impostos, em particular os indiretos”, observou. Apesar da complexidade dessas reforma, que requerem um alinhamento de interesses, “acho que vale o esforço, a paciência e a conversa necessária para aplicá-las”, afirmou.
O secretário do Tesouro Nacional, Marcelo Saintive, alinhou-se às preocupações com a possível aprovação de projetos que elevam as despesas federais, a chamada “pauta bomba”, em reunião com deputados da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara. (Colaboraram Thiago Resende e Andrea Jubé)