Edição 0 - 20/11/2007

Continuam as manifestações sobre a demissão de quatro economistas do IPEA

 


As mãos pelos pés

Confusão no Ipea é reflexo da dubiedade de Lula em relação ao BC e à política econômica

Por Antônio Machado – cidadebiz@correioweb.com.br

A cada mudança de comando nos órgãos públicos sempre há pessoas entrando e saindo. A demissão de quatro economistas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Ipea, que o presidente Lula tirou do Ministério do Planejamento onde sempre esteve desde sua gênese nos governos militares para atender o ministro Roberto Mangabeira Unger, chamado para "pensar o futuro", no entanto, causou espécie.

A defenestração de economistas desalinhados com a visão de mundo do novo presidente do Ipea, Marcio Pochmann, tem sido apresentada como expurgo. Embora haja todos os elementos para sê-lo, dada as alegações burocráticas apresentadas por Pochmann – aposentadoria de uns e fim do convênio daqueles cedidos pelo BNDES -, tal caso de intolerância explícita, desconhecida até nos períodos negros do autoritarismo, é resultado de outra manifestação de dubiedade do presidente Lula em relação à política econômica.

Os economistas agora afastados, assim como os diretores do Ipea da antiga administração, eram críticos do expansionismo fiscal, é certo, mas respondiam às orientações do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, e do ex-ministro Antonio Palocci – ambos petistas de carteirinha e leais a Lula. Ou é má-fé ou ignorância supor que no governo Lula os ministros da Fazenda desfrutem a autonomia que lhes era delegada pelos seus antecessores. Tudo passa por ele, e não só por hierarquia ou formalismo. O que ele não quer não passa, venha do BC ou do atual ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Alega-se que um dos afastados, o economista Fábio Giambiagi, do BNDES, já estava na linha de tiro por causa de suas propostas para reformar a Previdência. Pode ser. Mas a verdade é que em 2006 um grupo de economistas recebeu a incumbência do presidente por meio do então ministro Palocci, mantida por Mantega, de estudar meios de diminuir o custo da Previdência, visando liberar receita fiscal para reforçar a dotação dos investimentos em infra-estrutura. Lula desistiu depois de eleito, optando em criar um fórum de discussão.

Pochmann e os economistas que ele recrutou criticam a política de juros do BC e defendem ampliar os gastos públicos e contratação de funcionários. Os que eles demitiram propunham o contrário, e essa era a política oficial. Ela mudou? Se a decisão é de Lula, o que Pochmann e Mangabeira propõem não tem a menor importância. Importa somente a decisão de Lula. Ela condiciona mudanças ou não no BC.

Resposta da Fazenda – Secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, se propõe ao bom debate ao contestar a coluna do último dia 13, segundo a qual estudo de sua autoria "busca inovar os conceitos da contabilidade nacional a pretexto de justificar a continuidade da CPMF". Qual o senso da crítica?

No trabalho, o secretário excluiu as transferências de renda às famílias da receita líquida federal – um "desatino contábil" foi a nossa crítica. Como toda a receita de impostos volta à sociedade, no limite a carga tributária seria zero, não de 34,2% do PIB em 2006. Barbosa afirma que usou o conceito de renda disponível com base no manual de contas nacionais da ONU, também empregado pelo IBGE. A coluna não contesta tal correção contábil.

Critica é a sua divulgação no contexto da votação da prorrogação da CPMF, com a separação das despesas com transferência de renda, que foram pelos seus dados de 6,4% do PIB em 2002 para 8,4% (mais 31%), das demais despesas primárias, que ficaram constantes (9,2% do PIB). Fica difícil não supor a intenção de justificar o aumento de carga tributária. "O aumento da receita líquida da União não reduziu a renda disponível do setor privado da economia", diz ele.

Gasto não produtivo – Barbosa afirma que jamais ligou as conclusões de seu estudo com a discussão da CPMF. Fica registrado. Mas, como comentamos aqui, dia 14, servindo-se de análise do ex-ministro Antonio Delfim Netto, a transferência de recursos do setor mais eficiente para o com maior propensão para o gasto não produtivo reduz, por definição, o ritmo de crescimento da economia. O que emerge dessa situação, segundo Delfim, é uma "contradição insanável": menos serviços públicos, e são "justamente os demandados em quantidade e qualidade", e menor capacidade produtiva para criar, na velocidade adequada, os bens necessários para satisfazê-los. Assim como novos empregos.

A questão fiscal é ideológica e técnica. Há quem defenda o Estado mínimo e faz da carga tributária elevada um cavalo de batalha. Há os que priorizam a aplicação da receita fiscal em investimentos e apoio à expansão privada, reduzindo o assistencialismo a uma rede de proteção aos excluídos do progresso. Essa é a posição de gente como Delfim e em geral dos "desenvolvimentistas" que fazem contas. E há a opção preferencial pelo "pobrismo", isto é, política social sem porta de saída, dadas pela educação e reciclagem profissional.

O estudo do secretário Barbosa trata dessas opções, que ele chama de "visões alternativas sobre o ajuste fiscal de longo prazo". O governo optou pelo ajuste gradual, diz. "Agora, o grande desafio é controlar o crescimento do gasto corrente." O que fazer?

Segundo Barbosa, limitar o crescimento real da folha salarial da União e criar regra para os reajustes do salário mínimo, ambas as medidas já propostas ao Congresso, e mais as sugestões do Fórum da Previdência. Curioso é que a ex-direção do Ipea defendia medidas assim. A atual repele. Qual desses "governos" responde a Lula?

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