NÃO É BEM ASSIM,
PRESIDENTE TOMBINI …
Queremos um modelo de BCB que,
a exemplo de diversos outros
destacados bancos centrais mundo afora,
apresente extensa e intensa presença
em todo o território nacional,
respeitando e incorporando em sua ação
a imensa diversidade de vocações econômico-financeiras,
identidades culturais e realidades sociais do Brasil.
Num momento em que os servidores do Banco Central do Brasil estamos todos mobilizados com os últimos acontecimentos relativos à Campanha Salarial, a entrevista do presidente do Banco Central do Brasil (BCB), Alexandre Tombini, publicada na edição número 36 da revista Por Sinal, nos dá a oportunidade de abordar o tema da valorização da nossa carreira pelo viés da valorização do nosso trabalho, especialmente daqueles localizados em setores regionalizados.
Ela aborda en passant o tema o tema do esvaziamento das representações regionais do BCB, estabelecendo, portanto, de algum modo, relação com os três eixos de trabalho propostos pelo GT Revitalização das Regionais do Grupo QVT Sinal-RJ, a saber: (1) EVIDÊNCIAS DO PROCESSO DE DESMONTE DAS REGIONAIS, (2) MAPEAMENTO DO MODELO ATUAL DE REGIONALIZAÇÃO, e (3) IDENTIFICAÇÃO DE POSSIBILIDADES DE REVITALIZAÇÃO DAS REGIONAIS.
Assim sendo, agradecemos ao Presidente Tombini a oportunidade de, a partir de algumas de suas afirmações, podermos assumir a responsabilidade de prestar alguns esclarecimentos à maior autoridade de nossa instituição.
1 – Não é bem assim, Presidente Tombini…
Não é, a nosso ver, correta, a afirmação “… não estamos adotando qualquer política de centralização de atividades em Brasília”, diante das inúmeras decisões neste sentido adotadas pela Administração Central do BCB nos últimos anos. Se não se trata de uma política deliberada, é imprescindível a criação de um espaço voltado para o debate, com transparência, do tema, pois um assunto dessa relevância não deve ser deixado à mercê das marés.
Exemplos de “centralização de atividades” não faltam, mas não convém aqui elencá-los, pois correríamos o risco de reduzir a discussão aos critérios administrativos (ou a falta deles) que conduziram a tais decisões. Ademais, correríamos o risco ainda maior de sermos tão somente ociosos, uma vez que qualquer consulta, formal ou informal, que se faça hoje aos servidores do Banco irá indicar a quase absoluta percepção dos servidores do Banco a respeito da existência, sim, de processo, em curso acelerado, de centralização de atividades (de servidores, de funções comissionadas, de exercício concreto de poder, enfim) em Brasília.
Ao invés disso, melhor convém aproveitarmos o espaço para trazer uma dimensão que julgamos mais substantiva sobre o assunto, que pode ser resumida na seguinte pergunta: que tipo de presença o Banco Central do Brasil quer ter no território nacional? Ressaltamos o verbo “querer”, aqui utilizado como expressão de uma vontade política a ser estabelecida a partir de um debate aberto, que contemple a participação ativa do maior conjunto possível (em quantidade e qualidade) de sujeitos sociais, pautado pela busca de caminhos que melhor atendam aos anseios da sociedade brasileira naquilo que se refere aos serviços prestados pela instituição.
A pergunta proposta comporta uma série de outras, sobre as quais a instituição precisa refletir com urgência. É a partir desta reflexão que o futuro das representações regionais, e da instituição como um todo, deverá ser traçado. Não podemos deixar que a questão seja reduzida à dimensão meramente administrativa (ainda que esta seja também importante no sentido de se obter os melhores resultados possíveis com os recursos disponíveis).
Portanto, quanto à questão da “centralização das atividades”, ressaltamos a necessidade de se reposicionar o tema, situando-o em uma perspectiva que lance luz sobre a dimensão política que lhe é inerente: a forma da presença do Banco Central do Brasil no território nacional.
2 – Não é bem assim, Presidente Tombini…
Se é verdade que “… não há qualquer diretriz ou determinação para que as regionais sejam esvaziadas”, é indispensável que os responsáveis pela Administração Central do BCB definam diretrizes ou determinações quanto ao assunto, pois a instituição está tomando um rumo à sua revelia.
O que se vê, na prática, é a aplicação de uma política de deixar as regionais morrer à míngua, como quando não se tem mais nenhuma esperança em relação à possibilidade de cura e se abandona o doente à sua própria sorte.
O desmonte das regionais tem sido, a nosso ver, um lema da Administração Central do Banco, desde a reestruturação administrativa ocorrida em 1999.
Os resultados concretos da adoção desse lema têm sido, entre outros:
A) Crescente des-qualificação do trabalho realizado nas regionais (em decorrência, principalmente, da crescente transferência, para Brasília, do poder decisório, para dizer o mínimo, sobre os mais diversos – até mesmo comezinhos – atos administrativos), em radical des-consideração do preceito Pensar globalmente, agir localmente (uma quase unanimidade contemporânea no que diz respeito às mais adequadas formas de gestão do trabalho adotadas por organizações que se pretendam de vanguarda), esclarecido, obrigatoriamente, que tal preceito, muito ao contrário dos que vêm nele o elogio da ideia “Sede concebe, Regional executa” (entendimento esse amplamente dominante, na atualidade, em nossa instituição), diz respeito, essencialmente, à proposição “Todos concebemos, todos executamos, global-localmente”, independentemente de inserção funcional na Sede ou em Regionais.
B) Em decorrência direta do item 1, acima, crescente des-qualificação do servidor lotado em regional, que, ao ter crescentemente apequenada a relevância de seu trabalho, tem também crescentemente apequenado, para a Comunidade BCB como um todo e, muito para além disso, para si próprio, o reconhecimento em relação a seu papel social-individual na organização. Expressiva demonstração de tal des-qualificação é a frase, proferida por colega encarregado de “recepcionar” aprovados em recente concurso, no momento mesmo de seus primeiros contatos com o BCB: “Se você quiser fazer carreira no Banco, esteja em Brasília”.
C) Em decorrência direta dos itens 1 e 2, acima, crescente des-motivação do servidor lotado em regional, que, pressionado pela des-qualificação de seu trabalho e de si mesmo, pela intensificação de seu trabalho (derivada da reposição crescentemente insuficiente de pessoal), pela falta de perspectiva de ascensão funcional (derivada da transferência crescente de funções comissionadas para Brasília) – tudo isso ocorrendo em uma ambiência de expressiva perda salarial e submissão a uma cadeia de comando autoritária, não dialogal, insensível às legítimas demandas profissionais-pessoais de seus comandados -, muitas das vezes produz servidores des-motivados, alheios à mística do orgulho de trabalhar no BCB, apenas no aguardo do fim do expediente, do término de sua vida funcional. Em uma tal circunstância, inevitável se torna constatar a cada vez mais alarmantemente baixa Qualidade de Vida no Trabalho dos servidores de regionais.
3 – Não é bem assim, Presidente Tombini…
Se existe qualquer orientação no sentido de se “… buscar maior integração das ações da sede e regionais, de forma a melhor otimizar os recursos disponíveis”, alguém precisa informar a Comunidade BCB sobre ela. É bem verdade que há Unidades cujos servidores parecem estar preocupados com o tema, tentando obter os melhores resultados possíveis diante de um quadro lamentável de desmobilização de recursos nas regionais. Mas essa, por certo, não é a regra.
Para que se torne possível a superação de tal quadro de desmobilização de recursos, é fundamental que o Banco adote práticas que não só permitam mas também incentivem a mais ativa participação dos servidores das regionais em todas as esferas das atividades de trabalho, inclusive as de formulação.
E isso porque é pacificamente aceito, entre especialistas contemporâneos em gestão do trabalho, o entendimento de que é mais que relevante a existência, nas organizações, de espaço para a mais ampla aplicação da criatividade – elemento constituinte essencial de todo e qualquer ser humano – ao processo de trabalho.
Certamente há hoje nas regionais inúmeros servidores qualificados para o desempenho de tarefas atualmente centralizadas em Brasília, o que gera a supressão, para esses servidores, da isonomia em trabalho relativamente aos servidores da sede. Pois, como já o disse o poeta, “A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”.
Não basta que os salários pagos, na sede e nas regionais, sejam iguais.
Muito para além disso, é indispensável que todas as demais dimensões existentes no mundo do trabalho também o sejam.
Só assim será possível falar de busca de maior integração das ações da sede e das regionais, de forma a melhor otimizar os recursos disponíveis.
4 – Retomando, então, com vistas à conclusão deste artigo, a principal questão aqui colocada – Que tipo de presença o Banco Central do Brasil quer ter no território nacional? –, lembramos que o Sinal já dispõe de um conjunto importante de reflexões acumuladas acerca do assunto (contidas na proposta Artigo 192 da Constituição Federal – SFN Cidadão), que poderiam ser utilizadas no contexto de um amplo e denso debate, intra e extra-muros do Banco, com vistas à obtenção da mais adequada resposta à pergunta em foco.
Queremos um modelo de Banco com dificuldades para o melhor cumprimento de seu relevante papel social, sujeito a “Riscos de RH”, podendo, em última análise, até mesmo vir a se tornar refém de instituições a quem cabe normalizar, fiscalizar, orientar? Ou queremos um modelo de BCB que conte com ajustado quadro de servidores, adequadamente ressuprido, em permanente processo de desenvolvimento profissional-social-pessoal, justamente remunerado, dispondo de elevada Qualidade de Vida no Trabalho, com atuação na totalidade de nosso país?
Queremos um modelo de Banco que apenas torne disponível a alternativa de um 0800 para seu contato com o público? Ou queremos um modelo de BCB que ofereça atendimento presencial, pessoal, personalizado às cidadãs e cidadãos que procuram nossa instituição em busca de informações, protocolando reclamações, ansiando por justiça em suas muito desiguais relações com o Sistema Financeiro Nacional?
Queremos um modelo de Banco que, tal qual propunha um ex-presidente do BCB, após ser efetuada a minimalização de sua missão institucional, poderia vir a ser “tocado por oitocentos servidores”? Ou queremos um modelo de BCB que, a exemplo de diversos outros destacados bancos centrais mundo afora, apresente extensa e intensa presença em todo o território nacional, respeitando e incorporando em sua ação a imensa diversidade de vocações econômico-financeiras, identidades culturais e realidades sociais do Brasil?
Presidente Tombini:
Que tipo de presença o Sr. julga que o Banco Central do Brasil deve ter no território nacional?
GT Revitalização das Regionais do Grupo QVT-Sinal-RJ.
Rio de Janeiro(RJ), outubro de 2012.
Este texto também estará disponível no Apito Carioca QVT e no blog da XXV Assembleia Nacional Deliberativa (AND) do Sinal, devendo ainda fazer parte de próximo número da
Revista Por Sinal.
|
Manifestações, de qualquer natureza, quanto ao texto – críticas, sugestões etc. – serão muito bem-vindas. Caso você tenha interesse em fazê-las, por favor clique aqui .
|